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ANGUS, a polêmica do sêmen importado e alguns pontos nos “is”

Por Fernando Furtado Velloso
Med. Vet., Inspetor Técnico da ABA e Diretor da Assessoria Agropecuária FFVelloso & Dimas Rocha

Em função de recente notícia publicada no Jornal Correio do Povo em (31/12/2012), intitulada de “ABA quer controle sobre sêmen˝, foi retomada a discussão sobre o uso massivo de produto importado no mercado brasileiro. Na referida nota, o material importado foi qualificado como “restolho˝ e aqueceu os ânimos das empresas e criadores envolvidos no setor. Provocações e folclores a parte, vou tentar neste texto apresentar alguns dados e considerações que podem contribuir com esta discussão importante e necessária. Vou tentar por alguns pontos nos “is˝.

A raça Angus tornou-se nos últimos 15 anos como a principal vendedora de sêmen entre as raças europeias e chegou a patamares inimagináveis para muitos. Em 2000, o Angus vendeu 1 milhão de doses no Brasil em um mercado de menos de 4 milhões de doses, ou seja mais de 25% de market share.
Em 2011, a marca superou os 2,3 milhões de doses em um total de aproximadamente 7 milhões de doses, ou seja, mais 30% de todo o bolo. Nestes últimos 10 anos o mercado de IA cresceu muito e a importância da raça acompanhou este comportamento.

Para 2012, a expectativa é de mais de 3 milhões de doses para o Angus e esta informação indica mais um ano de grande crescimento e de maior participação no mercado.

Atribui-se estes resultados positivos para a raça uma combinação de fatores: intensificação da pecuária através de programas de cruzamento, demanda por animais cruzados pelos confinamentos, remuneração diferenciada de animais Cruza Angus pelos frigoríficos, forte demanda por carne de qualidade no mercado doméstico, crescimento do Programa Carne Angus Certificada e dos diferentes programas e marcas de carne, etc.

Gráfico 1: Evolução da Inseminação Artificial no Brasil (cedido pela ABS Pecplan)

Gráfico 2: Venda de sêmen Angus no Brasil. Nacional x Importado (cedido pela ABS Pecplan)

Este cenário é muito bom para a pecuária brasileira e deveria animar muito os criadores de Angus no Brasil, porém a situação tem gerado desgaste e até polêmica entre os produtores de genética, pois o sêmen vendido na maioria é estrangeiro e não contribui para o PIB do Angus brasileiro. De acordo com a ASBIA, 69,4% do sêmen de Angus vendido no Brasil em 2011 é importado e 30,6% nacional.

Na fatia de produto importado o principal fornecedor é os Estados Unidos e é fácil compreender por que:

a) as principais empresas de inseminação no Brasil são americanas ou tem unidades neste país (ABS, ALTA, CRI, Select Sires, etc);
b) o Estados Unidos é o principal país na produção de genética Angus no mundo, tendo o maior volume de animais e a tecnologia mais desenvolvida em programas de seleção, etc. A avaliação genética americana é poderosa e volumosa em dados e esta condição traz argumentos técnicos e comerciais que favorecem a venda. Mesmo touros jovens e de baixa acurácia são vendidos em nosso mercado, mas com a justificativa e respaldo da solidez do programa de seleção.

Veja o artigo: O Angus nos EUA: sempre aprendendo com a nossa maior fonte de genética

Naturalmente o produtor brasileiro de genética Angus está desconfortável com esta condição, mas vivemos uma situação contraditória, pois os próprios criadores de gado puro usam preferencialmente sêmen importado. No Sumário de Touros Angus 2012 (PROMEBO) estão 746 reprodutores listados e somente 219 são nacionais, ou seja, somente 29,3%. Sendo assim, no gado puro é usado o mesmo % de genética importada que no gado comercial (cruzamento). Curioso: reclamamos que pouco se vende genética nacional, mas nem nós mesmos usamos com confiança o nosso produto.

Na condição de Técnico e entusiasta da raça, sou um defensor da genética nacional e trabalho para a mudança deste cenário, pois entendo necessário maior equilíbrio entre a participação de produto importado e nacional. Tenho esta posição não por motivos ideológicos, paixões ou interesses próprios, mas por acreditar embasado em informações técnicas que a genética produzida aqui tem diferenciais em relação à importada.

Veja o artigo: A genética Angus no Brasil e os diferenciais de nossa seleção

Para justificar minha posição com dados técnicos apresento os Touros Líderes no Sumário 2012. Nestes grupos estão os 20 melhores touros para diferentes características no Brasil e encontramos o seguinte:

  1. 30% dos Touros Líderes para Índice Final são nacionais;
  2. 60% dos Touros Líderes para Índice Desmame são nacionais;
  3. 35% dos Touros Líderes para Índice Carcaça são nacionais;
  4. 75% dos Touros Líderes para Pelame na Desmama são nacionais;
  5. 70% dos Touros Líderes para Índice Carrapato são nacionais;

Estas informações são muito animadoras, pois apesar da baixa participação dos touros brasileiros em nosso sumário (menos de 30%), temos um rankeamento muito positivo destes pais e com destaque para características de adaptação (pelo e carrapato) que são muito relevantes em nosso país e para os usuários de genética Angus no Brasil, seja em base taurina ou zebuína.

Outro argumento tecnicamente sustentável é que a nossa seleção ocorre em condições de ambiente e produção similares ou próximas as do nosso usuário. É inegável a Interação Genótipo Ambiente, e de forma simplificada pode-se dizer é que o desempenho de animais pode mudar grandemente quando estes são selecionados em um ambiente e usados (ou multiplicados) em outro. Esta situação é comprovada por touros que mudam significativamente de posição (ranking) entre o sumário do país de origem e sua posição no sumário brasileiro. Desta forma, para os rebanhos brasileiros a lógica indica que a melhor genética é a selecionada aqui, desde que dentro de critérios técnicos e com técnicas objetivas de melhoramento animal.

Não creio que impor restrições artificiais à importação de sêmen seja uma alternativa saudável, pois o mercado é o melhor regulador disponível. Haja vista os recentes maus exemplos da Argentina com a exportação de carne e o desmonte da pecuária daquele país.
Os critérios usados pelo MAPA para liberar a importação de material genético são simples, mas objetivam que somente ingressem animais com genética positiva, ou seja, superior à média do país de origem.

No caso do Brasil, temos diversos reprodutores em centrais que atendem a este quesito, outros oriundos de exposições e outros nem testados do ponto de vista da performance. Logo, não podemos afirmar que o material importado é na média inferior ao nacional.

A discussão deste tema (genética importada ou nacional) traz reflexões importantes e é devida a preocupação com a genética que utilizamos. Temos pela frente desafios e respostas que nos cobram os produtores: informação do desempenho da genética Angus em cruzamento, touros com melhores resultados em IATF, touros que atendam as exigência da nossa indústria frigorífica.

Enfim, temos um imenso mercado nos aguardando e aquele que for mais competente em ofertar o melhor produto ocupará mais espaço, seja com material importado ou nacional.

10 Comments

  1. Mário Saraiva Gomes de Macedo disse:

    Parabéns ao Fernando Velloso, como sempre, brilhante em suas avaliações.
    Apenas para reforçar, que o grande crescimento de raças como o Angus, passou por avaliações técnicas, baseadas em produção e produtividade, orientadas por suas associações a partir do ano 2000. Vale salientar o alto nível a que foi elevado o quadro técnico destas associações e a importância dada as necessidades dos nossos frigoríficos, que atendem a consumidores, cada vez mais exigentes.
    Apenas não podemos deixar de relatar, que voltaram a ser convidados, jurados “estrangeiros”, para julgar nossas principais exposições, o que, acredito, desnorteia o trabalho desenvolvido aqui, pois tras uma visão de um produto que não necessariamente segue as características as quais necessitamos.
    Acredito que nossos técnicos estão plenamente capacitados, para orientar nossos criadores quanto ao melhor produto a ser criado em nossas condições e atendam as necessidades de nosso mercado.

  2. Fernando Gonçalves disse:

    Velloso, seu relato está bem colocado.
    Essa “polêmica”, poderia ser avaliada melhor por um outro viés.
    Perguntaria quantos produtores de Angus temos no Brasil hoje? Quantos destes fazem a avaliação de seus animais pelo Promebo? Quantos dos que fazem a avaliação também utilizam a avaliação de carcaça por Ultrasom? E quantos dos que avaliam com Ultrasom o fazem em todo o lote contemporâneo e em machos e femeas?
    O fato é que aqui no Brasil não possuímos dados. Tenho a impressão que se olharmos no balcão um produto com todas as informações ao lado de um outro que simplesmente ali está, para concorrer no mesmo mercado, para qual lado o fregues irá pender?
    Se quisermos iniciar um trabalho sério, e oferecer touros com dados efetivos de alta performance teremos que tratar os programas de melhoramento genético com prioridade. Além disso é preciso um esforço de todos os participantes desta cadeia. Produtores de genética, criadores, invernadores, frigoríficos, centrais, universidades, etc.
    Se houver interesse nesse propósito, a Fazenda Santa Cecília é parceira.
    A constatação da nossa realidade, não traz nenhum prejuízo por ser como é, mas nada impede de que nós façamos a nossa parte bem feita para disputar o mercado de igual para igual. É um grande desafio para os produtores de Angus.

  3. Gustavo Ribeiro disse:

    Excelente artigo, parabéns!

  4. Felipe Cordeiro disse:

    Boa tarde! Excelentes reflexões e oportunas para abrirmos bem os olhos.

    Obviamente, ha uma exuberância informativa de dados de progênie nas bases americanas, sou conhecedor, sumarista e estudo bastante as aplicações das informações disponíveis e posso afirmar que em tudo isto, existe como muito bem lembrado, uma questão comercial intensa que atrapalha muito o mercado do semen nacional angus, basta conhecer um representante comercial de qualquer empresa e perguntar qual o % pago para ele vender semen nacional ou importado….entao existe mesmo uma boa estratégia de vendas que impulsiona este mercado que aliado as diversas informações técnicas dão ferramentas comerciais através de argumentos que facilitam a sua venda ao mercado.

    Hora…sabemos o custo de congelamento de uma dose de semen, sabemos o quanto custa tecnicamente e comercialmente e sabemos subjetivamente os valores que queremos faturar etc etc etc….esquecendo isso tudo, o semen nacional parece bem caro em relacao ao importado, posso ate estar falando bobagem, caso alguem queira discutir isso criamos outro topico, mas o que quero falar é, por que não cria-se atavés das assossiações um sumário que nos permita identificar mundialmente os melhores indivíduos? Acho que julgarmos então por essa ótica, nao cabe discutirmos se é nacional ou importado, fundo ou cabiceira, barato ou caro…desta forma profissionalmente escolheriamos os melhores.

    Sinceramente, indico, compro varioa touros angus e a unica coisa que posso afiar é que todo ano a situacao de pastagem muda, clima muda, com isso mudam as producoes de leite etc…vejo touros nacionais e importadoa produzindo com excelente qualidade, femeas e machos precoces, etc…. Julgar uma raça como esta é dificil, mas se o fizermos, tem que ser com dados confiaveis especificos com informacoes relevantes em um cenario mundial unificado, senao, vamos chover no molhado e ficar a mercer das estratégias comerciais das industrias que comercializam o semen.

    Abraço

    Felipe

  5. Conrado Carvalho disse:

    Velloso,

    Parabéns pelo artigo, muito bom! Apenas para constar, a ABS, apesar de ser americana, faz parte do grupo britânico Genus e a Alta Genetics é canadense, se não me engano.

    Um abraço!

  6. Vera Ondei disse:

    Bingo Velloso. Parabéns pelo embasamento de seu artigo

    Vera Ondei

  7. Auro Marcos Levy de Andrade disse:

    Prezados Senhores,
    Primeiramente gostaria de parabeniza-los pelas ótimas colocações que fizeram; sinto-me a vontade para ” meter o bedelho ” nesse assunto por trabalhar nessa área há muitos anos.
    Alguns aspectos sobre esse crescimento precisam ficar claro,pois ele é fundamentalmente no mercado de cruzamentos, devido a excelente performance da raça, então, as discuções a respeito da nacionalidade dos juizes nas pistas de julgamento ( Gado Puro ) podem não serem as mesmas no mercado de cruzamento, outro aspecto fundamental tem sido a competência dos criadores americanos e as empresas de IA ,pois disponiblizam produtos de alta qualidade e performance a preços que o mercado tem comprado cada vez mais.
    Estão todos de parabéns.! Inclusive os criadores nacionais que utilizam essa genetica.
    Para finalizar, quem critica o material importado desconhece os programas de seleção e os rebanhos ; se houver qualquer movimento no sentido de atrapalhar esse processo seria um grande desserviço à pecuaria brasileira.
    Um grande abraço a todos.
    Auro de Andrade

  8. jairo pinto de carvalho disse:

    Salvador-Bahia,12.01.2013-Sábado.

    Ao BeefPoint.

    Prezados Senhores:

    O Sr. Fernando Furtado Velloso, foi muito feliz no seu comentário, principalmente, no arremate quando afirma: ” Enfim, temos um imenso mercado nos aguardando E AQUELE QUE FOR MAIS COMPETENTE EM OFERTAR O MELHOR PRODUTO OCUPARÁ MAIS ESPAÇO, seja com material importado ou nacional.” (grifamos)
    Disse tudo !
    Grato pela atenção.
    Jairo Pinto de Carvalho

  9. Cecília José Veríssimo disse:

    Gostaria de contribuir com este forum dizendo que, de fato, o comprimento do pelo parece estar relacionado com a resistência ao carrapato, ou seja, ao escolher animais com pelos curtos, provavelmente, estará se escolhendo um animal também resistente ao carrapato e tolerante ao calor, já que animais com pelo curto são mais tolerantes ao calor. Então, se o comprimento do pelo é levado em consideração na seleção do Angus nacional e não é no Angus importado, o importado perde pontos nesta importante característica adaptativa.

  10. Celso Magalhães Coronel disse:

    “Bem fundamentado…
    Desde a década de 80 que eu bato nessa tecla, com colegas Veterinários e principalmente, zootecnistas, agrônomos e outros vendedores de sêmen.”