A ONG Amigos da Terra divulgou pesquisa inédita que se propõe a traçar uma radiografia da carne consumida no país. O relatório denuncia que um terço da carne que chega à mesa do brasileiro não passa por nenhum tipo de inspeção. E contabiliza “quase mil” estabelecimentos que atuam Brasil afora, “sem nenhuma fiscalização efetiva” de órgãos federais.
Problemas existem, é verdade, mas números divulgados pela ONG divergem dos dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa Trimestral do Abate de Animais do IBGE atesta que existem 1.345 abatedouros bovinos em operação no país e diz que apenas 25% da carne que saiu desses estabelecimentos em 2012 passou por inspeção estadual e municipal. Os 75% restantes foram inspecionados pelo governo federal.
Desde que a Constituinte de 1988 descentralizou a fiscalização das condições sanitárias e tecnológicas de matadouros e frigoríficos, estados e municípios passaram a ter serviços de inspeção. A partir daí, diz a ONG, o objetivo de agilizar e melhorar a fiscalização se perdeu, cedendo lugar ao não cumprimento das regras sanitárias.
A precariedade da inspeção municipal é fato em parte substantiva dos abatedouros, onde veterinários deveriam ter presença efetiva permanente e só aparecem de forma esporádica. O que repudio é a solução proposta publicamente por Roberto Smeraldi, diretor da Amigos da Terra.
A pretexto de defender a fiscalização federal como única capaz de assegurar carne de qualidade, a ONG desconhece a realidade e ignora os municípios, onde a vida e a produção efetivamente acontecem.
Em defesa da extinção dos pequenos frigoríficos, a Amigos da Terra assegura que, mesmo sem eles, não faltará carne no mercado porque grandes estabelecimentos trabalham abaixo da capacidade.
“Ante um abate de 21 milhões de cabeças nos frigoríficos com inspeção federal, temos uma capacidade instalada estimada pelas empresas do setor em pelo menos 52 milhões de cabeças”, diz a ONG. De acordo com o IBGE, porém, foram abatidos 23,33 milhões de cabeças em 209 frigoríficos inspecionados pelo Ministério da Agricultura em 2012.
Os 713 estabelecimentos pequenos, que criam centenas de empregos no interior, foram responsáveis por apenas 8% do abate total (2,37 milhões de cabeças), e não por um terço, como sugere pesquisa da ONG.
Em vez de exterminá-los, precisamos instalar nesses frigoríficos as normas higiênicas sanitárias que a inspeção federal preconiza para proteger a saúde do consumidor.
Até hoje, a lei 1.283/1950, que dispõe sobre prévia fiscalização de indústrias que processam produtos de origem animal, não foi regulamentada, fixando regras para todos os níveis. Regulamentaram-se apenas as normas para estabelecimentos sob inspeção federal.
Falar em fechar os pequenos é absurdo inaceitável. Equivale a sugerir a açougues do interior que comprem bovinos vivos de produtores para que sejam abatidos debaixo de árvores, criando uma espécie de rede clandestina de “frigoárvores”.
Afinal, não podemos desconhecer que 90% das propriedades rurais brasileiras possuem um rebanho médio de 33 cabeças. Sem escala de produção para completar uma carga de caminhão e levá-la a um grande centro, estes necessitam dos pequenos frigoríficos.
Entendo necessária a criação de normas que sejam obrigatórias para todos os níveis, com apoio técnico e financeiro aos Estados e aos municípios para que estruturem seus serviços a serem monitorados pelo sistema brasileiro de inspeção.
Esse é o caminho que deve ser acompanhado do fortalecimento da Vigilância Sanitária, com a devida fiscalização do comércio e a conscientização da população.
O poder público tem que estar presente nos três níveis da Federação, e os abates clandestinos – estes, sim – têm que deixar de existir.
Eliminar simplesmente os pequenos é solução que só atende aos interesses do monopólio de meia dúzia de grandes frigoríficos, que vivem no conforto dos empréstimos com dinheiro público e juros subsidiados.
5 Comments
Perfeito. Concordo integralmente. Vamos sim melhorar o que precisa ser melhorado. Não acabar com os pequenos frigoríficos.
Seria mais um golpe na sofrida e excluída pequena empresa desse país, que só é lembrada em momentos de palanques. As normas e diretrizes existem e são muito boas. Cabe sim, implementá-las com rigor. Precisamos parar com essa “mania brasileira” de proibirmos ou extinguirmos tudo o que não somos capazes de controlar. Precisamos de mais ação e menos preguiça. Uma política de apoio e incentivo aos pequenos abatedouros, com bem menos dinheiro do que é ofertado aos grandes, poderia ajudar, e muito, a resolver esta questão.
Sera que a Amigos da Terra esta recebendo donativos de algum grande figorifico, pra dizer esse monte de baboseiras e assim influenciar todo um setor?
Bela materia e esclarecedora.
Perfeito. Enfim alguém a se manifestar com uma visão mais abrangente, monopólio de frigorifico só resultaria em prejuízo ao Produtor e ao Consumidor. Comprariam ao preço que melhor lhes convém e venderia ao que mais caiba a seu interesse, margem de lucro estratosféricas. Repetindo o que o Sr. Jose Ricardo disse: “Vamos sim melhorar o que precisa ser melhorado. Não acabar com os pequenos frigoríficos.”
Quem será que financiou essa pesquisa?