O boi vai deixar de ser um simples número e ganhar uma carteira de identidade. Mais do que isso: um verdadeiro currículo, com dados sobre nascimento, saúde (vacinas e medicamentos), dieta, entre outros. É o que prevê o programa de rastreabilidade do rebanho bovino e bubalino, uma exigência dos importadores de carne da União Européia.
O programa, que pretende atingir os animais abatidos para a venda de carne à Europa até junho deste ano e, para os demais países até 2007, encontra-se em fase experimental e em ritmo lento.
A necessidade de se adotar um sistema de rastreabilidade emperra nas indecisões oficiais e dos criadores, diante das várias opções encontradas.
Apesar de a rastreabilidade ter sido autorizada pela Instrução Normativa no 01/2002, de 9 de janeiro, o Ministério da Agricultura ainda não estabeleceu os agentes certificadores do sistema.
O candidato mais cotado para ser a primeira certificadora é a Embrapa (Empresa Brasileira de Agropecuária) Gado de Corte, de Campo Grande (MS).
Segundo Pedro Paulo Pires, pesquisador da entidade, o ministro da Agricultura, Marcus Vinicius Pratini de Moraes, anunciou que a Embrapa será uma das certificadoras do Sisbov (Sistema Brasileiro de Identificação e Certificação de Origem Bovina e Bubalina), mas falta a decisão oficial.
Pires diz que há urgência, já que até junho 5 milhões de animais terão de estar de acordo com as exigências européias. “A Embrapa também tem condições de fornecer o serviço de um banco de dados central”, afirma.
O banco é considerado fundamental para garantir as informações sobre o rebanho.A Embrapa não é a única interessada em se tornar certificadora de rastreabilidade. “Somos fortes candidatos à certificação e buscamos parceiros nos sindicatos e na CNA (Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil)”, diz José Olavo Borges Mendes, presidente da ABCZ (Associação Brasileira dos Criadores de Zebu). Mendes não descarta uma parceria com a própria Embrapa.
Outro sistema de certificação existente é o SIRB (Sistema Integrado de Rastreabilidade Bovina), formado pelo grupo Planejar e pela Farsul.
Como a meta é rastrear todos os bois e búfalos nos próximos cinco anos, há muito trabalho e despesas pela frente. Os pecuaristas, mesmo os que pretendem manter a identificação dos animais pelo sistema de ferro em brasa, vão ter de ser mais cuidadosos no acompanhamento do desenvolvimento de cada animal por meio da adoção de planilhas mais completas.
O sistema de marcação a ferro, usado em quase todo o gado de corte brasileiro, apresenta dificuldades quando o volume de animais a ser manejado é grande.
Segundo Pires, da Embrapa, a manutenção desse sistema foi uma forma de não alijar o pequeno criador do programa de rastreabilidade e das exportações para o mercado europeu.
Outra opção é a identificação dos bois pelo uso de brincos, processo mais usado no gado de leite. O brinco tanto pode ser um modelo simples ou um chip de computador e foi a opção adotada pelo SIRB, que vende um kit de identificação por R$ 3,40.
O animal recebe um brinco ao nascer e, antes do desmame, o proprietários devem solicitar a visita de um técnico para coletar as informações. O Planejar calcula um mercado inicial de 150 mil animais, ou seja, de R$ 510 mil.
O uso de chips, por sua vez, representa um custo maior. De acordo com o técnico da Embrapa, o chip, também conhecido como transponder, pode ser inserido no umbigo de bezerros ou pode ser usado por animais adultos, por meio de ingestão de uma cápsula que se aloja no rúmen (um dos estômagos dos bovinos) ou por brincos. Os preços oscilam de US$ 2,85 a US$ 3,30. O kit completo da Embrapa, com leitora digital e antena, custa US$ 3.500.
A Texas Instrumentos, conveniada à Embrapa, é um das principais empresas fornecedoras de tecnologia para a identificação de animais por meio de chips.
Vera Hamerski, assessora de marketing da Texas, diz que o kit completo inclui o chip, que custa R$ 8 a unidade, um ponto de leitura (R$ 5.000) e um leitor portátil, orçado entre R$ 1.000 e R$ 5.000. A Texas espera obter cerca de R$ 740 milhões ao atingir 1 milhão de bovinos.
Para Olavo Mendes, da ABCZ, os efeitos da rastreabilidade serão sentidos em um ou dois anos. “A rastreabilidade é um atestado da qualidade do rebanho, mas, devido ao custo mais alto, precisaria remunerar melhor o criador.”
Fonte: Agrofolha – Folha de São Paulo (por Ellen Cordeiro), adaptado por Equipe BeefPoint