Por Fernando Penteado Cardoso1
Prezados Criadores:
Com muito prazer tenho enviado a matéria solicitada sobre “nelorfácil” e curral antiestresse para um homem só. Espero, assim, dar minha contribuição de agrônomo sênior para a fase da cria de nossa pecuária de corte, pois o bezerro é a matriz da carne: sem ele, onde estaria o boi magro e o capado branco pronto para abate?
Desse modo procuro compensar a dúvida que às vezes me assalta de nunca haver participado da criação visando pistas, prêmios e leilões de milhão, tão fantasiosa quanto esplendorosa, lucrativa para poucos, gratificante para nossa natural vaidade. Uma pecuária à parte.
Durante mais de 30 anos de melhoramento do Nelore, tendo por guru o insigne Prof. Bonsma, não encontrei respostas convincentes para várias questões. Por que selecionar dando preferência aos melhores no ambiente artificial de cocheira e super alimentação, se os filhos vão procriar e dar carcaça pastando a céu aberto? Para que exaltar um boi acima de tonelada se ele é abatido com 1/2t, sabendo-se que os grandalhões são mais tardios? Para que endeusar a vaca de 800 kg se sua irmã de 450 kg desmama bezerro do mesmo peso, sabendo-se que as menores são mais férteis e comem menos? Por que valorizar bezerros que nascem enormes, se dificultam o parto? Por que aspirar óvulos de novilhas que ainda não provaram ser “vacas parideiras” que desmamam bezerro sadio e pesado, mantendo seu bom estado? Por que premiar animais pela “beleza” e “harmonia” se o kg do traseiro vale 50% mais que do dianteiro?
Continuo indagando, já que essas práticas seguem norteando tantos criatórios! Caso os milhões gastos com o gado de cocheira super alimentado, dito “fino”, fossem empregados no melhoramento do Nelore para carne, – “fecundo, dócil, traseirudo, de acabamento precoce”,- adaptado ao ambiente natural do verde, do sol e da chuva, não estaríamos hoje tão deslumbrados com os Brahman, taurinos, sintéticos, compostos e similares, com tantas teorias e carrapatos!
Não é a toa que um respeitável pecuarista acaba de opinar: “…a pecuária de seleção está muito bem, mas a de corte passa por dificuldades enormes. Tem muita gente deixando a pecuária para investir na agricultura”.
Realmente temos duas pecuárias: mas o “brazilian beef” vem de uma só delas!
Grande abraço.
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1Fernando Penteado Cardoso é engenheiro agrônomo sênior, Agrolida, São Paulo/SP
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Prezado Dr. Fernando:
Mais uma vez o Sr. traz uma análise realista da pecuária brasileira.
Diariamente assistimos o marketing dos leilões literalmente de “elite”, nos quais vemos pessoas alerdenado o bom momento vivido pelo setor. Realmente, o bom momento é da “meia dúzia” de pecuaristas que negociam animais criados artificialmente em leilões onde ocorre a “troca de figurinha”: são sempre os mesmos compradores e vendedores. Onde está o “lucro líquido” dessa troca? O retorno realmente ocorre nos patamares em que são negociados os animais?
Não há como utilizar o cenário dos leilões de elite como um referencial para a pecuária nacional. A pecuária de corte vive um momento crítico, principalmente para o criador.
Não só pelo mercado, mas também pelos animais negociados, os leilões de elite não servem como parâmetro. Como podemos confiar em análises de desempenho pautadas em animais criados artificialmente?
Não estou desmerecendo o trabalho desenvolvido por criadores tradicionais de animais PO, que em muito contribuiram e contribuem para o desenvolvimento da pecuária, mas apenas questiono a atual propaganda dos mega leilões.
Devemos diferenciar o trabalho sério que visa a produção de carne a campo (realidade), dos criatórios que buscam conquistar somente o glamour das pistas e dos leilões de elite.
Devemos diferenciar os criadores de fim de semanda daqueles que realmente buscam contribuir com a produção de carne no Brasil.
Precisamos produzir carne a pasto, com qualidade e rentabilidade.
Mais uma vez, consigo uma gota de esperança, para continuar acreditando que em nosso país, ainda possamos ter um futuro.
Precisamos cada vez mais, de pessoas que acreditem que honestidade é obrigação e não qualidade individual, ajudando a desmistificar vários conceitos, enraizados em nosso cotidiano.
Parabéns.
Caro Dr. Fernando,
Como sempre com colocações precisas e inteligentes. Acho que a resposta para suas indagações é só uma: o mercado. A pecuária é uma atividade comercial e, assim sendo, é influenciada pelas regras do mercado.
Acabo de chegar de um leilão de nelore e constato mais uma vez que o mercado ainda não valoriza o gado precoce e geneticamente superior, mas sim, o pedigree!! E o pedigree sofre influência das pistas e do marketing dos grande criadores e, infelizmente, rege o mercado.
A culpa disso tudo não é dos grandes criadores (uma minoria bem assessorada, informada e que produz o que o mercado procura), mas sim, da grande maioria dos pecuaristas que, pouco informados e mal assessorados, não acompanharam a evolução e vão na contram-mão da produtividade.
Sou criador e selecionador de nelore e, quando apresento meus touros na fazenda para vendê-los, a preferência dos compradores é pelos touros grandes, pernaltas e tardios. Quando explico que o touro tal possui um mérito genético alto, com DEPs que visam a precocidade, a grande maioria, mesmo assim, compra pelo pedigree (filho de touro famoso) e optam por touros de grande estatura.
E ainda tenho que ouvir e me calar, como bom vendedor, aquela velha frase: “o meu avô fazia assim….”.
Prezado Dr. Fernando.
As duas pecuárias refletem as duas pecuárias seletivas.
Uma tem como foco a busca do animal mais produtivo na criação a pasto.
A outra, tem como foco o tipo de animal que leva à fama e ao lucro rápido e fácil. Nesse seguimento, é perfeitamente normal o uso de touro Deca 10, desde que produza filhas lindas, gigantescas e com chances de se tornarem campeãs.
Concordo também, que o entusiasmo pelo gado Brahman seria menor caso nosso zebu tivesse mais carne.
Parabéns pela questão abordada.
Parabéns Dr. Penteado Cardoso pela coragem e discernimento em mostrar que essa farsa não coloca bife na mesa dos nossos consumidores.
Enquanto nossa pecuária de corte e leiteira continuarem a premiar e valorizar o indivíduo em detrimento do rebanho os nossos produtores de carne e de leite estarão sempre reclamando do mercado, pois não conseguirão a eficiência produtiva que precisam.
As pistas, os ringues, as luzes, os shows, os leilões com seus preços absurdos são os principais responsáveis pela baixa eficiência daqueles que acreditam nessas matrizes pesadas, tardias, subférteis, de baixa eficiência alimentar e menor resistência à doenças.
Muito boa e oportuna lembrança, principalmente para os incautos que gostam de “andar na moda”.
Dr. Fernando, Parabéns pela carta aberta aos criadores.
Um macho com 18 meses e 17 arrobas em regime de pasto é o verdadeiro “brazilian beef”, o resto não me importa.
Mais uma de suas opiniões que vem comprovar o discernimento, a sabedoria e a autoridade de quem já viveu muito e a concisão própria de pessoas inteligentes e objetivas! Na mosca, Dr. Fernando!
Parabéns! Continue sempre assim!
Grande abraço!
Este é um artigo que vai direto ao ponto. O preço da arroba é o mesmo para qualquer vaca no gancho, o resto é conversa ou vaidade, se não for lavagem de grana em mega-leilões.
Parabéns ao autor.
Parabéns!
Dificilmente se lê tanta lucidez, quando se trata de pecuária realista no Brasil.
O que precisamos, no campo, é de práticas viáveis economicamente, caso contrário vamos quebrar.
Meu caro Dr. Fernando,
Fiz o meu comentário anterior (dia2/7), fixando a questão principal do seu artigo: seleção. Gostaria, hoje, de acrescentar um outro, relativo a conclusão final do seu brilhante artigo “…a pecuária de seleção está muito bem, mas a de corte passa por dificuldades enormes…”.
Os dados de produtividade atuais demonstram um progresso extraordinário, se comparado a pecuária de 20-30 anos atrás, devido a melhorias das nossas pastagens, práticas de suplementação na seca, saúde e genética dos nossos rebanhos.
O problema que hoje aflige pecuaristas tais como aquele de quem o Sr. tirou o comentário final, está muito mais fora do que dentro da fazenda. Vamos pensar apenas na seguinte questão: onde está a diferença entre o preço recebido pela carne exportada e o preço pago internamente, ao produtor? Por quê a tipificação de carcaça e o consequente diferencial de preço pela qualidade custa a emplacar? Há 28 anos, eu mesmo participei de reuniões de trabalho tentando a implantação deste sistema. Os elos da cadeia precisam ser parceiros e não competidores! Oxalá, neste novo milênio, pelo menos, isto venha a acontecer!
Grande abraço!
Excelentes colocações, mostrando que o processo de seleção do nelore anda na contra mão, exibindo preços injustificáveis para essa raça que tem um lobby devastador, o que prejudica e desestimula a pesquisa por animais mais precoces a campo.
Meus parabéns!
Dr. Fernando,
Parabéns pelas ótimas colocações no artigo, mostrando que o processo de seleção de Nelore anda meio contraditório e que a roda da fortuna presente na pecuária vem prejudicando a real produção de gado de corte.
Um grande abraço.
Parabéns Sr. Fernando
Pena que muitos jovens de gerações recentes ao senhor não exercem com profissionalismo um processo de seleção em prol do nosso sistema de produção exclusivamente a pasto. Vimos algumas melhorias no rebanho de corte como nutrição, manejo, melhoramento genético, imagine aonde estaríamos se em termos competitivos se explorassemos animais compatível ao nosso tipo de exploração ou seja a pasto.
Danilo F. Martins
Fazenda Dois Irmãos
Participante do PAINT – PROGRAMA DE AVALIAÇÃO E IDENTIFICAÇÃO DE NOVOS TOUROS
Nos dias atuais, nos quais a pecuária de corte brasileira vem sendo crescentemente pressionada para atender às demandas do mercado internacional, é muito significativo que uma mente privilegiada como a do dr. Fernando assuma a postura de quem reconhece a necessidade do “melhoramento do Nelore para carne, – “fecundo, dócil, traseirudo, de acabamento precoce”. – adaptado ao ambiente natural do verde, do sol e da chuva”. Ocorre, no entanto, que o mercado internacional não pode esperar que esse desejável melhoramento venha um dia a ocorrer! A resposta da pecuária de corte brasileira terá que ser mais rápida! Daí o tal do deslumbramento dele e dos demais criadores de Nelore por ele admitido.
Para o bom-senso do dr. Fernando fica uma sugestão: não jogue numa mesma vala os Brahman, taurinos, sintéticos, compostos e similares, como se fossem todos a negação da excelência. Cada espécie, cada raça, cada cruzamento tem seu valor e sua utilidade. Quanto a virem com teorias e carrapatos, das primeiras, o grande mestre – sr. Mercado – se incumbirá e dos segundos, onde e quando existirem, os próprios pecuaristas se encarregarão.
Deniz Ferreira Ribeiro
Pecuarista – criador e selecionador de Canchim
Ribas do Rio Pardo e Bandeirantes – MS
Águas de Santa Bárbara – SP
Presidente da Associação Brasileira de Criadores de Canchim
Parabéns Fernando, você sintetizou o pensamento da maioria dos pecuaristas brasileiros, os milhares que todos os dias enfrentam a realidade do campo.
Prezados amigos:
Benjamin Lins, José Hermano Machado, Teodoro Quilici Neto, Helio de Araújo Mello, Leovigildo Lopes de Matos, Humberto de Paula Faleiros, Louis Pascal de Geer, Prof. Antonio do Nascimento Rosa, Eli de Almeida, Osni Sajovic Pereira, Ronaldo Jacintho, Daniel Furquim Machado, Danilo F. Martins, Yuri Baldini Farjala e Deniz Ferreira Ribeiro.
Dirijo-me a vocês todos em conjunto para agradecer, em primeiro lugar, por haverem lido meu escrito, o que muito me desvanece. Em segundo lugar pela gentileza de tantas palavras amáveis e elogiosas, por vezes um tanto exageradas, com que me distinguiram. Meu muito obrigado.
Alguns pontos comentados mereceram reflexões de minha parte, as quais não desejo omitir.
As referências ao tipo dos reprodutores para corte me fez lembrar da expressão de um amigo, eficiente criador de Pres. Prudente: “para minha vacada quero um boi barrilote que engorda mais cedo”. Isso foi muitos anos atrás, mas não me esqueci do termo utilizado “barrilote”.
Disseram que “honestidade é obrigação”, com o que estou plenamente de acordo.
Quando lembraram a preferência dos compradores pelos tourinhos “grandes, pernaltas e tardios”, ocorreu-me a influência perversa que a “fantasia e o esplendor”, antes mencionados, exercem sobre nossa pecuária de corte.
Ao consultor que almeja “um macho de 18 meses e 17 @ a pasto”, eu diria: “Oxalá” ! Mas acho difícil, pois, quando o milagre é muito grande o santo desconfia!
Com relação à tipificação até hoje não praticada, quer-me parecer que somente agora foi definido um sistema simples e prático que poderá ser bem aceito. Até então os sistemas propostos eram muito sofisticados e complexos. Valer lembrar que todos os abatedouros têm uma classificação própria no atendimento a seus fregueses.
Os melindres do Pres. da Assoc. do Canchin ensejaram um mergulho no passado.
Nos anos 40 tornei-me amigo do colega Paulo Viana, que na Faz.Canchin, do Min.da Agric. próxima a São Carlos/SP, iniciava os cruzamentos para criar uma nova raça sintética batisada com o nome do local. Discutíamos muito e ele se queixava de falta de verba para ter Nelores e Charoleses de melhor qualidade ao iniciar o trabalho. Interessei-me pelos sintéticos desde estudante ao traduzir e publicar a formação do Santa Gertrudes, que conheci melhor anos depois ao visitar o King Ranch, onde Bob Kleberg e o Dr. Northway me mostraram os filhos de “Monkey”, touro fundador da raça. Nessa viagem visitei a seleção Brahman da familia Hudgins, em Hugenford-TX, onde me mostram os filhos de “Manso”, o famoso raçador descendente dos Nelores que chegaram aos EEUU via México. O persistente interesse me levou até Belmont, Austrália, onde se formava o Belmont Red, cruzando entre si os 1/2 sangue Hereford x Shorthorn x Africander, com especial atenção pela repelência aos carrapatos. Por ocasião de um congresso na Jamaica, tive oportunidade de conversar com o geneticista responsavel pelo sintético “Jamaica Hope”, uma raça avermelhada que muito me impressionara ao percorrer a ilha. Relatou-me o cientista, -um raro preto albino -, que lutara sem sucesso nos cruzamentos com o Holandês, mas que, ao trabalhar com o Jersey e o Red Sindi, conseguira uma nova raça muito bem adaptada às condições locais. Mais tarde visitei o colega Osmani Junqueira em S.José do Rio Pardo/SP, ele se mostrou bastante otimista com o sintético que estava formando o “Riopardense”a partir do Holandês e do Guzerat, hoje com 10 gerações de inter-cruzamento. Anos depois segui até a Africa do Sul para ver de perto o resultado do trabalho do Prof. Bonsma em criar nova raça,- a Bonsmara,- que compartilhasse as qualificações do Hereford, do Shorthorn e do Africander. Belo resultado!
Longe de mim negar a excelência desses gados merecedores de tanta dedicação e entusiasmo. Só que, em 1970, ao investir dinheiro dos acionistas da Manah em pecuária na Amazônia, visitei abatedouros para formar minha opinião. Então me impressionei com os milhares de bois brancos, uniformes, vivazes, saudáveis, bem acabados, criados e terminados a pasto, e ainda maravilhei-me com a confirmação de que havia milhões desses bois criados pelo Brasil a fora, sem nenhuma ajuda do governo, nem de associações de raça do exterior. A opção pelo Nelore decorreu do que vi nos frigoríficos, – não no esplendor das pistas e exposições, – registrando, ao mesmo tempo, os relatos de sua extraordinária adaptação às condições de nossos pastos nativos nos cerrados, varjões e pantanais.
Conheço e respeito a maior parte das 30 ou mais raças diferenciadas de corte que hoje disputam a preferência dos criadores, algumas existentes em nosso país muito antes da chegada dos zebuínos. Mas, pergunto-me: porque esses rebanhos permanecem de número tão modesto? Será que poderão vir a oferecer carcaças uniformes, -em grande escala-, sendo morfologicamente tão diversos uns dos outros?
O insigne historiador Walter Galvani confessa que, ao pesquisar a vida de Cabral (Nau Capitânea-Pedro Álvares Cabral-Editora ABDR, 1999), acabou apaixonado pelo seu objeto de trabalho. Aconteceu o mesmo comigo ao selecionar, durante 30 anos, a raça que estava dando certo no Brasil. Apaixonei-me pelo meu objeto de trabalho, que no caso era o Nelore das importações de 1878, feitas por Manoel Lemgruber -“Seu Manduca”-, de Nova Friburgo/RJ, linhagem preservada por seus familiares e, em continuidade, por Geraldo de Paula, Curvelo/MG, em seguida pela Manah em Brotas/SP e hoje por meus filhos na Faz. Mundo Novo, Uberaba/MG.
Aceito, assim, que me incluam na classe dos “deslumbrados”, que visitam frigoríficos periodicamente e que acreditam no Nelore.
Reiterando meus agradecimentos, recebam meu cordial abraço,
Prezada Silene P. Barretos:
Rogo considerar-se incluida no rol de missivistas aos quais me dirigi por carta hoje publicada no BeefPoint.
Muito obrigado por suas gentis palavras.