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A temporada do besteirol

Mas que porcaria esse tal de agronegócio. Destrói florestas, desperdiça recursos naturais, concentra renda e promove fome e desemprego. Ainda por cima suja a imagem do Brasil no mercado internacional. A podridão e a pouca vergonha tupiniquins pipocam nas manchetes de jornais e revistas de todos os cantos do mundo. Meu Deus!

Mas apesar de todas as mazelas que causa, das agruras que obriga o país enfrentar, o agronegócio não pára de se expandir, de crescer, se estabelecendo com vigor nas regiões mais distantes. O lobby dos fazendeiros, esses latifundiários desprezíveis, deve ser mesmo muito forte. Pior é que ainda querem protestar, fazer “tratoraço”, exigindo do Estado mais e mais recursos pra financiar suas ações escusas. “Por favor, me vê mais dim dim para acabar com a Amazônia”! Pode?

Provavelmente foi esse besteirol, verdadeira salada mista de impropérios, que recheou o pensamento de boa parte da população brasileira nos últimos dias, notadamente aquela parcela que tem por hábito ler o jornal ou assistir o noticiário da TV, mas que não goza de nenhum contato com o campo.

O noticiário tem nos agraciado com uma verdadeira avalanche de baboseiras sensacionalistas, que de útil não têm nada, mas que rendem boa audiência. O pior é que os “fatos” noticiados por desinformados quase sempre vêm acompanhados de comentários sarcásticos. São análises, na maioria das vezes, eloqüentes. Porém, pobres em fundamento.

Meu pai é médico. Profissão interessante. Sempre tem alguém querendo mostrar que sabe mais que o doutor. Que o tratamento que ele (meu pai) recomendou não é, de fato, o melhor. Geralmente ele tem que agüentar o falatório, exercitar a paciência, e depois buscar uma maneira de contornar a situação.

Mas em casa era diferente. Afinal, filho não é cliente. Quando eu começava a “meter o bedelho” em alguma de suas recomendações, o que fazia quase sempre que houvesse alguma injeção envolvida no processo, o velho vinha com essa: “Aprenda uma coisa, moleque. Se você não entende de física quântica, não se meta a discutir sobre bomba atômica”.

Observação interessante essa.

O conceito é bom, mas é pouco praticado. Verifica-se, hoje, que tem muita gente dando palpite sobre muita coisa. E nessa disputa pelos holofotes, o caráter sensacionalista ganha cada vez mais espaço. Uma pena. Opiniões infundadas, “achismos” e os pré-conceitos abundam. Opiniões embasadas, quando muito, ganham as notinhas de rodapé. Não chegam perto das primeiras páginas, não ousam participar das manchetes. São chatas. Não dão retorno.

Repare só. Após a publicação de uma matéria do tipo “Agronegócio devasta a Amazônia”, os jornais e revistas, na maioria das vezes, abrem espaço para a multiplicação do tema.

Se surge uma contraposição, um defensor solitário, na tv por exemplo, a aparição é, via de regra, do tipo instantânea, vapt-vupt. Longa o suficiente apenas para algumas poucas palavras, que às vezes até fogem do contexto. Se o telespectador piscar, corre o risco de não ver. Lembra muito a situação daquele irreverente candidato à presidência: “Só me deram 30 segundos. Meu nome é…”.

Outra observação é que, invariavelmente, o comentário escolhido para ser publicado ou noticiado é o bom e velho “o agronegócio responde por 35% do PIB brasileiro, 37% dos empregos e pelo superávit da balança comercial”, ou suas derivações. Apesar da grandeza dos números, eles não chocam mais. Estão exageradamente batidos, repetitivos. É como fazer alarde sobre mais um carro bomba no Iraque. Quem liga pra isso? Ninguém. Caiu na rotina.

Generalizei, é verdade. Existem bons veículos de informação, que primam pela qualidade da notícia, pela veracidade dos fatos. Sabem que toda história tem dois lados, que “focinho de porco não é tomada”. Mas confesso que nos últimos dias tenho me deparado apenas com reportagens tendenciosas e comentários obtusos. Talvez tenho dado azar.

O pior é que, em alguns momentos, na ânsia de chocar o público, as acusações contra o agronegócio perdem completamente o nexo. Vamos ao combate.

– “O Agronegócio destrói as florestas”. Besteira pura! Norman Bourlaug, engenheiro agrônomo, prêmio Nobel da Paz, afirma que, com a tecnologia de 40 anos atrás, o mundo precisaria de mais 1 bilhão de hectares em cultivo para produzir o volume atual de alimentos.

No Brasil, nos últimos 14 anos, a produção de grãos aumentou 115%, ao passo que a área cultivada, no mesmo período, cresceu 30%. O agronegócio, portanto, preserva.

– “O agronegócio gera desemprego, fome e concentração de renda”. Besteira de novo. De acordo com o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Sócio-Econômicos (Dieese) em 1995 o trabalhador brasileiro conseguia adquirir, em média, 0,99 cesta básica com um salário mínimo. Em 2004 o número saltou para 1,43 cesta básica. Um aumento de 44% no poder de compra.

Foi o salário que melhorou? – Não, foram os preços dos alimentos que caíram. O que só foi possível em função da modernização da agricultura, da produção empresarial, que busca aumento de produtividade e ganhos em escala. Nesse sistema, o malvado do fazendeiro recebe cada vez menos por unidade produzida. O preço cai para o consumidor final.

Com relação ao emprego, um estudo da Scot Consultoria comparando fazendas leiteiras de média e alta tecnologia mostrou que as mais tecnificadas podem empregar até 4,3 vezes mais que as menos intensivas. No caso da pecuária de corte, em situação similar, os postos de trabalho podem aumentar até 3,8 vezes.

Por fim, um estudo do Banco nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) concluiu que para cada R$10 milhões de aumento de demanda, são gerados 1.193 postos de trabalho na agropecuária. É mais do que consegue a construção civil (626 postos), comércio (959 postos), transportes (681 postos), etc. O campo só perde para a indústria de artigos de vestuário, que gera 1.575 postos de trabalho mediante R$10 milhões de aumento de demanda. Ainda assim a diferença é pequena.

O agronegócio, portanto, gera emprego, renda e combate a fome. E não o contrário.

– “O Brasil é o país dos latifúndios improdutivos”. Mais baboseira. O Brasil tem cerca de 50% do território coberto por florestas. A maior parte, aliás, é ocupada pela Floresta Amazônica (que, segundo os noticiários, está acabando. Estranho…). Mas ainda assim é o maior, ou segundo maior produtor de café, suco de laranja, açúcar, soja, farelo de soja, carne bovina, tabaco, etc. De improdutivo, não tem nada.

A área média das fazendas brasileiras, de acordo com Prunes, é de 67 ha, contra 3.170 ha da Austrália, 469 ha da Argentina, 242 do Canadá, 190 ha dos Estados Unidos e 107 ha do Reino Unido. Portanto, o Brasil também não é o paraíso dos latifúndios.

– “O Brasil subsidia, indiretamente, a produção, o que também gera competição desleal”. Essa pérola veio de fora, por parte de representantes de produtores de países desenvolvidos. Logo eles! Atesta-se, assim, que capacidade de falar besteira, ao contrário do talento com a bola nos pés, não é exclusividade brasileira.

Nesse sentido a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), em levantamento recente, demonstrou que o Brasil é um dos países que menos concede esse tipo de ajuda aos produtores. Na Europa, por exemplo, os subsídios equivalem a 37% do valor total da produção agrícola. No Brasil esse montante é de míseros 3%.

Além das condições naturais favoráveis, o produtor brasileiro é “marrudo” e eficiente. Os estrangeiros não entendem, e reclamam. Por vezes, literalmente esperneiam. Que feio!

Agora uma clássica: “Fulano de tal está rico, é fazendeiro”. Seria cômico, se não fosse trágico. Veja na tabela abaixo a rentabilidade de alguns investimentos em 2004.

Tabela 1. Índices e resultados estimados com investimentos financeiros e atividades agropecuárias em 2004


Fonte: Investnews / HSBC / Impar Consultoria / FGV / Scot Consultoria

Vale lembrar que no ano passado o clima foi favorável e os preços pagos aos produtores estavam mais altos.

Na agropecuária, quase sempre se trabalha com um patrimônio de valor elevado, mas que proporciona rentabilidades baixas. Veja que qualquer investimento financeiro dá mais retorno do que a lida no campo. Para sobreviver da terra é preciso ser valente, competente e entender a fundo do negócio. Não é para amador.

Não venham, portanto, os oportunistas e sanguessugas de plantão, transvestidos de defensores das causas nobres, ferroar indiscriminadamente um setor ordeiro, desenvolvimentista, gerador de divisas, emprego e renda.

O país tem sorte de contar, no campo, com pessoas de caráter, persistentes, que acordam antes do galo cantar, mas que só param de trabalhar depois que o sol se põe. Que sabem do valor das matas, da terra, e da água, e que, portanto, são conservacionistas, amantes e dependentes da natureza. Que enfrentam de peito aberto as intempéries climáticas, a falta de crédito, os desvarios do mercado, as injúrias, a violência física e moral, mas que não se cansam de investir, de lutar, de acreditar no seu negócio – o Agronegócio – e de assim cumprir seu papel social.

Levam, literalmente, o país nas costas. O perigo é que o fardo está ficando pesado demais.

0 Comments

  1. Carlos Armando S Ribeiro Jr disse:

    Concordo em parte.

    Creio que os números sobre o latifúndio poderiam ser mais transparentes, como, por exemplo, o percentual de participação do grande proprietário na distribuição agrária (desconsiderando-se o número de propriedades, porque não é raro um mesmo proprietário deter mais de uma sob diferentes pessoas juridicas).

    Eu tenho orgulho do que o agronegócio brasileiro vem obtendo para o País. Os produtores sérios têm que ser devidamente homenageados, pela obtenção de produtividade sob as condições a que estão sujeitos.

    Porém, o próprio agronegócio omite-se em desqualificar aqueles que, em seu nome, devastam a floresta e depredam o meio-ambiente em busca de resultados mais imediatos e por causa da completa omissão, despreparo e ausência estatal na fiscalização e educação, tanto de corretas técnicas agro-pecuárias, como ambientais.

    Cabe ao agronegócio assumir um papel mais ativo de conscientização e de repúdio a quem pretende obter uma produtividade predatória, porque, mesmo que os resultados sejam substanciais até em um período de tempo considerável, em um prazo mais longo a conseqüência poderá ser o esgotamento da terra.

    Há, nesse sentido, o exemplo do Vale do Paraíba que, há dois séculos, foi a área geradora de toda a riqueza brasileira, e, hoje, não passa de amontoado de áreas, nas quais há, ainda, condições de produção, mas por um custo bem alto.

  2. Carlos Alberto de Godoy Bueno disse:

    Parabéns.