Tendo em vista os recentes atentados terroristas em Londres, Paris estava em alerta vermelho e segurança redobrada, por ocasião das comemorações do aniversário da queda da Bastilha, ocorrida em 14 de julho de 1789.
No entanto, outro fato marcou, neste último 14 de julho de 2005, a história do Brasil e da França ao mesmo tempo, e creio tenha sido também outro alvo da segurança redobrada por parte dos franceses.
Realizou-se, nos jardins do Palácio Presidencial – “Palais Elysée” – churrasco brasileiro servido com cerca de uma tonelada de picanha brasileira. A França, como se sabe, é o principal país que articula a manutenção da Política Agrícola Comum (PAC) nos atuais ou em níveis superiores aos já praticados.
A presença da carne brasileira nas entranhas do poder francês, que paga em média 175% para ter acesso ao mercado europeu, mas que pode chegar a 300% em alguns casos, merece especial registro. Trata-se de uma façanha nunca antes permitida ou de acordo com a visão de alguns, conseguida, após diversos “entendimentos” realizados entre autoridades brasileiras e francesas e do Presidente da Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carnes (ABIEC), o ex-Ministro Marcus Vinicius Pratini de Moraes.
Com o “alerta vermelho” quase que o churrasco promovido pela ABIEC, em parceria com a APEX, amarelou. Não fosse a intervenção direta do Ministro Pratini de Moraes, em, igualmente, “alertar” a segurança do Presidente Chirac de que sem fogo não teria como fazer churrasco, o protecionismo francês teria uma vez mais logrado sucesso.
Caros leitores, são tantos os expedientes utilizados pelos países desenvolvidos para impedir o acesso de produtos agrícolas brasileiros em seus mercados, que não duvido que os instrumentos tradicionais, combinado com um número maior, mais complexo e cada vez mais fantasiosos de novos mecanismos protecionistas patrocinados por estes países, pudesse chegar a atingir “o fogo” que assaria as carnes brasileiras para degustação dos mais de seis mil convidados da primeira dama francesa.
A ocorrência deste fato – sem entrar no mérito da questão – chega a deixar aqueles que acompanham a guerra comercial que envolve o comércio internacional de produtos agrícolas perplexos, porém mais conscientes do árduo caminho a ser percorrido até atingirmos nosso objetivo: “Carne bovina brasileira em todo o mundo, sem restrições sanitárias e fitossanitárias como forma de protecionismo velado e sem a vergonhosa incidência de tarifas de importação ou cotas para o enorme potencial que a carne brasileira oferece ao mercado Europeu e mundial”.
Chamou-me também a atenção as declarações do sempre contido e refreado Ministro das Relações Exteriores, Embaixador Celso Amorim, de que “é do nosso interesse, bem como dos consumidores franceses e europeus, em geral, ter acesso à carne brasileira que é obvia e indiscutivelmente melhor e mais econômica”.
Ao longo da minha vida pessoal e profissional, constatei que aprender com os erros e acertos alheios é muito mais barato do que com os nossos. Mais do que em qualquer outro momento da história da agricultura brasileira, devemos estar atentos a tudo e ao menor detalhe. Muitas vezes as grandes vitórias se dão por pequenos detalhes.
Prudência em excesso paralisa, da mesma forma como imprudência pode ser fatal. Dessa forma, estou convicto de que a velocidade de solução, a capacidade de adaptação às novas realidades do comércio mundial de carne bovina, e, principalmente, a ousadia das empresas brasileiras exportadoras de carnes bovinas no campo comercial e de marketing, refletem o sucesso das exportações brasileiras de carne bovina, que se agregada às exportações de couros, poderá chegar ao montante de US$ 4 bilhões, ao final de 2005.
Superado o desafio de “invadir” a maior fortaleza mundial do protecionismo agrícola – o “Palais Elysée” – que se posiciona claramente contra um sistema de comércio agrícola mais justo e voltado para o mercado e iniciar negociações abrangentes para proporcionar melhorias substanciais no acesso da carne brasileira no mercado europeu pode ser considerada uma vitória dos frigoríficos associados à ABIEC, que financiaram essa inusitada “batalha”.
Em um futuro próximo, esse esforço poderá render a todo o País significativos resultados no avanço das suas relações comerciais com a Europa e com o mundo, em geral. A forma pró-ativa com que o setor exportador de carne bovina vem encarando as dificuldades externas e internas é de se invejar e merecedora do reconhecimento de toda a sociedade brasileira.