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Carnes elevam previsão do IPCA, mas índice segue abaixo da meta

Num quadro tranquilo para os preços, um choque de oferta já previsto superou expectativas e vai deixar a inflação um pouco mais salgada no fim do ano, e também ao longo de 2020, mas ainda abaixo das metas perseguidas pelo Banco Central (BC). O impacto da peste suína na China sobre a cadeia de proteínas bateu com força nas cotações ao produtor e deve acrescentar de 0,2 a 0,3 ponto ao Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) em novembro e dezembro, estimam economistas.

Nos 12 meses acumulados até outubro, os suínos já acumulam alta de 32,8% no Índice Preços ao Produtor Amplo – DI (IPA-DI), da Fundação Getulio Vargas (FGV), taxa que deve chegar a 37,5% em dezembro nas estimativas de Fabio Romão, da LCA Consultores. Os bovinos e aves também devem alcançar taxa de dois dígitos ao fim do ano, com avanço de 20,7% e 13%, respectivamente, calcula Romão. No IPCA, esses preços têm peso de 6,7%, ou 27% do grupo alimentação e bebidas.

Com essa trajetória no radar, bancos e consultorias estão elevando projeções para o índice oficial de inflação em 2019. Divulgado ontem pelo Banco Central, o boletim Focus mostrou que o consenso de mercado para a alta do IPCA no ano avançou de 3,33% para 3,46% entre a semana passada e a atual. A meta deste ano é de 4,25% e a do próximo, de 4%.

Nesse cenário, Cristiano Oliveira, economista-chefe do Banco Fibra, ajustou sua estimativa para o período de 3,46% para 3,75%. Oliveira calcula que o potencial inflacionário do choque de proteínas pode ultrapassar 50% ao produtor nos próximos dois meses, considerando o diferencial entre o preço atualmente praticado no atacado brasileiro e o preço pago aos exportadores pelo mercado internacional. “Parcela desta pressão inflacionária deve aparecer no varejo também, elevando a inflação ao consumidor”, diz ele.

Segundo a equipe econômica do Bradesco, os núcleos de inflação, que tentam diminuir ou expurgar o efeito de itens voláteis sobre o IPCA, seguem baixos, mas há riscos de oferta relevantes no setor pecuário. O banco destaca que, no IGP-10 de novembro, a alta de proteínas superou 5%. “Essa elevação é resultado do desabastecimento chinês após caso de febre suína, mercado que o Brasil começou a acessar recentemente, após habilitação de frigoríficos”, explica o departamento econômico do banco.

Com a oferta de proteínas no país reduzida por conta da doença, a China praticamente dobrou as exportações de carnes bovinas do Brasil nos últimos meses, aponta o Bradesco, o que pressionou os preços domésticos antes do previsto. “ Em nossas estimativas, já consideramos alta de 11% na cadeia de pecuária para o consumidor final”, aponta o banco em relatório a clientes.

O efeito da peste suína ocorrida na China sobre os preços de carnes no mercado interno já era aguardado, mas havia dúvidas a respeito do timing do impacto, afirma Romão, da LCA. A maior parte da pressão sobre o varejo ainda vai ficar para o próximo ano, diz, mas as altas ocorridas no atacado desde agosto foram mais fortes do que o previsto e vão chegar ao varejo em novembro e dezembro. Nesta época, observa ele, os preços de carnes já ficam mais pressionados, devido às festas de fim de ano.

Por causa do choque de proteínas, a LCA revisou a estimativa para a alta do IPCA em novembro, de 0,35% para 0,40%. A projeção para o mês seguinte também foi ajustada para cima, de 0,37% para 0,48%. “Essa questão pontual das proteínas apenas deixou as taxas mais próximas da sazonalidade”, diz o economista. Ele elevou em 0,2 a ponto a projeção para o indicador oficial de inflação de 2019, para 3,5%. Em 2020, a alta deve ser bastante parecida, de 3,4%. “Não fosse esse choque, teríamos um IPCA mais próximo de 3% no ano que vem.”

Segundo Carlos Thadeu de Freitas Filho, economista-chefe da Ativa Investimentos, a repercussão da menor oferta de proteínas na China sobre os preços domésticos já estava na conta desde o fim do ano passado, mas não era previsto que a oferta doméstica ficaria tão baixa, o que acabou acontecendo em função das vendas externas. E isso ocorre numa época em que a demanda tradicionalmente fica mais aquecida, com estímulos como o 13º salário e, neste ano, os saques das contas do FGTS.

O dólar alto representa outra pressão sobre os preços na cadeia de proteínas, acrescenta Freitas, que já trabalha com avanço de 3,7% para o IPCA em 2019. “O câmbio depreciado não ajuda nada. Para tentar estimular os produtores a não exportarem, é preciso oferecer um preço maior”, diz o economista.

No primeiro trimestre do próximo ano, o embate entre consumo doméstico e demanda externa vai ditar quanto os preços vão ceder após a alta no fim de 2019, avalia Freitas. O início de ano costuma ser recessivo para o consumo, observa ele, período em que incidem pagamentos de impostos, reajustes de mensalidades escolares e outros gastos extras. “Se a redução do consumo de proteínas for forte neste momento, os preços podem cair um pouco, mas, se a China absorver toda essa queda, os preços não vão mudar quase nada.”

Romão, da LCA, estima que as proteínas vão subir 7,1% neste ano no IPCA – estão com alta de 2,3% nos 12 meses até outubro – devem ter um pico de 10,5% em agosto do próximo o ano e, a partir de então, vão começar a perder fôlego, fechando 2020 com aumento de 6,85%. “Há uma defasagem no repasse do atacado para o varejo, e também esperamos que haja uma substituição parcial de suínos pela carne de aves, que têm ciclo mais curto”, explica ele.

Para os economistas ouvidos, o choque de oferta é temporário e, por isso, não representa risco à trajetória de queda dos juros, que vão continuar sendo cortados pelo Banco Central no próximo ano.

Fonte: Valor Econômico.

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