A redução da oferta de frango no país, reflexo de um movimento do ajuste no plantel de aves alojadas nas granjas feito para compensar a demanda mais fraca observada a partir de abril, já teve impacto significativo nos preços da carne, equilibrando as margens dos criadores brasileiros de aves. O enfraquecimento do ritmo de exportações, no entanto, pode colocar em risco esse novo equilíbrio que foi alcançado.
Com o corte na oferta, o preço do frango congelado no atacado da Grande São Paulo subiu 23,7% em junho, conforme levantamento do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea). Em julho, a cotação acumulou alta de 2,3% até ontem, de acordo com o centro vinculado à vinculado à Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq/USP).. Com isso, voltou aos níveis pré-pandemia. No fim de março, a cotação estava em R$ 4,85 por quilo. Ontem, alcançou R$ 4,88.
De acordo com cálculos do analista César Castro Alves, da consultoria em agronegócios do Itaú BBA, a alta do frango fez com que a margem bruta da criação da ave no sistema de integração saísse do vermelho, o que é positivo para indústrias como BRF, Seara e Aurora, que agregam margem no abate e processamento da proteína.
Até maio, o indicador (diferença entre o preço do frango vivo e o custo com ração) estava entre 6% e 8% negativos. Agora, o cálculo “zerou”, afirmou Alves, ponderando que o equilíbrio na relação entre oferta e demanda de frango ainda é tênue.
Para reduzir a oferta de carne de frango para reverter o quadro negativo de abril, quando o preço no atacado recuou 20%, o número de pintinhos nas granjas foi reduzido de várias formas, quebrando ovos que seriam enviados à incubadora e posteriormente à granja e também abatendo aves matrizes (as mães do frango) antes do planejado para que produzissem menos.
Conforme a Associação Brasileira dos Produtores de Pintos de Corte (Apinco), maio foi o primeiro mês do ano com queda, na comparação anual, da produção de pintos de corte – essa produção começou a se refletir na oferta de carne de frango ao longo de julho (o processo de engorda das aves leva, em média, 43 dias).
Em maio, a produção de pintos de corte foi de 524,4 milhões de cabeças, 3% menos que no mesmo mês do ano passado, conforme a Apinco. Os dados da associação mostram que o ritmo de produção estava bem acelerado antes da pandemia, o que ajuda a explicar o sobreoferta que derrubou os preços do frango em abril. Entre fevereiro e março, por exemplo, a produção de pintos de corte no país aumentou mais de 5%, na comparação anual. A produção mensal de pintos não caía desde janeiro de 2019.
Ao Valor, o presidente da Aviagen na América Latina, Ivan Lauandos, disse que a oferta de pintinhos foi reduzida em cerca de 10%. A Aviagen é líder no mercado de genética avícola no país. “O ajuste acabou sendo necessário porque a demanda foi um pouco menor no período. Mas a produção agora está ajustada. Esse setor se ajusta muito rapidamente”, afirmou ele.
Além do ajuste de mercado, a oferta de frango pode ter sido afetada pelos frigoríficos que foram paralisados temporariamente em meio aos casos de covid-19 entre funcionários. O executivo da Aviagen não sabe estimar o reflexo dessas paradas na oferta, mas avalia que elas também tiveram um papel na redução da oferta de frango.
Embora a avicultura tenha conseguido equilibrar a relação entre oferta e demanda no país, há pontos de atenção. De acordo com José Paulo Kors, presidente da Apinco, o mercado de pintinhos está aquecido e os alojamentos já podem estar voltando a aumentar, o que tem potencial para pressionar as cotações. Ele também adverte que a situação do mercado doméstico pode piorar. “O fundo do poço ainda não chegou”, acrescentou Kors, ao mencionar a crise econômica.
O presidente da associação frisou, ainda, que a margem do criador de frango está apertada, mesmo com a melhora proporcionada pela recuperação dos preços. Em 3 de julho, o preço da ração do frango estava em R$ 1.410 por tonelada, alta de mais de 30% em relação ao custo de R$ 1.060 por tonelada registrado no fim de junho do ano passado, segundo Kors. Nesse período, afirmou, o custo de produção do frango
registrou alta de 17,8%.
Para César Alves, do Itaú BBA, as margens estão mesmo apertadas e qualquer solavanco na exportação de carne de frango pode atrapalhar o segmento, exigindo uma nova redução da produção. De acordo com ele, a queda das exportações de carne de frango nos últimos meses é um ponto de atenção, assim como o preço em dólar da carne – neste caso, a depreciação do real compensa o impacto das cotação mais baixa.
Em junho, os brasileiros exportaram 333,5 mil toneladas de carne de frango, redução de 13,6%, conforme dados da Secretaria de Comércio Exterior (Secex) compilados pelo Ministério da Agricultura. Como o preço também caiu, a receita com as embarques diminuiu 32% na comparação anual, para US$ 428 milhões.
No primeiro semestre, o volume exportado ainda cresceu (1,1%), mas a receita diminuiu 9,3%. O mercado externo absorve mais de 30% da produção do país, de acordo com estimativa da Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA).
Fonte: Valor Econômico.