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Pecuaristas do Araguaia buscam ‘selo’ de baixo carbono

Um grupo de pecuaristas da região do Médio Araguaia, em Mato Grosso, quer provar por A mais B que consegue criar gado emitindo muito menos gases de efeito estufa do que a média de seus pares. O plano é destacar-se na multidão de 2,5 milhões de propriedades de pecuária do Brasil com a construção de uma identidade própria da atividade na região que seja relacionada à sustentabilidade ambiental — e auferir ganhos financeiros com isso.

A iniciativa está sendo conduzida pela Liga do Araguaia, criada em 2014 por grandes pecuaristas da região para incentivar a adoção de práticas sustentáveis na criação de gado. O plano é avaliar as fazendas que já pertencem à liga e atrair novos produtores para fomentar a pecuária de baixa emissão entre produtores de pequeno e médio porte.

O projeto Garantia Agroambiental Araguaia será desenvolvido com o Imaflora, que avaliará todas as propriedades dos pecuaristas da liga. A organização fará monitoramento, reporte e verificação (MRV) das fazendas, etapas fundamentais em projetos de mitigação climática. A ideia é que os produtores do Médio Araguaia ganhem um “selo” de pecuária de baixo carbono, garantido pela adoção de um protocolo unificado de ações que reduzam as emissões por meio da intensificação produtiva.

“Com esse protocolo, podemos conseguir um valor agregado”, diz Homero José Figliolini, coordenador executivo da Liga do Araguaia. O grupo espera valorização especialmente no mercado internacional, onde há nichos mais consolidados em busca de alimentos com baixa emissão de carbono. Mas Figliolini acredita que também já há um mercado nacional “despertando” para essa preocupação.

Mesmo sem receberem hoje um “prêmio” pela sustentabilidade, os produtores que têm passado por essa transição já obtêm ganhos financeiros. Na propriedade de Raul Almeida, em Torixoreu (MT), mudanças básicas na gestão administrativa, no manejo das pastagens e na genética dos animais adotadas em 2015, quando ingressou na associação, ajudaram a fazenda a conseguir um aumento de 35% a 40% em sua produtividade — e com alta de custo menos acentuada, de cerca de 20%. Em seu sistema de terminação (fase final de engorda dos bois), ele tem hoje 6 cabeças por hectare — na região, a média é de menos de 1 animal por hectare.

Rebanho gigante

A região do Vale do Médio Araguaia, que abrange 12 municípios, reúne centenas de produtores e um rebanho bovino de 2,9 milhões de cabeças em 3,8 milhões de hectares de pasto. Nesse universo, a abrangência da liga ainda é pequena, de 70 produtores em 150 mil hectares com 180 mil bovinos, ou cerca de 5% de toda a região.

Entre os que já fazem parte, os ganhos econômicos e ambientais são consideráveis. Em oito anos, os pecuaristas da liga já recuperaram 43 mil hectares de pastagens degradadas e aumentaram a lotação dos pastos de 0,7 para 1,2 animal por hectare. Almeida afirma ser possível aumentar a taxa para até 5 cabeças por hectare.

Os produtores que aderirem terão que priorizar recuperação de pastagens degradadas, intensificação da produção e adoção de sistemas de integração entre lavoura, pecuária e eventualmente floresta, o que exige recursos. “Tanto um [objetivo] quanto outro dependem muito de investimentos, que não são pequenos. É preciso jogar calcário, adubar, usar sementes de boa qualidade”, diz Figliolini.

Para viabilizar a transformação da região, a liga vem buscando instituições financeiras para obter recursos baratos e com prazos adequados ao tempo de transformação da atividade. Segundo Almeida, o retorno do investimento em fazendas de recria e engorda pode vir em dois a três anos.

Técnicas cruciais

Essas técnicas são cruciais para diminuir as emissões líquidas de carbono da pecuária. Florestas, pasto bem manejados e cultivos têm a capacidade de capturar parte dos gases que os animais emitem — e reduzir a emissão bruta dos animais é mais difícil.

Em 2021, a fermentação entérica do boi (arroto) respondeu, sozinha, por 15% de todas as emissões de gases-estufa do país, segundo o Sistema de Estimativas de Emissões de Gases de Efeito Estufa do Observatório do Clima (Seeg). Há ainda as emissões ligadas ao desmate para dar lugar a pastos, mas o inventário do Seeg inclui as emissões de mudanças da terra em geral, sem segregar as causadas por ações como o avanço da pecuária.

Em sistemas de ILPF, a captura de carbono no solo pode subir de 10% a 30%, enquanto as emissões de metano caem de 11,6 quilos por arroba de carne produzida para 1,5 quilo, segundo a Embrapa.

Mais para frente, com dados consistentes sobre a mitigação de gases-estufa, a Liga do Araguaia quer atuar como vendedora de créditos. Para isso, ela terá que contratar auditorias de terceira parte e seguir metodologias internacionais e registros em bases globais, como da Verra. Com uma avaliação conjunta de todos os pecuaristas envolvidos na Liga, o custo da geração de crédito de carbono pode cair.

O grupo considera também entrar com um pedido de Denominação de Origem (DO) do gado do Médio Araguaia. “Pode ser um registro que carregue consigo índices de sustentabilidade que você possa checar a qualquer momento em uma base de dados verificável e de qualidade, com padronização na produção, animais mais jovens e de qualidade superior”, defende Almeida.

Fonte: Valor Econômico.

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