O presidente da Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carnes (Abiec), Roberto Perosa, afirmou que ainda acredita em uma “saída negocial” com os Estados Unidos para contornar o tarifaço e voltar a exportar carne bovina para lá, mas criticou a atuação do governo brasileiro nas tratativas com os americanos. Segundo ele, o Executivo não terá êxito se insistir em negociações “em bloco” para tentar reverter as tarifas de 50% sobre os produtos nacionais e será necessário tratar cada setor afetado de forma individualizada nas conversas com Washington.
“Louvamos a iniciativa do governo brasileiro, mas até o momento não tem tido êxito”, afirmou nessa segunda-feira (11/8), em sessão na Assembleia Legislativa de São Paulo. “Estamos pedindo ao governo que continue e intensifique as negociações, talvez fazendo negociações por setores até atingir todo o escopo que deseja atingir, mas iniciando por aqueles setores que os EUA entendam como mais essenciais nesse momento, para que não haja negociação em bloco e sim por setores para que possa atingir os objetivos mais facilmente”, acrescentou.
Segundo Perosa, que foi secretário de Comércio e Relações Internacionais do Ministério da Agricultura por dois anos, é “muito difícil” negociar em bloco com os EUA. “Acredito em uma saída negocial; não há outra saída para nós”, indicou. “Estive à frente das negociações com os EUA por dois anos. Sei muito bem o que eles querem e sei o que o Brasil pode oferecer, mas as coisas mudaram porque entraram componentes políticos nessas negociações, não só comerciais. Esperamos que componentes políticos sejam direcionados aos agentes políticos e não ao setor produtivo”, completou.
Perosa afirmou que mantém articulação com os importadores americanos e com empresas brasileiras com operações nos EUA, como JBS e Marfrig, para tentar acessar a Casa Branca e o Congresso do país para demonstrar os benefícios da carne brasileira para a economia americana.
“O preço da carne nos EUA não para de subir. Já está gerando certo caos e pressão das empresas americanas sobre o governo americano, as redes de fast food têm falado com [o presidente Donald] Trump sobre a situação”, apontou.
“Nós temos falado com importadores e empresas brasileiras que têm operação própria para fazer a interlocução com o governo e o Congresso americanos, explicando os benefícios que a carne brasileira leva ao mercado americano. A carne faz parte do blend, faz parte do controle inflacionário, garante o acesso da classe média baixa à carne bovina, proteína essencial para a subsistência humana, e é muito cultural nos EUA”, afirmou Perosa.
Ele reforçou que o Brasil exporta para quase 160 destinos, mas não tem capacidade de realocar toda carne exportada para os EUA. Os produtos enviados aos americanos, recortes magros do dianteiro bovino, não são tão consumidos pelos brasileiros, mas a internalização desses itens pode diminuir preços nas gôndolas e afetar a cotação da arroba do boi aos pecuaristas.
“A nossa pecuária é altamente capilarizada e não conseguimos achar outros destinos como EUA eram, nosso segundo maior mercado, com essa concentração de demanda e com essa rentabilidade na questão do preço pelo momento que eles vivenciam pela falta de carne”, disse na audiência.
Segundo o dirigente, a volumetria que o mercado americano demanda “não se acha em qualquer esquina”. Ele ponderou que será necessário aprender a conviver com a “Trumpulência”, nas palavras dele, os momentos turbulentos sob a presidência de Trump nos EUA.
“O Brasil exporta o dianteiro do boi, que tem baixo potencial de consumo aqui. Dá para internalizar [o que deixará de ser enviado aos EUA], mas não tudo. O brasileiro não tem costume de comer carne moída todo dia. Não dá para internalizar tudo nem há destino que requeira essa demanda”, explicou. “Isso afeta a pecuária, afeta a arroba do boi. O boi teve queda com anúncio das tarifas, mas deu reagida com a alta demanda da China, mas não é uma coisa segura para os próximos meses se não retomarmos o mercado”, ponderou.
Os EUA representam 12% de tudo que o Brasil vende de carne bovina. “Não temos onde colocar no mundo. Vamos ter que internalizar a carne com depreciação do preço interno, que é muito ruim”, completou.
Em julho, o Brasil bateu recorde de exportação para um mês, com mais de 313 mil toneladas de carne bovina embarcadas. Parte disso, explicou Perosa, é movimento de antecipação às tarifas.
“Estamos em uma crescente de 13% a 14% no volume em relação 2024, ano em que batemos todos os recordes. A previsão que faltaria animais [para abate no Brasil] não se confirmou. Continuamos em ritmo crescente para as exportações”, afirmou.
Fonte: Globo Rural.