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Apreensão de gado e o xis da questão: por que os fornecedores indiretos são um gargalo na pecuária

O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) notificou 12 frigoríficos, por seu suposto envolvimento em um esquema de compra de gado vindos de terras desmatadas ilegalmente na floresta amazônica, de acordo com um documento visto pela Reuters nesta sexta-feira (29). O Ibama fez um comunicado na quinta-feira, sem nomear nenhuma das partes, que esses frigoríficos “estão sob investigação por aquisição de gado suspeito, triangulado com fazendas ‘limpas’ para disfarçar a origem ilegal”. O Ibama acrescentou que já havia multado seis frigoríficos não identificados em R$ 4 milhões pela “compra direta de 8.172 cabeças de gado de áreas embargadas”.

Entre as empresas citadas estão JBS, Frigol e Mercúrio. Procurada pela Forbes, a JBS disse que: “não realizou compras da fazenda Rancho Verde, indicada na autuação do Ibama”, e que a “JBS aguarda ter acesso ao relatório completo da fiscalização para fornecer informações ao Ibama”.

A Frigol disse em um comunicado que o Ibama cometeu um erro, acrescentando que não comprou gado da fazenda que o órgão disse ter sido ilegalmente desmatada. O presidente do conselho da Mercúrio, Lincoln Bueno, disse à Reuters que uma empresa terceirizada monitora a origem dos animais que a companhia abate, acrescentando que são bloqueadas compras de propriedades com irregularidades ambientais e trabalhistas.

Como parte da investigação do Ibama, o órgão disse que apreendeu mais de 7.000 bovinos que estavam em 2.100 hectares de fazendas cujo desfrute comercial estava bloqueado após o desmatamento ilegal. “Produzir, vender ou comprar gado dessas áreas embargadas é crime ambiental e os responsáveis são autuados”, diz o comunicado do Ibama. Foi aplicado um total de R$ 49 milhões em multas, sem especificar se foram a empresas ou pessoas.

Entenda por que rastrear todo o gado ainda é um desafio

O Brasil possui um rebanho de cerca de 230 milhões de bovinos. No ano passado foram abatidos 39,3 milhões de animais, um recorde histórico segundo o IBGE. No primeiro trimestre de 2025, o abate foi de 9,87 milhões de bovinos, também recorde para o período. Há no país 2,5 milhões de propriedades agropecuárias com bovinos no país, sendo que deste total 1,38 milhão são dedicadas exclusivamente à criação de gado de corte. Os 7.000 bovinos apreendidos pelo Ibama representam cerca de 0,018% do total abatido em 2024.

Na última década, por conta de tecnologias digitais disponíveis, o setor de carne bovina no Brasil vem investindo em ferramentas de rastreabilidade para garantir que os animais comprados para o abate estejam em conformidade com a legislação ambiental e trabalhista. Mas o processo é desafiador porque envolve diferentes elos da cadeia pecuária.

Para os frigoríficos, os fornecedores de gado estão divididos entre o fornecedor direto, que é a fazenda que entrega o lote de animais diretamente na empresa, emitindo a nota fiscal e a Guia de Trânsito Animal (GTA); e o fornecedor indireto, que é qualquer fazenda anterior na vida do animal, como as etapas de cria e recria. Os indiretos vendem ou transferem bois ao fornecedor direto, mas não lidam diretamente com o frigorífico.

As empresas frigoríficos já possuem protocolos consolidados para monitorar seus fornecedores diretos. Eles cruzam dados de Cadastro Ambiental Rural (CAR), embargos do Ibama, registros de desmatamento por satélite e a lista de trabalho análogo à escravidão. Essa prática nasceu em 2009, com o TAC da Carne, que estabeleceu compromissos de compra legal em vários estados da Amazônia.

Os grandes frigoríficos signatários do TAC da Carne (JBS, Marfrig, Minerva, entre outros) declaram que conseguem monitorar praticamente 100% das compras de fornecedores diretos. Auditorias independentes, como as conduzidas pelo Ministério Público Federal (MPF) e analisadas pelo programa Boi na Linha, mostram que o índice efetivo de conformidade costuma variar entre 98% e 99,9% nos grandes grupos. O Boi na Linha é uma iniciativa criada em 2019 pelo MPF, em parceria com o Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon), para fortalecer a fiscalização e a transparência na cadeia da carne bovina no Brasil.

O xis dos fornecedores indiretos de gado

Entre os principais problemas no monitoramento dos fornecedores indiretos está a fragmentação de dados. As GTAs não são integradas em um sistema nacional de acesso público, o que dificulta acompanhar todo o histórico do animal. Outro desafio é a longa cadeia, porque cada boi pode passar por diversas fazendas, o que aumenta exponencialmente a complexidade de rastrear sua origem.

Há também a falta de padronização, com frigoríficos utilizando sistemas diferentes, nem sempre interoperáveis, o que dificulta garantir a conformidade em toda a cadeia. Além disso, há custos de adequação. Pequenos e médios pecuaristas podem ter dificuldades em atender rapidamente às novas exigências de rastreabilidade. E mais, pode ocorrer triangulação ou “lavagem de gado”, onde animais oriundos de áreas embargadas são transferidos para propriedades regulares antes do abate, mascarando a origem.

Para esse público, os indiretos, há iniciativas em andamento para enfrentar esses obstáculos, com os frigoríficos adotando diferentes estratégias. Por exemplo, a JBS lançou em 2021 o cadastro dos produtores na “Plataforma Pecuária Transparente”, baseada em blockchain, para monitorar os fornecedores diretos e também os indiretos, ampliando a transparência.

Criou também o Cowbot, uma ferramenta desenvolvida para aprimorar o monitoramento socioambiental na cadeia de fornecimento da pecuária, via WhatsApp. Como ela, é possível consultar a conformidade socioambiental de propriedades rurais antes de fechar negócios. Outra ação, voltada ao estado do Pará, na região Amazônica, foi a doação de 3 milhões de tags para rastreabilidade de rebanhos de bovinos e búfalos até o final de 2026.

Mas a JBS não está sozinha nestas ações. A Marfrig, por exemplo, utiliza formulários (RFI) nos quais os pecuaristas declaram a origem dos animais, e a Minerva integrou o sistema Visipec, que cruza dados públicos para avaliar fornecedores indiretos, entre outras ações de ambas as companhias. Além disso, bancos e investidores passaram a condicionar crédito à comprovação de rastreabilidade, o que pressiona ainda mais pela expansão do monitoramento para os indiretos.

Fonte: Forbes.

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