Por José Rodolfo Panim Ciocca1, Stavros Platon Tseimazides1 e Mateus J.R. Paranhos da Costa1
Anualmente são abatidos mais de 45 milhões de bovinos de corte no Brasil (Anualpec, 2005). A grande maioria dos animais destinados ao abate é transportada em caminhões por rodovias. A rede de rodovias no Brasil tem mais de 1,6 milhões de quilômetros, sendo 1,3 milhão Km de rodovias municipais, 230 mil Km de rodovias estaduais e 73 mil Km de rodovias federais. Apenas 10% das rodovias federais são pavimentadas. De acordo com a Confederação Nacional do Transporte (CNT 2006) apenas 11% das rodovias pavimentadas estão em ótimas condições e 17% em boas condições.
O transporte de bovinos, um dos segmentos do manejo racional pré-abate, é considerado relevante quando se trata em bem-estar animal. Vários estudos mostraram que o transporte de bovinos pode provocar estresse, perda de peso e contusões, podendo inclusive levar animais à morte quando realizado em condições muito desfavoráveis (Tseimazides, 2006). Havendo assim perdas quantitativas e qualitativas da carne, com prejuízos diretos ou indiretos para produtores, frigoríficos e consumidores finais, deteriorando o produto final e conseqüentemente depreciando seu valor comercial.
Perdas quantitativas, as que ocorrem principalmente devido a contusões, causam prejuízos diretos ao produtor, resultando em queda no rendimento da carcaça após a retirada das áreas contundidas antes da pesagem, e ao frigorífico, quando as contusões são percebidas apenas durante o processo de desossa. Ocorrendo ainda, em pequena quantidade, casos em que o hematoma só é detectado na mesa do consumidor.
Perdas qualitativas, decorrentes de estresse durante o manejo pré-abate, resultam em alterações metabólicas que comprometem a qualidade da carne. Quando o animal sofre o estresse ou faz esforço físico, ocorre a queima da reserva de glicogênio presente nos músculos, que pode levar a carnes com valores de pH indesejáveis.
Para certos mercados, a União Européia, por exemplo, os limites de pH devem ficar entre 5,5 e 5,8. Além disso, carnes com pH igual ou maior que 6,0 (tipo DFD) são consideradas de pior qualidade, sendo destinadas a mercados menos exigentes, que pagam menos.
Uma das principais variáveis que afeta o bem-estar dos animais durante o manejo pré-abate é o comportamento das pessoas que estão dirigindo o veículo e manejando esses animais durante o embarque e o desembarque.
Foi realizada uma pesquisa em um frigorífico no Estado de São Paulo e verificou-se que, após o treinamento dos funcionários envolvidos no transporte (embarque, viagem e desembarque) ocorreu uma evolução em ganhos quantitativos e qualitativos da carne.
Por exemplo, Tseimazides (2006) observou redução no valor médio de pH de carcaças de bovinos da raça Nelore com o treinamento dos motoristas dos caminhões em boas práticas de manejo durante o embarque, condução do veículo e desembarque, sendo que não houve efeito significativo para animais cruzados (Figura 1). O fato de não haver diferença significativa para os animais cruzados pode estar ligado a menor reatividade dos mesmos em relação ao Nelore.
As freqüências médias de hematomas em cada grupo genético antes e após o treinamento são apresentadas na Figura 2. Houve redução significativa na quantidade de hematomas após o treinamento para ambos os grupos genéticos.
Grandin, T. Introduction management and economic factors of handling and transport. In: Grandin, T. Livestock Handling and Transport, 2nd. Ed. Wallingford: C.A.B.I. 2000. p. 1-14
Knowles, T. G. A review of the road transport of cattle. Veterinary Record, London, v. 144, n.8, p.197-201, 1999
Luchiari Filho, A. Pecuária de Carne Bovina. São Paulo: R Vieira, 2000. 134p.
Paranhos da Costa, M. J. R.; Zuin, L. F. S.; Piovezan, U. Avaliação preliminar do manejo pré-abate de bovinos do programa de qualidade de carne bovina do Fundepec. Jaboticabal: FCAV, UNESP, 1998. 21p. (Relatório Técnico).
Tseimazides, S. P. Efeitos do transporte rodoviário sobre a incidência de hematomas e variações de pH em carcaças bovinas. 2006. 60p. Dissertação de Mestrado – Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias, Universidade Estadual Paulista, Jaboticabal, 2006.
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1José Rodolfo Panim Ciocca, Stavros Platon Tseimazides e Mateus J.R. Paranhos da Costa, Grupo ETCO – Grupo de Estudos e Pesquisas em Etologia e Ecologia Animal, Departamento de Zootecnia, FCAV-UNESP, Jaboticabal-SP, Brasil
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Um excelente trabalho! Também tive a oportunidade de trabalhar com efeito do transporte nas perdas quantitativas de carne. Acho que o Brasil deve sim dar uma importância muito grande a esta característica.
Sem dúvidas melhorias terão que ser feitas nos caminhões gaiolas, mas devem pensar não somente no espaçamento, mas em alguns ítens como bebedouros, aspersores de água etc, pois só temos a ganhar com essas melhorias.
Tudo que precisamos é a integração entre os órgãos divulgadores destas informações com os pecuaristas, mostrando em um todo que ele tem a ganhar se usar o manejo adequado com seus animais.
Em estágios realizados em frigoríficos da região pode se observar muito bem as perdas que o manejo mal elaborado pode trazer, todos os produtores de carne bovina deveriam acompanhar o abate de seus animais e assim fazer valer os treinamentos com mão de obra citado no artigo.
O artigo é de excelente qualidade, pois retrata muito bem, o quanto se perde com o manejo errado no transporte dos animais destinados ao abate. As idéias inovadoras de melhoria são sempre bem vistas.