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Rastreabilidade: a hora da verdade chegou

Todos os envolvidos na cadeia da carne brasileira estão na expectativa do que vai acontecer nos próximos dias em relação à rastreabilidade. A última instrução do MAPA informa que a partir de 15 de julho somente carne de animais que estiverem cadastrados no Sisbov há pelo menos 40 dias terão permissão oficial para exportar ao mercado europeu.

Muitas dúvidas e críticas surgiram em relação à rastreabilidade. Obrigatoriedade, normas, tempo mínimo, “corralito”, sobre-preço para animais rastreados, etc, etc. Muitas perguntas, muitas respostas e muito pouco esclarecimento. Faz mais de um ano que muito se fala sobre esse assunto, mas a verdade é que muito pouca gente entende do tema. Infelizmente essa grande quantidade de opiniões de “experts” ajuda a aumentar a confusão.

A primeira questão levantada é a obrigatoriedade. Segundo as normas do SISBOV até o fim do ano toda a carne exportada deve ser oriunda de animais rastreados e até 2007 todo o rebanho nacional deve estar dentro desse banco de dados. Acontece que não é tão simples assim. Muitos acreditaram que não era preciso incentivar o produtor a aderir ao sistema, que não era preciso divulgar sobre o funcionamento, informar sobre obrigações e vantagens de ter seu rebanho nesses procedimentos. O fato de termos uma lei se incumbiria de fazer todos aderirem.

Na realidade da pecuária brasileira, com médias de produtividade muito baixas, grande dispersão geográfica e grandes diferenças de tecnologias e cultura é quase impossível alcançar a adesão de uma técnica nova e totalmente desconhecida pela grande maioria dos produtores de maneira rápida, sem um trabalho muito bem elaborado de divulgação.

Está clara a preocupação com uma possível queda das exportações, devido a nova regra de exigência de permanência de 40 dias no banco de dados do SISBOV. A questão principal é a credibilidade do MAPA nesse momento. No ano passado o ministério voltou atrás mais de uma vez, quando tentava impor um prazo maior da certificação antes do abate e inibir o “corralito”.

Todas as vezes que se voltou atrás nessa resolução o produtor foi desestimulado a aderir ao sistema de forma voluntária. A maioria dos frigoríficos não pagava nenhum acréscimo pela oferta de animais rastreados. A falta de informação, as idas e vindas da legislação e o não incentivo por parte dos frigoríficos fez com que uma pequena porcentagem de produtores acreditassem no SISBOV. O que se ouve até hoje ao se perguntar sobre rastreabilidade muitas vezes é: “Não sei ao certo o que é, só sei que não pegou”.

A questão do sobre-preço por animais rastreados é bastante polêmica, uma vez que todos sabem do problema recorrente de quebra de peso na balança em diversas regiões do Brasil. Como se esperar um prêmio por animais de qualidade ou por animais certificados se não se consegue nem a garantia de que o peso correto será obtido? Isso se deve também ao fato de que muitos produtores não acompanham atentamente o abate de seus animais, não sabem exatamente quanto seus animais pesam ou qual a estimativa de rendimento, de acordo com raça, peso e acabamento de gordura.

Mas parece que estamos caminhando para uma nova etapa, com mais seriedade. O MAPA parece firme em seus propósitos e não deve voltar atrás na resolução de exigir mínimo de 40 dias no banco de dados do SISBOV. A afirmação de que é preciso mais tempo para a adequação não é válida para mais um adiamento. Ainda há tempo para uma adequação e já se percebe uma corrida por parte dos produtores para certificarem animais antes do dia 15 de julho, buscando um possível sobre-preço, caso haja escassez de animais com certificado do Sisbov.

É verdade também que é preferível diminuir as exportações por alguns dias e moralizar todo o processo de certificação. Hoje há o risco de uma auditoria internacional, que encontrando alguma não-conformidade, embargue as exportações por um período muito mais longo. A certificação de animais dentro do curral do frigorífico, ou na fazenda momentos antes do embarque para o abate é um motivo plausível para esse possível embargo.

É muito importante lembrar que todos os programas de carne de qualidade sérios, em inúmeros países do mundo, têm um programa de rastreabilidade. Todas as empresas, inclusive no Brasil, que estão empenhadas na produção de carne com um programa de qualidade assegurada têm incluído voluntariamente a rastreabilidade, sabendo que servirá como garantia extra de segurança alimentar de seus produtos.

Se queremos ter o Brasil fornecendo carne no mercado internacional, com preços que garantam a lucratividade de toda a cadeia, será imprescindível ter rastreabilidade. Uma rastreabilidade mais séria do que o que vem sendo praticado no Brasil até ontem.

0 Comments

  1. Mario Eugenio F. B. Echeverria Pérez disse:

    Esperamos que esta exigência de rastreabilidade da carne para exportação seja também para a comercialização no mercado interno de maneira a que de uma vez por todas a @ de um novilho precoce não continue valendo igual a @ de um boi de carro ou de um marruco velho….

  2. Jorge Humberto Toldo disse:

    Prezados Senhores, Miguel e Mario Eugênio.

    Infelizmente ambos estão certos. Mas o problema maior é que ninguém quer enfrentar a causa disso tudo, por comodismo, falta de informação, enfim, que é exatamente a eterna quebra de braço entre pecuaristas e frigoríficos.

    Até hoje os pecuaristas vêem nos frigoríficos uma parte contrária na cadeia produtiva e esses por sua vez acabam até ganhando com essa desunião dos pecuaristas.

    Enquanto ambos não juntarem força e trabalharem juntos na melhor forma da “comercialização ampla” do boi/carne, não haverá resultado nessa disputa e quem perde são os produtores.

    Aí vem o problema, bem colocado, pelo Mário Eugênio em seus comentários, boi velho e sem qualidade sendo misturado aos precoces.

    Mas pergunto hoje eu tenho precoce e amanhã? Pergunto porque sou comprador de bois de uma grande rede de frigorífico e conheço de perto a dificuldade de manter uma escala de bois bons.

    Simplesmente não existe padronização de bois no Brasil em escala. Já pensaram se a Ford fizesse um carro diferente do outro no mesmo modelo? Será que você arriscaria comprar um para ver se saiu bom ou não?

    Como podemos cobrar pelo couro, pela precocidade, pela identificação, pela qualidade enfim, se temos alguns desses itens em alguns dos lotes comprados?

    Devemos parar de procurar os culpados e resolver o problema definitivamente. Se alguém ainda tem dúvidas eu respondo: os culpados disso tudo somos NÓS! Pensem nisso.

    Abraços.

  3. Mario Angelino disse:

    Concordo plenamente com o artigo, porém, gostaria de salientar que, enquanto todas as partes envolvidas no processo de rastreabilidade (produtores, frigoríficos, certificadoras, governo) não se concientizarem de seus erros, e objetivarem resolve-los, nunca chegaremos a lugar algum, sempre apontando e enfatizando os erros alheios, e não observando que, às vezes, podemos estar tanto quanto, ou até mais errados que os outros.

  4. José Antonio Verdi disse:

    No meu ponto de vista, acredito ser a rastreabilidade um problema do criador, que numerando os bezerros, colocando sua marca, letra de
    série correspondente ao ano de nascimento, especificando vacinas ou outros, os animais sendo vistoriados por orgão competente, até pelo próprio Mapa, dentro de 2/3 anos todos os nascidos estariam dentro do programa.

    Quanto as vacas seriam numeradas de imediato e catalogadas.

  5. Carlos Eugênio de Abreu Martins disse:

    A possibilidade de um sobrepreço aos animais rastreados a partir do dia 15, dada a escassez destes animais, é nula.

    Os animais serão “rastreados” na mangueira, momentos antes do abate.

    Não se iludam aqueles que já possuem seus animais rastreados, como praticamente não existe fiscalização específica sobre este quesito, também não há vantagem competitiva na rastreabilidade.

  6. Fernando Penteado Cardoso disse:

    Caro Miguel:

    Tanto Você como Katia Nogueira e Tito Machado Jr. estão preocupados com a rastreabilidade. Com justa razão, já que o MAPA irá aplicar “de fato” o desiderativo SISBOV.

    Tempos atrás dei minha opinião sobre o assunto sob o título “Complicômetro“.

    Perguntam o que vai acontecer a partir de dia 15 se, como afirma o Secretário Amaury, o MAPA exigir o cumprimento da lei a ferro e a fogo. A resposta é simples: haverá uma queda temporária do abate que se concentrará nos criadores/invernistas elitizados que já praticam a marcação em seus rebanhos.

    A produção da pecuária do sertão ficará encalhada por algum tempo até que, pressionado, o MAPA venha a encontrar uma solução do mesmo gênero que adotaram para a soja transgênica produzida no RS.

    Já conversamos sobre seu ponto de vista de que o “sistema é imprescindível e que a matéria deve ser levada mais a sério”. Respeito sua opinião, mas a considero um tanto eivada de gloriosa juventude e de louvável idealismo, o que por vezes se distancia da realidade prática.

    Duas dúvidas persistem em minha mente:

    1) o corte que chega ao mercado europeu identifica o número do boi do qual provem? Se a resposta for negativa, então porque não limitar a rastreabilidade à identificação existente, que é a marca do abatedor? Como tive a oportunidade de defender por ocasião do Simpósio de Ribeirão Preto.

    2) Como foi a negociação com as autoridades européias? Quem negociou? Explicaram a diferença de nossa pecuária em relação à existente naquele continente? As exigências não teriam encoberto uma segunda intenção protecionista disfarçada? Estavam presentes os produtores de etiquetas, brincos, transponders, etc.e os pretensos “certificadores”, uns e outros ávidos por novos mercados? Ficaram eles “fofocando” nos bastidores? Já participei de reuniões internacionais e tenho idéia do que vai atrás das cortinas. Resumindo, foi uma negociação inconveniente e negativa, que admitiu a absurda idéia de que nossos bovinos padecem de riscos sanitários, ao em vez de mostrar, de provar e de assegurar que temos boi criado a pasto ao natural (salvo quando de pista) e que nosso produto, – a carne, – é saudável, absolutamente livre da BSE.

    E agora José, o que fazer? Retornar a Bruxelas, e dizer à agência adequada, que a pecuária do Brasil é diferente, que não dá para numerar e acompanhar “pari passu” nossos bois pelo sertão adentro. Convidar uma comissão para vir visitar o Pantanal, os varjões e nossos campos e cerrados. Afirmar a eles que podemos, sim, fiscalizar severamente o pré-abate, condenando os animais que se mostrem depauperados.

    Dizer que aceitamos de bom grado que venham inspecionar os abatedouros, como fazem os americanos com nossas frutas (mangas de Petrolina/PE,p.ex.) e os judeus com os produtos kosher.

    Esse o desafio para nosso bem intencionado e operoso ministro Roberto Rodrigues.

    Atenciosas saudações,

    Fernando Penteado Cardoso

  7. Monica Maria Borges disse:

    Estou a muito observando todo este movimento de rastreabilidade no Pais e muitas coisas eu não consegui entender.

    Todos os animais do Pais já são rastreados pelos serviços de Defesa Agropecuários dos Estados, fruto de convênios existentes a mais de 40 anos com o MAPA, esta rastreabilidade é documentada através da GTA “Guia de Transito Animal” emitida por este serviço, conferindo o cadastro se está atualizado com relação as exigencias sanitárias.

    Me causa estranhesa os estados não terem reclamado a atividade para si, uma vez que no mundo inteiro a atividade é oficial, porém com a participação dos setores privado, cientifico, comercial e politico na conferencia, auditorias de verificação dos serviços e definição das políticas para a atividade.

    A pecuária poderá perder muito dinheiro já investido nas defesas estaduais, se resolver substituir pelo serviço privado esta atividade que é de saúde pública. Para exportação os agentes comerciais deverão organizar seus fornecedores para cumprir as exigências dos clientes, nós só exportamos para Europa 5% da nossa produção e para atender a este mercado não podemos exigir tais medidas para toda a pecuára brasileira.

  8. colin butterfield disse:

    Acho a rastreabilidade fundamental para a pecuária brasileira.

    Mas vale lembrar que toda tecnologia apenas é incorporada com seriedade quando o usuário tem um ganho econômico com o mesmo.

    Exigências legais estão quase sempre fadadas ao fracasso.

    Assim sendo, está mais que na hora da cadeia da carne se modernizar e começar a remunerar um produto superior, tipificado e rastreado.

    Tá mais do que na hora te termos um “grading brasileirado”.

  9. Luiz Antônio Lima Gonçalves disse:

    Caros Senhores,

    Hoje é a Comunidade Européia quem exige a rastreabilidade, amanhã certamente os EUA e outros países, a médio/longo prazo até mesmo nós consumidores Brasileiros estaremos exigindo, quem não quer saber e ter aprovado a origem de seus alimentos?

    Rastreabilidade é um tema “novo” no Brasil, e tudo que é novo gera um certo desconforto pelo simples fato de ser “novo”.

    Temos o maior rebanho de boi “verde” do planeta, BSE está a milhas de distância, aftosa sob controle, entendo que do ponto de vista de qualidade não temos o que temer, então só resta o medo do banco de dados.

    Rastreabilidade é a grande chave do sucesso para o Brasil se firmar como o maior exportador de carne do Mundo, vamos oferecer mais este item de qualidade para quem consome.

    Luiz Antônio Lima Gonçalves
    Consumidor de Carne