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Simon Mead: a Rastreabilidade no Reino Unido

Buscando aprofundar os conhecimentos e a discussão da rastreabilidade no Brasil, o BeefPoint entrevistou Simon Mead, sobre a experiência com a rastreabilidade no Reino Unido. Simon trabalha no MLC, que é o conselho de Pecuária do Reino Unido. Mead é o responsável pelo planejamento de estratégias para a cadeia da carne bovina no Reino Unido. Os problemas com a indústria animal desse país (ex.: BSE) forçaram o desenvolvimento rápido de novas técnicas, como a rastreabilidade.

BeefPoint: Quais são os pontos críticos da implementação da rastreabilidade em uma propriedade rural?

SM: Bem, como você sabe, nós não temos propriedades rurais no Reino Unido da forma como vocês as conhecem. O tamanho médio de nossos rebanhos é de 28 animais!

Há uma série de pontos críticos para a implementação adequada da rastreabilidade, entrada de dados nos formulários e bases de dados computadorizadas, uma vez que o animal deve ser identificado desde seu nascimento.

Todos os animais do Reino Unido estão em uma base de dados central e, cada vez que um animal é movimentado, a base de dados é informada por um sistema de dupla entrada. Qualquer erro que ocorra nesta transcrição tem que ser individualmente avaliado e corrigido, e isso requer, de uma perspectiva nacional, muitos recursos.

BeefPoint: Quais são os problemas?

SM: A base de dados nacional utiliza softwares que fazem o reconhecimento de caracteres e digitalizam a informação sobre a produção (os dados podem ser entregues em formulários especiais escritos a mão, e há um programa que lê esses dados). Esse sistema não é capaz de nos fornecer dados suficientes sobre a estrutura de uma indústria para que sejam feitos planejamentos ou propostas estratégicas, e, para os produtores individuais, o computador tem muitos problemas ao tentar ler esses formulários, quando preenchidos com letra ruim!

BeefPoint: Os produtores já perceberam ganhos no manejo com a implementação de sistemas de rastreabilidade?

SM: Muitos produtores estão utilizando o sistema de identificação eletrônica há algum tempo, e apesar desse sistema proporcionar a eles uma economia de tempo e fazer com que o gerenciamento dos dados seja feito mais facilmente através da leitura de transponders no animal (especialmente em grandes operações), muitos dados precisam ser também transcritos para o papel, ou enviados para outros sistemas eletrônicos. Há, portanto, muito pouca economia de tempo real.

O sistema de rastreabilidade do Reino Unido também garante que todos os animais sejam identificados de forma dupla e, particularmente para criações de gado de raça, isso é bom porque permite ver nos descendentes as interações fenotípicas e genotípicas dos ancestrais, como demonstrado pelo sistema de identificação.

Na minha opinião, existem muitos outros benefícios de se ter um computador na fazenda. Ele permite obter o registro dos animais totalmente computadorizado, com baixos custos adicionais, que poderá melhorar os processos de tomadas de decisões na propriedade, ou apresentar dados que também permitirão que melhores decisões de manejo possam ser tomadas.

Em nível nacional, nós queremos poder instalar um programa de dados nas criações, com dados sobre o abate obtendo um rápido feedback de resultados, especialmente em rebanhos que utilizam cruzamentos. Mas, isso é tudo para o futuro.

As demonstrações dos sistemas de identificação eletrônicos em fazendas ainda não são perfeitas, mas apesar disso, nós agora estarmos discutindo a possibilidade de identificar todo o rebanho ovino do Reino Unido!

BeefPoint: Qual a opinião dos produtores – de seu ponto de vista – sobre a aplicação deste sistema? Uma oportunidade, um requerimento do governo sem sentido, mais custos, etc?

SM: Os produtores mais esclarecidos não estão discordando, estão até engajados em empregar as tecnologias há algum tempo. Alguns pequenos produtores, ou ainda, os produtores mais tradicionais, continuam encontrando problemas. O custo real do sistema é realmente baixo.

BeefPoint: Como os frigoríficos do país estão lidando com a rastreabilidade? Colocando números individuais nos animais, em suas carcaças ou cortes, ou estão fazendo a identificação por grupos de animais?

SM: Todos os animais são totalmente rastreados antes de entrar na frigorífico, e serão avaliados frente ao registro central. Então, todas as fábricas identificam as carcaças individuais dos animais, e, uma vez que a mesma for cortada, cada uma das partes será rastreada.

Alguns frigoríficos adotam o sistema de rastreamento através do DNA, que pode ser aplicado no corte. As regulamentações de identificação da Europa forçam isso (em diferentes níveis, eu acredito).

A rastreabilidade pode significar coisas diferentes para os diferentes membros da cadeia de produção, mas para o consumidor, cada pedaço de carne precisa ser rastreado no mínimo com um código em conjunto, chegando até um grupo de animais (o grupo de abate).

Para alguns, essa técnica tem baixo nível de sofisticação, podendo ser feita a identificação individual dos animais. Na França, alguns estabelecimentos de varejo têm um sistema de rastreabilidade individual em funcionamento em cada corte, mas eu acredito que é mais uma forma de propaganda do que, talvez, uma preocupação real. Entretanto, se os estabelecimentos de varejo do Reino Unido querem esse sistema, a indústria tem que fazê-lo!

BeefPoint: Os produtores acreditam em um preço de recompensa?

SM: Sim, alguns produtores estão obtendo mais do que a média. Enquanto que alguns, estão obtendo menos, pois não se adequaram às novas exigências do mercado. Isto é a natureza das estatísticas!

Há muitos esquemas de preços premium, a raça Aberdeen Angus através do Waitrose é um bom exemplo, mas há muitos outros, dependendo da raça, proveniência, sistema de produção, etc (para que haja um sobre-preço, não adianta ter apenas rastreabilidade, qualidade, marca e propaganda são necessários também).

Dependendo desse conjunto de fatores (rastreabilidade, raça, qualidade dos e da carne, etc) existem frigoríficos dispostos a pagar mais por essa carne, hoje.

BeefPoint: Você tem algum estudo sobre os custos totais do processo? Eu realmente gostaria de ver uma planilha eletrônica analisando isso!

SM: Eu também, você tem alguma?! Nós temos vários grupos de dados e análise dos mesmos, embora a indústria tenha concordado em fazer muito mais, incluindo o desenvolvimento futuro de estudos de benchmarking.

Tudo isso levará a produção de carne bovina do Reino Unido a ser a melhor do mundo!

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1Simon Mead entrou no Meat and Livestock Council (MLC) em 1998 como Chefe de Estratégias em Carne Bovina, responsável pela Diretoria Geral para gerenciamento do Conselho de Estratégias para Pecuária. Ele tem grande experiência na indústria de nutrição animal e cooperativas. Se formou na Universidade de Nottingham (Inglaterra), com pós-graduação em gerenciamento, começando a trabalhar como especialista em nutrição animal, com experiência direta em problemas das cadeias agro-alimentares inglesas (ex.: BSE), os quais vêm afetando as indústrias de carne e leite do Reino Unido. Mead anteriormente lançou conceitos sobre rastreabilidade no setor de alimentação animal, fornecendo vantagens competitivas para o setor. As funções exercidas anteriormente capacitaram Mead a ganhar conhecimento sobre os métodos necessários para a integração da pesquisa, marketing e atividades comerciais, que está atualmente sendo aplicado em sua função, de desenvolvimento de estratégias, dentro do MLC.

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