Por Lucio Caleffi de Azevedo
Quando pensamos em produção de alimentos, a primeira consideração que devemos fazer, enquanto profissionais da área, é sobre a segurança alimentar. Não devemos sob hipótese alguma permitir que um alimento chegue às mãos do consumidor em condições inadequadas para consumo. É nossa responsabilidade zelar por sua total segurança alimentar.
Infelizmente isto é muito mais fácil de dizer do que de aplicar ao dia-a-dia. Durante as muitas visitas que realizo para certificar nossos fornecedores, encontro os mais variados tipos de irregularidades que comprometem a qualidade sanitária do produto em maior ou menor grau.
Se pudéssemos abordar um por um em um site como o Beef Point, o “wide” da “www” teria que ser realmente muito grande. Por isso, escolhi falar nesse artigo sobre um dos pontos mais importantes para nós, que beneficiamos a carne e a entregamos ao consumidor: A manutenção da cadeia de frio. Mais precisamente, o transporte da carne dos frigoríficos até os processadores com nós.
Atualmente, 36% das irregularidades encontradas em matérias-prima são devidos a temperatura fora do padrão. A legislação nos fala em manutenção da temperatura durante o transporte abaixo de 7ºC. Aqui usamos o padrão de 4,4ºC, citado pela literatura como um valor abaixo do qual os microorganismos que conseguem se reproduzir, não são patogênicos, ou seja, não causam mal a saúde.
Estes padrões adotados pela indústria se baseiam na teoria dos obstáculos de Leistner, que se fundamenta no conhecimento de quais características do produto (intrínsecas e extrínsecas) influem no crescimento microbiano. O controle dessas características em conjunto, ou separadamente, bloqueiam o crescimento dos microorganismos. Os microorganismos que crescem a esta temperatura, normalmente são destruídos a temperaturas acima de 30-35ºC, alguns autores afirmam que pela destruição de suas enzimas respiratórias.
A causa principal da chegada de matéria-prima fora da temperatura, comprovada pelos registradores de temperatura enviados por nossos fornecedores, é o não acionamento dos equipamentos geradores de frio, ou seu mal-funcionamento. Isto indica dois problemas: o primeiro é a não verificação por parte dos frigoríficos do funcionamento do equipamento antes de carregar o veículo, o segundo, mais grave, é o não comprometimento dos transportadores com a segurança alimentar dos consumidores.
A solução pensada por nós para este problema não é simples e envolve mudanças de comportamento em toda a cadeia. Deve haver um treinamento com as expedições dos frigoríficos, implantando um procedimento de verificação dos equipamentos geradores de frio antes de cada carregamento. É muito importante que a estrutura do veículo transportador esteja fria, antes da carga ser colocada em seu interior, senão, o que vai resfriar o veículo é a própria carga, aumentando sua temperatura. O resfriamento do veículo pelo seu próprio equipamento é um indicador de que ele está funcionando corretamente. Calibração de termômetros é outro fator importante. Para os transportadores, deve ser criado um cadastro daqueles em que ocorrem problemas de temperatura (reclamações, devolução de cargas, desconto de preços), cruzar estas informações e gradativamente deixar de utilizar os serviços daqueles que forem responsáveis por mais problemas.
As soluções parecem simples, mas envolvem mudanças de mentalidade das pessoas, o que tornam as coisas muito mais complexas. Ouvimos sempre a frase: “mas, eu faço isso há 20 anos e nunca deu problema!”, esquecendo, é claro, que há 20 anos não vivíamos tanto quanto agora, produzíamos muito menos, não vendíamos para tantos lugares distantes e às vezes, nem sabíamos a causa das nossas doenças ou mortes. E.coli O157:H7? O que é isso? Não sabe? Pois um lote de carne moída causou um surto nos Estados Unidos em 1992-1993 resultando em mais de 500 casos de pessoas doentes com várias mortes. A rede responsável pela contaminação foi à falência. Pensem nisso…
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Lucio Caleffi de Azevedo é Engenheiro de Alimentos, responsável pelo desenvolvimento de fornecedores da marca Bassi de cortes especiais, da Braslo Produtos de Carne Ltda, Glenmark do Brasil Ltda.
Para outras informações acesse: Bassi – o Artesanato da Carne