Essa referência global sobre uma nova postura de diálogo facilita a avaliação de um outro evento, agora a nível nacional, que parece representar um break through semelhante às reuniões da ONU. Refiro-me ao segundo Congresso AMAZONPEC que reuniu cientistas, técnicos, consultores e representantes de ONGs, dirigentes de associações da classe rural, estudantes e produtores durante 3 dias em Belém.
Reflexões sobre um evento notável na Amazônia
O mês de setembro revelou-se como momento memorável para a ainda polêmica questão da sustentabilidade. Ao nível global, a reunião anual da ONU em Nova York e as conversações paralelas do G-20 e do Conselho de Segurança demonstraram, pela primeira vez desde o final da 2ª guerra, uma tendência clara para a convergência do pensamento estratégico das principais nações que começam a assumir suas responsabilidades para esse novo mundo fortemente interconectado.
Em 3 áreas sensíveis construiu-se um diálogo de visão compartilhada. A crise financeira acelerou a busca para um novo formato do sistema econômico internacional. A consciência de grande parte das populações sobre os desafios do aquecimento global aprofundou a discussão sobre soluções concretas nas políticas ambientais. E a crescente insegurança da paz em função de proliferação da tecnologia de ponta deu o início para uma nova iniciativa de desarmamento nuclear.
Por enquanto são declarações. Mas, o que interessa é que, pela primeira vez, os tradicionais adversários falam sobre essas questões cruciais com o mesmo raciocínio pragmático e com um vocabulário afinado.
De Nova York para Belém
Essa referência global sobre uma nova postura de diálogo facilita a avaliação de um outro evento, agora a nível nacional, que parece representar um break through semelhante às reuniões da ONU. Refiro-me ao segundo Congresso AMAZONPEC que reuniu cientistas, técnicos, consultores e representantes de ONGs, dirigentes de associações da classe rural, estudantes e produtores durante 3 dias em Belém.
Ninguém menos que o sempre ministro Alysson Paulinelli abriu o Congresso com suas reflexões visionárias fundamentadas em décadas de construção da política agrícola e em sua experiência de agropecuarista de vanguarda. A primeira impressão da AMAZONPEC é que o mundo pós-crise está definitivamente mudando e que o Brasil está fazendo sua parte.
Esperava declarações fortes de discordância com as recentes medidas dos jovens procuradores da república que resultaram numa séria de impasses legais e, mais importante, na recusa das principais cadeias de varejo de comercializar “carne amazônica”. Lembrando que tudo isso aconteceu apenas há poucas semanas e que os grandes grupos de frigoríficos já manifestaram seu “compromisso” com a legalidade e a identificação de origem dos animais fiquei muito surpreendido de não assistir uma batalha verbal de lamentações e acusações.
Um segundo ponto interessante foi a observação que tanto as faculdades de ponta como o EMBRAPA dispõe de conceitos, tecnologias e experiências concretas in loco que representam um arsenal sólido para implementar, dentro de um horizonte de tempo razoável, uma série de projetos de “preservação através da integração” em propriedades de pequena media e larga dimensão.
A terceira revelação, e a mais importante a meu ver, foi o diálogo estruturado, sério e operacional dos líderes rurais, da industria regional da carne e até da associação dos comerciantes da carne.
Avaliação do discurso inovador
Nos longos debates de almoços e jantares com amigos ambientalistas ouvi a observação de que isso, por enquanto, é só discurso. Porém, mesmo se fosse, o que não acredito, não concordo com a conclusão dessa crítica: “É só discurso, então não serve!” Isto não procede, pois não se constrói nenhuma obra sem plano e sem explicação aos envolvidos. Porém, no caso concreto dos líderes da Amazônia devemos ponderar o seguinte.
Tudo começa com a conscientização que pode ocorrer em função de uma visão ou como reação à pressões externas. No caso da preservação dos recursos naturais do Brasil, os ambientalistas exerceram um papel fundamental ao longo das últimas duas décadas. Eles identificaram o desafio, formularam teses de fácil comunicação e provocaram as forças estabelecidas no sentido de tomar posição. No entanto, e como dizem os próprios, o discurso não muda muito. Foi a combinação de três eventos que mudaram o cenário.
A preocupação generalizada com as mudanças climáticas, reforçada pelo terremoto no sistema financeiro global e a reação de cadeia procuradores – varejo – frigoríficos deslanchou um processo irreversível de maior sensibilidade da população. Os tomadores de decisão nos diversos níveis públicos, institucionais e privados imediatamente sentiram a necessidade de repensar a estratégia da produção agropecuária, seja ao nível macro, nacional e regional, seja no ambiente das associações de classe e nas próprias fazendas.
Os congressistas ouviram testemunhos de programas setoriais inovadores dos estados de Rondônia (RoNatural) e Pará (Projeto Preservar). O surpreendente era que esses programas foram concebidos ao longo dos últimos 5 anos, ou seja bem antes do embargo da União Européia e dos relâmpagos dos procuradores. Tanto em termos estruturais e programáticos como na terminologia e nas soluções concretas esses “documentos antigos” (pré-crise) parecem ter sido redigidos apenas nas últimas 4 semanas. O que significa isso?
Com o choque da aftosa em 2005 e a montanha russa dos preços do boi ao longo do último ciclo, o produtor, seus representantes e parte dos órgãos públicos entenderam que o modelo tradicional da agropecuária precisa ser modernizado. Não revolucionado, pois existe experiência mundial suficiente para saber que isso não resolve, mas reformando com passos firmes e mensurados.
O que já começou e deve ser intensificado?
Os programas de sustentabilidade em execução em diversas regiões amazônicas encontram-se mais avançados do que o grande público e os observadores internacionais imaginam. Um bom exemplo é a combinação dos programas da EMBRAPA de “Boas Práticas” e da “Integração Lavoura-Pecuária-Floresta”. Uma equipe de mais de 70 pesquisadores operam campos de ensaios há bastante tempo nas principais realidades amazônicas.
Em articulação com SENAR, EMATER, SEBRAE, associações de produtores e consultores esse conhecimento prático está sendo passado para os líderes nas comunidades locais com o objetivo de acelerar o processo de novas práticas sustentáveis. O foco está no lucro (!). Pois, sem resultado e remuneração o produtor não pode, mesmo se quiser, tratar da preservação ambiental, de maior cuidado social e da tão complicada regularização das terras. É incipiente e pouco? É, mas representa um início pragmático e um passo importante na direção certa.
Agora são as ONGs que devem compreender que o papel delas, também, precisa evoluir. Como em Nova York, as principais partes envolvidas têm que estimular o diálogo construtivo. E não é impossível ou difícil demais.
Após a confrontação inicial em meados desse ano os procuradores, os governantes, a indústria, algumas ONGs e líderes rurais estão reunidos para encontrar um caminho que preserve, tanto os direitos e as conquistas do passado como a mãe natureza e a democracia no futuro. É preciso viajar para a Amazônia para ver! No próximo setembro faremos o balanço dos avanços reais e das muitas barreiras que ainda precisam ser vencidas.
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No sistema de integração agropecuária o maior beneficiado é a lavoura de grãos.
Celso de Almeida Gaudencio – Pecuarista, experiente em ecossistemas rurais
O solo adubado sob capim é terra protegida da ação do tempo, dos animais e dos homens.
O sistema misto de lavoura e pasto (integração agropecuária) é complementar, onde a lavoura de grãos adubada conduz a recomposição química e o pasto por dois ou mais anos melhoram os atributos físicos do solo.
Não existe pastagem degradada o que existe é solo com limitação química sob pastagem com baixa produção forrageira. Mas cuidado ao aumentar a capacidade de suporte dos pastos em 50 milhões de hectare para não abarrotar de bois o mercado.
Aumentar o índice de produtividade da pecuária de corte a pasto em 0,5 UA (unidades animais) por hectare (UA de 450 kg de peso corporal por hectare) em 50 milhões de hectares de pasto sob solo com limitação química, resultaria em um acréscimo de 25 milhões de unidades animais. Teríamos que encontrar mercado antes de se envolver nesta empreitada.
Sem querer discordar, no sistema misto (integração agropecuária) o maior beneficiado é a lavoura de grãos, então seria mais urgente instituir o sistema em áreas de monocultura de soja, mas isso constitui assunto para especialistas em ecossistemas rurais.
O solo sob pastagem devem ser gradativamente corrigido e adubado, e a pressão de pastejo mantida e não aumentada, para que não ocorra degradação do mesmo- o solo, portanto não devem ser aumentados os índices de produtividades na bovinocultura de corte.
Achei muito sensata a leitura feita pelo economista Francisco Vila sobre a pecuária na Amazônia e sobre o Evento AMAZONPEC como instrumento de desenvolvimento da Pecuária Sustentável na região.
Muitas tecnologias já se encontram disponíveis nas prateleiras das Instituições de Pesquisas que, ao serem postas em prática, poderão mudar de forma substancial o perfil produtivo da região.
O consumo de alimento no mundo vem crescendo a passos largos e o Brasil tem que está preparado para ocupar os espaços na área de produção pois nossa vocação para produzir alimentos nos torna imbatíveis e em condições de competir com qualquer nação onde o subsídio não seja a forma de viabilizar os negócios.
Parabéns Dr. Francisco Vila pelos excelentes comentários.
Antonio Erildo Lemos Pontes
Diretor Técncio do Instituto Frutal
caro Francisco Vila
Parabéns esta foi uma das análises mais lúcidas do que está acontecendo na Amazônia, no Brasil e no mundo, em relação a produção pecuária e meio ambiente.
Somos o coordenador do evento AMAZONPEC e juntamente com a FAEPA, Federaçao da Agricultura e pecuaria do Pará, sempre tivemos a certeza que as discussoes e as soluçoes para a produçao sustentada da Amazônia, passa obrigatoriamente pelos amazônicos, pelos produtores, técnicos, cientistas e políticos que moram, conhecem e respiram Amazônia, são estes cidadões que transformaram o Pará e Rondônia nos estados que mais crescem na produção agropecuária Brasileira e que fizeram tremer os países maiores produtores do mundo e estão transformando o país no maior produtor mundial de carne.
AMAZONPEC mostrou além da maturidade nas discussões, relatadas em seu artigo com muita propriedade, onde vossa senhoria fez uma inteligentíssma tradução, do centro das discusões do AMAZONPEC, o evento mostrou também quão evoluida está a genética da pecuaria de bovinos e bubalinos.
Esta convergência de genética de altissima qualidade, com produtores dedicados e muito profissionais e empreendedores, a forte base científica local e as condiçoes melhores do mundo para produzir carne, fazem destes estados o futuro da carne no mundo.
AMAZONPEC foi idealizado pelo Instituto Frutal e FAEPA, para colocar que Amazônia pode e deve produzir, num modelo diferente, elaborado pelos Amazônicos, com eixo na preservação e AMAZONPEC veio para puxar estas discussões em altissimo patamar de ciência , política e gestão.
Com certeza o artigo de vossa senhoria foi no centro da questão e engrandeceu nosso evento, mais do que isto engrandeceu o país na sua capacidade de gerir suas políticas e seus destinos.
Como presidene do AMAZONPEC e sobretudo como brasileiro, só tenho a dizer muito obrigado jornalista e cidadão FRANCISCO VILA, são pessoas com esta lucidez, com esta persepção de futuro que fazem a grandeza deste maravilhoso país
Evaldo Bringel Olinda
presidente do AMAZONPEC e do instituto FRUTAL
Prezado Vila,
o que você ouviu dos pesquisadores muitos técnicos e pecuaristas conhecem,entretanto pouco foi implementado e esta é a respsta ou ação mais correta para os ambientalistas.
um ponto importante é divulgar o que se esta sendo feito,aliás como você mesmo fez emitindo estes comentários sobre o amazonpec,porém temos que divulgar na midia impressa principalmente para que surja uma massa critica nos cidadãos e os produtores possam ser encarados como a classe que produz alimento!
um abraço.