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A verdade morro abaixo: o Código Florestal e as enchentes no Rio de Janeiro

Não é o Código Florestal Brasileiro que guarda relação com os fatos ocorridos na Região Serrana do Rio de Janeiro, como faz acreditar a matéria publicada pelo jornal Folha de São Paulo. Lamentavelmente, a matéria se aproveita da tragédia para tentar criar dificuldades no aperfeiçoamento de uma legislação anacrônica, que coloca hoje na ilegalidade quase 100% das propriedades rurais do País, principalmente as pequenas, onde vivem e trabalham milhões de brasileiros. O tipo de denúncia promovido por certos consultores e organizações não governamentais e acolhidos por jornalistas desavisados transforma-se em macarthismo ambiental, à semelhança da campanha contra os comunistas promovida pelo senador Joseph McCarthy nos anos 50, nos Estados Unidos, cuja ação dispensava qualquer tipo de prova ou verificação.

Não é o Código Florestal Brasileiro que guarda relação com os fatos ocorridos na Região Serrana do Rio de Janeiro, como faz acreditar a matéria publicada pelo jornal Folha de São Paulo, edição de 16 de janeiro (Revisão do Código Florestal pode legalizar área de risco e ampliar chance de tragédia).

A Lei Federal nº 6.766/79, que dispõe sobre o parcelamento do solo urbano – e que sequer foi mencionada na matéria – é o marco legal ao qual a matéria deveria se reportar.

É preciso deixar claro que o Código Florestal vigente no País e as mudanças em andamento na Câmara dos Deputados tratam apenas da ocupação de módulos rurais, deixando a questão urbana para a legislação específica.

Tanto o atual Código Florestal quanto o projeto por mim relatado apenas reproduzem dispositivos que destacam a diferença entre áreas destinadas à atividade rural daquelas indicadas para uso urbano, ou daquelas caracterizadas por uso urbano.

Encostas – A Lei federal estabelece que são os planos diretores municipais ou leis municipais que indicam as áreas destinadas a loteamentos e ocupações. A norma também proíbe o parcelamento do solo em regiões que ofereçam algum risco às atividades humanas, como “terrenos com declividade igual ou superior a 30% (trinta por cento), salvo se atendidas exigências específicas das autoridades competentes” (art 3o).

O atual Código Florestal, que considera como Áreas de Preservação Permanente as encostas acima de 45º de declividade, não abrange as áreas indicadas na matéria (ilustração 1).


Ilustração 1. O erro da Folha: o Código Florestal não trata das áreas citadas na matéria

E o projeto de lei que tramita na Câmara não altera esse dispositivo, conforme o quadro abaixo demonstra:

Não é verdade, portanto, que “o novo código libera” construções acima de 45° (ilustração 2).

Os autores da matéria deixaram de notar, por desleixo intelectual ou má-fé, que muitos pontos criticados em meu projeto de lei foram copiados literalmente da versão atual do Código. Os fraudadores haverão de explicar porque não os criticam na lei em vigor. A explicação é simples, embora humilhante: não leem, não pesquisam, portanto não sabem o que dizem.


Ilustração 2. Mais um erro da Folha: o Código Florestal e o projeto de lei consideram como áreas de preservação permanente as encostas acima de 45º de declividade e não “liberam”, como quer o jornal, a ocupação dessas áreas.

E mais. Tanto o atual Código Florestal como o projeto de lei que o altera especificam que, na inclinação acima de 25º e até 45º (quando começa a Área de Preservação Permanente), a única atividade permitida é o manejo florestal. O uso do solo para fins agrícolas nessas áreas relaciona-se apenas com a silvicultura, nada mais.

Topos de morros – No caso dos topos de morros, a matéria também veicula informações erradas.

O jornal não informa que a Lei federal nº 6.766/79 não permite o parcelamento do solo em “terrenos onde as condições geológicas não aconselham a edificação” (art. 3). A legislação florestal também não permite e, tanto o Código Florestal atual quanto o projeto de lei são idênticos nesse aspecto:

A ilustração da Folha sobre esse tema também é simplista e equivocada (ilustrações 3 e 4). A casa idealizada pela Folha não seria permitida nem pelo atual Código, nem pelo projeto de lei em tramitação.

Há duas falhas no desenho: parte da casa está numa encosta com mais de 45º; e, por estar numa formação de tabuleiro, a mesma só poderia ser construída no limite de 100 metros antes da linha de ruptura.


Ilustração 3. A casa da ilustração da Folha é ilegal hoje e permanece ilegal no projeto de lei do Código Florestal


Ilustração 4. Exemplo de formação em tabuleiro com base plana, área protegida pelo Código e pelo projeto de lei

Se, dentro de uma estreita possibilidade de se explorar o topo de morro para fins agrícolas, viesse tal área a ser inserida na zona urbana, e caso se pretendesse lotear e edificar a mesma, isso não seria permitido. Para atividade rural, sim, mas para fins urbanos, há proibição expressa, o que demonstra a impossibilidade de ocupação humana dessa área.

Ainda assim, houvesse qualquer dúvida de que as metragens e salvaguardas não fossem suficientes, tanto o atual Código Florestal quanto o projeto de alteração do mesmo permitem que o Presidente da República, o governador ou o prefeito, por simples decreto, transformem qualquer área em Área de Preservação Permanente. Compare-se:

Lamentavelmente, a matéria se aproveita da tragédia para tentar criar dificuldades no aperfeiçoamento de uma legislação anacrônica, que coloca hoje na ilegalidade quase 100% das propriedades rurais do País, principalmente as pequenas, onde vivem e trabalham milhões de brasileiros.

O tipo de denúncia promovido por certos consultores e organizações não governamentais e acolhidos por jornalistas desavisados transforma-se em macarthismo ambiental, à semelhança da campanha contra os comunistas promovida pelo senador Joseph McCarthy nos anos 50, nos Estados Unidos, cuja ação dispensava qualquer tipo de prova ou verificação.

0 Comments

  1. Humberto de Freitas Tavares disse:

    Alguém cunhou a expressão “urubus verdes” para definir estes aloprados, que por “desleixo intelectual ou má-fé” influenciaram milhares de desavisados.

    Como diz o Marcos Fava Neves hoje na Folha, com direito a repercusão aqui no BeefPoint, o Agronegócio precisa mostrar à sociedade o seu valor

    https://beefpoint.com.br/agronegocio-precisa-mostrar-a-sociedade-o-seu-valor_noticia_69085_15_127_.aspx

    Urgentemente!

  2. JOSE FRANCISCO SOARES ROCHA disse:

    Somos integrantes da pecuaria,vivendo a mesma como produtores e prestadores de serviço,com contato diário com pequenos e grandes produtores.Temos defendido a necessidade de sermos COERENTES.Ambientalistas e produtores tem atitudes extremistas em determinados momentos.
    Acreditamos que ainda temos muita floresta para explorar,sonhar com uma Amazonia inexplorada é utopia,falar que não vamos mais ocupar o cerrado como querem os ambiemtalista,não será possivel.
    Mas a cosciência ecologica responsavel,será uma atitude necessária,por imposição da sociedade em geral,principalmente pelas novas gerações.
    As areas agricultáveis,e são muitas ainda,deverão ser ocupadas,em todo territorio nacional,mas não podemos ocupar nascentes,varzeas,encostas,matas ciliares,areas de proteção. Viajamos muito pelo brasil,e temos visto estas atitudes com frequencia tanto no meio rural com urbano.
    O projeto do Sr Aldo Rebelo é falho nesta questão,abrindo lacunas não bem posicionadas com a nova realidade,o que permitirá que os embates continuem.
    A pecuaria como um todo,deve estar em consonância com as novas politicas mundiais,sob pena de continuarmos sendo tratados como devastadores,e as vezes até foras da lei,prejudicando as nossa negociações no mercado interno e externo.
    Temos visto aqui neste site,muitos reclamarem da não valorização da pecuaria, diria como um velho adágio popular,”não basta a mulher ser honesta,ela tem que se portar como honesta”.

  3. Eduardo Luiz Siqueira Nejaim disse:

    Excelente trabalho!!!!!! parabéns mais uma vez pela cultura aprofundada no assunto, com certeza, dentre todos os deputados o mais capacitado para avaliar as questões ambientais!!!

  4. Fabio Martins Guerra Nunes Dias disse:

    Deputato,
    Excelente resposta. Clara e fundamentada.
    Parabens!

  5. celso de almeida gaudencio disse:

    Fixar em 20% a soma da APP e da ARL é inconcebível, para o Domínio Ecológico Florestas e Campos meridionais (Embrapa, ECO 92) sem considerar o sistema produtivo (sem considera, por exemplo, se o sistema é cultivo de chá ou pastagem ou mesmo culturas anuais com rotação ou sucessão de cultivos, com cobertura vegetal verde do solo e na prática de plantio direto.
    Diminuir a PP de 60 metros para 30 m para cursos de água até 5 metros de largura (15 m na margem esquerda e 15 m na margem direita) não apresenta diminuição da Floresta, pois diminuindo a APP, há necessidade da aumentar ARL para totalizar os 20% fixado para cada propriedade

    Falta de gramados e pastagens na região serrana do Rio

    Áreas de topografia acidentada como a região serrana do Rio necessitam de ampliação constante de áreas com gramados ou pastagens ao redor de construções e habitações. Da mesma forma nos: aterros, cortes, caixa de contenção das valetas das estradas, cabeceiras de pontes e em partes dos barrancos dos cursos de águas.
    Nas florestas a infiltração e armazenamento de água são enormes, quando ocorrem chuvas prolongadas seguidas de tromba de água, ocasionam erosão e deslizamento de terra e de árvores. Os deslizamentos de árvores carreadas pela enxurrada aumentam exponencialmente o poder destruidor a qualquer tipo de construção ou de lavoura. As gramíneas por sua vez acumulam menor quantidade de água e propiciam maior vazão desimpedida das torrentes de água.
    Quanto maior for à ocupação humana maior devera ser a área gramadas em especial nos sopés de serras íngremes, com construção de escoadouros trapezoidais invertidos gramados para facilitar e ramificar a força dos fluxos de águas provenientes das precipitações pluviométricas e também das originárias nas fontes de águas, situadas quase sempre na meia encosta das serras.
    É necessários criar parques fluviais gramados, com a menor presença possível de árvores.
    Celso de Almeida Gaudencio – Adepto a corrente Ecológica Evolucionista

  6. Paulo Cesar Bassan Goncalves disse:

    Caro Deputado e Brasileiro de valor Aldo Rebelo seu posicionamento nesta questão tem sido de uma coerência e coragem poucas vezes vista por aqui. Os mesmos veículos de informação que por estarem desinformados e sem base sustentável, para suas matérias, estão lhe negando o direito essencial da defesa de nossas idéias. Sei que não lhe faltam obstinação e perspicácia para continuar nesta luta que é de todos Brasileiros. Saudações!!.

  7. José Ricardo Skowronek Rezende disse:

    Parabens deputado pela defesa da racionalidade contra a ideologia barata de muitos ambientalistas de plantão em nossos jornais.

  8. Fernando Penteado Cardoso disse:

    Nessa confusão toda, faço uma pergunta:-Ha diferença de deslizamento entre encostas recobertas de mata e enconstas recobertas de pasto? Caso alguém tenha observação a respeito que venha relatar. Ha que lembrar que os engenheiros para proteger obras limpam e impermeabilizam as enconstas para reduzir a infiltração. Vejam por exemplo a proteção da ferrovia da FEPASA entre Mairink e a baixada santista. Abraço.