Por Donário Lopes de Almeida1
Ao longo dos últimos meses temos vivido uma das mais graves crises da pecuária brasileira, onde os preços de venda seguem uma constante curva decrescente e a oferta de animais para o abate parece não diminuir, com escalas cada vez mais longas nos frigoríficos. Este excesso de oferta é resultado de um constante crescimento do rebanho brasileiro, com aumento de produtividade, redução da idade de abate e consequente aumento do desfrute. Temos de encarar a situação, vivemos hoje um cenário de excesso de oferta e vamos ter de trabalhar em conjunto, a cadeia da carne, para que os diversos elos consigam sobreviver e construir uma nova realidade.
O mercado interno vem absorvendo aproximadamente 80% da produção de carne que produzimos, mas apesar de ser a parcela mais significativa, tem uma grande limitação de expansão para o aumento de demanda. O consumo per capita tem estado estagnado, ao redor de 36 kg/ano, e a mudança deste patamar invariavelmente dependerá de uma melhoria no nível de renda de nossa população, o que no cenário atual não parece estar por acontecer tão cedo.
É lógico que estratégias de incentivo ao aumento do consumo são importantes e devem ser implementadas, e neste sentido vale a pena mencionar o trabalho do SIC – Serviço de Informação da Carne. Apesar disso, a oportunidade concreta que vislumbramos é a expansão da exportação, que já vem crescendo regularmente, mas apresenta ainda grande potencial, tanto de aumento nos países onde já atuamos como em novos mercados que poderão ser abertos nos próximos anos.
Ao avaliar os novos mercados com maior potencial rapidamente lembramos dos EUA e alguns países do Oriente, que pagam valores muito superiores aos que estamos acostumados a vender nossa carne. Infelizmente ainda temos limitações sanitárias e parece que ainda vamos levar algum tempo para transpor estas barreiras, ou seja, não podemos contar com esta solução no curto prazo. Desta maneira, nos resta trabalhar mais intensamente os mercados hoje disponíveis, e dentre estes tantos, que já passam de 140, talvez uma das estrelas seja a China, com quem recentemente finalizamos acordo sanitário de exportação.
Nos dias de hoje, com tanta notícia e artigos sobre a China, talvez não fosse necessário discorrer sobre as características e estatísticas deste país, mas vamos lembrar rapidamente alguns fatos e números. Com uma população que passa dos 1,3 bilhão de habitantes, crescimento do PIB superior a 9% ao ano, rápida transferência populacional do campo para as cidades, o país vive um momento de grandes mudanças. Além do aumento da renda per capita, com a afluência de capital, tecnologia e abertura comercial, o povo chinês está vivendo um processo de ocidentalização de seus hábitos de consumo.
Com relação ao tema de nosso interesse, o consumo de carne, atualmente ao redor de 4,4 kg per capita, estas mudanças podem representar uma grande virada de mesa. Apesar disso, são muitos os fatores que influenciam este baixo consumo, e por isso mesmo, a aproximação e o entendimento desta cultura são essenciais para construirmos estratégias e ações exitosas na conquista deste mercado. Neste sentido é meritosa a participação da ABIEC, com alguns de seus associados, e com apoio da APEX na Feira de Alimentos SIAL em Shanguai nesta semana, entre 18 e 20 de maio.
Apesar do recente acordo sanitário firmado entre Brasil e China ainda não ter tido resultados práticos, pois ainda não ocorreram embarques para aquele país, a oportunidade de colocar nossos representantes em contato com os importadores e potenciais clientes é primordial. Até agora tínhamos acesso ao mercado chinês indiretamente através de vendas a Hong Kong, quase sempre passando por intermediários. Essa triangulação sempre dificultou o entendimento e atendimento das demandas dos clientes finais, e nos limitou a atender apenas a parcela menos interessante do mercado, até agora centrada na linha de miúdos e outros itens de menor valor.
Uma vez regularizada a exportação direta à China, e ao que parece deve acontecer em breve, teremos condição de ser mais atuantes e competir de forma mais agressiva neste gigante potencial. Vamos acompanhar os resultados de Shanguai e torcer para que o caminho direto à China seja consolidado em breve, abrindo uma nova via de escoamento de nossa abundante oferta de carne.
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1Donário Lopes de Almeida, Agrônomo pela Universidade Federal do RS, MBA pela Business School São Paulo, ex-presidente da ASBIA – Associação Brasileira de Inseminação Artificial, diretor comercial da Planejar Informática e Certificação