Em muitos países importantes na genética Angus, existe um percentual pequeno de descarte de machos que não se tornam reprodutores. Desta forma, do total de nascimento de machos, um percentual de 85 a 95% dos machos nascidos tornam-se touros. No Brasil, é muito frequente uma situação bem distinta, onde somente 25 a 50% dos machos nascidos tornam-se reprodutores. Por Fernando Furtado Velloso
A raça Angus assumiu posição de liderança no Brasil entre as raças europeias nos últimos 10 ou 15 anos e hoje esta posição é consolidada. A venda de sêmen de 2,3 milhões de doses em 2011 (com previsão para mais de 3 milhões em 2012), o número de reprodutores comercializados, a preferência absoluta nos programas de cruzamento e as diversas marcas de carne de qualidade comprovam em números esta situação.
Esta posição diferenciada e superior no mercado pode nos dar uma falsa sensação de conforto, mas na verdade, nos coloca em uma situação de grande compromisso e responsabilidade como provedores de genética.
A função de um plantel é de altíssima relevância, pois os reprodutores distribuídos em diversos rebanhos irão influenciar a formação e desempenho do gado de nosso país. Não esqueça que metade da genética de todo o seu rebanho vem dos touros! Eles são os verdadeiros provedores de genes e de um indivíduo podemos esperar mais de 100 filhos em sua vida produtiva. Divido as responsabilidades de um plantel em três grandes áreas:
a) Animais eficientes para o produtor – genética de vacas de baixa manutenção e com boa produção de leite, de facilidade de parto, de terneiros com bom ganho de peso, de novilhos com facilidade de apronte (precoces), etc;
b) Animais eficientes para a indústria – genética de carcaças pesadas, de boa conformação, de alta padronização e de boa cobertura de gordura (terminação);
c) Animais que sirvam ao consumidor – somente teremos cumprido com nosso trabalho se o bife que chegar à mesa for macio, suculento e saboroso. Garantir a manutenção e melhoria do produto final é que nos manterá como produtores de gado.
Observe que são muitas características para estarmos atentos e que muitas delas podem ser até correlacionadas negativamente (ex: vacas de baixa manutenção e carcaças pesadas, indivíduos com grande ganho de peso e facilidade de terminação, etc).
De acordo com dados da Associação Nacional de Criadores – Herd Book Collares (ANC), entidade responsável pelo Serviço de Registro Genealógico da raça Angus entre outras, os números são os seguintes desde a abertura do livro de registros (1906 até novembro de 2012):
Fica fácil perceber rapidamente duas situações do cenário da raça no país: 1) o rebanho registrado tem predomínio de animais PC (mais de 62% do rebanho); 2) a seleção dos machos PC que se tornam reprodutores é alta e pode-se comprovar comparando o número de machos e fêmeas registrados no controle. A mesma situação não ocorre na população de animais PO.
Avaliação genética Angus
O rebanho Angus brasileiro passou a ter grandes melhorias em sua seleção com o trabalho iniciado pelo Programa de Melhoramento de Bovinos de Carne (PROMEBO). Atualmente, mais de 350 rebanhos já enviaram dados de campo ao PROMEBO e assim mais de 200 mil produtos foram avaliados. As características avaliadas, índices e demais informações podem ser obtidos diretamente no Sumário de Touros PROMEBO ANGUS ou na internet (www.promebo.com.br).
Os gráficos de Tendências Genéticas nos permitem ver claramente que a seleção através do PROMEBO tem sido efetiva para a população avaliada e que ganhos genéticos estão sendo obtidos nas prinicipais características de interesse.
As características a seguir apresentaram ganho genético: a) ganho de peso do nascimento ao desmame (GND ou DEP Desmame), b) ganho de peso do desmame ao sobreano (GDS ou DEP Final), c) escores visuais para Conformação, Precocidade, Musculatura e Tamanho, d) características de carcaça medidas por ultrassom, Área de Olho de Lombo (AOL) e Espessura de Gordura Subcutânea e, e) Perímetro Escrotal (PE).
Genética nacional
Em 2012 foram apresentados no Sumário de Touros Angus 746 reprodutores e somente 219 são nacionais, ou seja, somente 29,3%. Esta informação já nos leva a concluir o baixo uso de pais nacionais nos plantéis e a grande área de oportunidade para seleção e de mercado.
O mesmo comportamento ocorre no mercado de inseminação, pois de acordo com a Associação Brasileira de Inseminação (ASBIA, 2011), 69,4 % do sêmen de Angus vendido no Brasil é importados 30,6% é nacional. As centrais de inseminação, para compra ou contratação de touros, cobram do produtor de genética brasileiro mais dados técnicos dos reprodutores produzidos (avaliação genética, dados com maior acurácia, rebanhos com processos contínuos e criteriosos de seleção, etc).
Observa-se nos catálogos de sêmen que o tipo de touro contratado pelas centrais mudou muito nos últimos anos. Cada vez é maior a participação de touros selecionados por dados e estes vêm ocupando o espaço antigamente dados aos Campeões de exposições. Esta situação, identificada tanto em raças europeias como em zebuínas no Brasil, é um reforço de que devemos mais e mais nos dedicar as avaliações de desempenho e continuamente qualificar o processo como um todo de seleção de reprodutores.
Apesar do limitado uso dos pais nacionais, temos gratas e positivas informações ao avaliar os pais superiores em nossa avaliação genética. Considerando os TOUROS LÍDERES do sumário 2012, onde estão os 20 melhores touros para diferentes características encontramos o seguinte:
1. 30% dos Touros Líderes para Índice Final são nacionais;
2. 60% dos Touros Líderes para Índice Desmame são nacionais;
3. 35% dos Touros Líderes para Índice Carcaça são nacionais;
4. 75% dos Touros Líderes para Pelame na Desmama são nacionais;
5. 70% dos Touros Líderes para Índice Carrapato são nacionais;
Considero estas informações muito animadoras, pois apesar da baixa participação dos touros brasileiros em nosso sumário (menos de 30%), temos um rankeamento muito positivo destes pais e com destaque para características de adaptação (pelo e carrapato) que são muito relevantes em nosso país e para os usuários de genética Angus no Brasil, seja em base taurina ou zebuína. Este comportamento é somente uma rápida análise dos sumário 2012 e não deve ser extrapolado como uma verdade comprovada tecnicamente, mas é um grande estímulo aos selecionadores brasileiros.
Diferenciais do Angus Brasileiro
Em uma avaliação superficial, pode-se pensar que o Brasil tem pouca expressão na genética Angus mundial, porém temos diversos diferenciais em nossa seleção que resumo adianto.
Desde 1990 a Associação Brasileira de Angus implementou uma norma que qualifica continuamente o seu plantel PC. Somente os touros PC denominados DUPLA MARCA (marca CACA), ou seja, os 40% superiores para Índice Final na Avaliação Genética PROMEBO podem ser usados como pais em rebanhos registrados. Os touros não avaliados ou inferiores a DECA 1-4 recebem registro genealógico como marca simples (marca CA) e são destinados ao uso em rebanhos comerciais. Esta medida estimulou grandemente a adesão dos rebanhos na avaliação genética e conduziu ao uso de pais superiores na totalidade dos rebanhos PC. Este é um diferencial importante das associações da ABA e com certeza distingue os rebanhos nacionais de outras seleções.
Em muitos países importantes na genética Angus, existe um percentual pequeno de descarte de machos que não se tornam reprodutores. Desta forma, do total de nascimento de machos, um percentual de 85 a 95% dos machos nascidos tornam-se touros. Esta situação ocorre porque muitos rebanhos são especializados somente na produção de genética e não estão dedicados a engorda também. Pode-se dizer que este comportamento é o usual nos Estados Unidos e Canadá por exemplo.
No Brasil, é muito frequente uma situação bem distinta, onde somente 25 a 50% dos machos nascidos tornam-se reprodutores. Em parte esta situação ocorre porque já está na cultura e rotina de nossos selecionadores. Outra justificativa é que muitos rebanhos fazem ciclo completo e destinam regularmente animais do rebanho controlado para a engorda. Considero este fato uma vantagem competitiva de nossos projetos de seleção em médio e longo prazos.
Existe em melhoramento animal um fenômeno inegável chamado Interação Genótipo Ambiente, e de forma bastante simplificada pode-se dizer é que o desempenho de animais pode mudar grandemente quando estes são selecionados em um ambiente e usados (ou multiplicados) em outro. Esta é a situação que ocorre quando importamos material genético de outros países. Podemos buscar determinado reprodutor TOP 1% para certa característica e esta genética não ter o mesmo desempenho em nosso país. Esta situação é comprovada por touros que mudam significativamente de posição (ranking) entre o sumário do país de origem e sua posição no sumário brasileiro.
É natural que esta situação ocorra, pois há grandes diferenças nos sistemas de produção entre países e até entre regiões (nível alimentar, temperatura, umidade, presença e nível de infestação de parasitos, etc). Desta forma, para os rebanhos brasileiros a lógica indica que a melhor genética é a selecionada aqui, desde que dentro de critérios técnicos e com técnicas objetivas melhoramento animal.
A combinação de altas temperaturas com umidade leva o Brasil a uma situação distinta de outros produtores de genética Angus. Muitos dos países que importamos genética apresentam altas temperaturas, porém quase nenhum destes tem a situação de calor combinado com umidade, fato que torna muito importante a problemática com ectoparasitas e verminoses. A seleção que fazemos para animais de melhor desempenho indiretamente nos leva a genética de animais que enfrentam ou resistem melhor à condição de parasitismo, pois os que adoecem ou morrem por esta situação não integram os núcleos superiores em genética.
De outra parte, em nossa avaliação genética já estão contempladas DEPs para Pelame (pelo grosso, médio ou fino) e Resistência ao Carrapato. Assim sendo, estamos identificando a genética mais adaptada as nossas condições de criação. O crescente uso de touros Angus em programas de cruzamento com zebuínos torna a tolerância ao calor e a resistência a parasitos ainda mais importante. Este é um exemplo de trabalho que está e será desenvolvido pela nossa seleção, pois o tema não tem a mesma magnitude em outros países.
Considerações e conclusões
A crescente demanda por genética Angus no Brasil nos leva ao positivo desafio de produzir genética eficiente ao nosso país. Não há dúvidas que a via de entregar este produto é através da avaliação genética e do uso de dados técnicos de desempenho como base para nossas tomadas de decisão.
Temos ainda bastante trabalho a ser desenvolvido: aumento do número de rebanhos no PROMEBO, a ampliação do uso da ultrassonografia de carcaça em nosso programa, a inclusão de mais características na avaliação, o uso de marcadores moleculares, etc. Porém, diante da relevância de nosso país na pecuária mundial (que torna-se cada vez maior), da experiência e conhecimento acumulada em nossas universidades e centros de pesquisa, e especialmente, dos esforços de nossos criadores alcançaremos logo posição de destaque na produção de genética Angus.
Med. Vet. Fernando Furtado Velloso (Inspetor Técnico da ABA e Diretor da Assessoria Agropecuária FFVelloso & Dimas Rocha)
2 Comments
Parabéns Dr. Velloso. Muito bom artigo com dados interessantes. Temos muito que fazer pela raça Angus aqui no Brasil. Forte Abraço. Jean Soares.
Parabéns Dr. Velloso.
Muito bom artigo com dados interessantes.
Temos muito que fazer pela raça Angus aqui no Brasil.
Forte Abraço. Jean Soares.