Por Gabriela Aferri1
A dificuldade para se conseguir uma nutrição adequada em ferro, parece transpor as linhas sócio econômicas e demográficas. Sua deficiência é um problema de saúde pública tanto em países desenvolvidos como em desenvolvimento. Ter uma alimentação que promova a ingestão adequada de ferro pode ser difícil por uma série de fatores, principalmente porque são poucos os alimentos ricos em ferro biodisponível.
Uma dieta abundante em ferro é especialmente importante durante a gestação, a lactação, o crescimento e quando ocorre perda de sangue. Embora cause poucas mortes, a deficiência de ferro no organismo contribui para enfraquecer toda saúde e diminuir a performance de milhões de pessoas.
A quantidade de ferro no corpo humano é aproximadamente 4 gramas estando distribuída pelas células e enzimas, como ferro funcional e no fígado, baço e medula óssea onde é armazenado. O ferro funcional constitui cerca de 2/3 deste elemento no organismo e está presente na hemoglobina, mioglobina, e enzimas celulares participando nos mais variados processos biológicos, dos quais o principal é o transporte de oxigênio e gás carbônico feito pela hemoglobina das células sangüíneas vermelhas e pela mioglobina do músculo.
As enzimas que contém ferro, participam das reações químicas do metabolismo aeróbico das células para produzir energia. Se o nível de ferro cai abaixo do normal, a produção de energia é menor causando letargia, fadiga e redução da performance. As enzimas participam também da formação das células do sistema imunológico. Um exemplo de substância imunológica que contém ferro é a lactoferrina encontrada no leite materno que protege os bebes das enterites causadas pela bactéria E. coli.
O ferro é o mineral biologicamente mais versátil. Além das funções descritas anteriormente, ele participa dos seguintes processos bioquímicos: conversão do beta caroteno em vitamina A; síntese de colágeno; formação de purina como ácido nucleico; retirada de lipídeo do sangue; desintoxicação de drogas no fígado; produção de anticorpo e síntese de carnitina, um aminoácido.
A absorção do ferro pelo organismo pode ser afetada por diversos fatores que incluem a necessidade fisiológica, as condições internas ao trato gastro intestinal, a composição da dieta na qual o ferro é consumido e a dupla forma do ferro na dieta: a forma heme, vinda do tecido celular animal e a forma não heme ou inorgânica. O ferro heme é a forma mais absorvida pelo corpo mesmo estando presente em menor quantidade nos alimentos e sua presença na dieta promove a absorção da forma inorgânica. Em contrapartida, o ferro inorgânico tem absorção significativamente menor apesar de estar mais presente na dieta.
Os alimentos fontes de ferro não heme ou inorgânico são frutas, vegetais, grãos, ovos, leite e derivados, e os alimentos que contém ferro heme e não heme são as carnes bovina, suína, de peixes e de aves. A carne bovina tem aproximadamente 50-60% de ferro heme e 40-50% de ferro inorgânico, a carne de carneiro e de frango tem 30-40% de ferro heme e 60-70% de ferro inorgânico.
A absorção de ferro inorgânico é aumentada de 2 a 4 vezes quando se consome carne vermelha, peixe ou frango em alguma refeição. Este efeito promotor, conhecido como o fator carne, ocorre apenas na presença de tecido muscular. As proteínas de origem animal que não são musculares, como o leite, queijo e ovos não tem efeito positivo na absorção de ferro inorgânico. Depois que o ferro é absorvido pelas células da mucosa intestinal não há mais diferença entre eles.
A necessidade fisiológica é um dos principais fatores de regulação do balanço de ferro, já que esse elemento praticamente não é excretado. O ferro é absorvido pelas células da mucosa intestinal e só passa para a corrente sangüínea quando há necessidade, caso contrário é perdido pela descamação da parede intestinal.
Algumas características inerentes ao aparelho gastrointestinal influenciam a absorção do ferro, é o caso do pH do estômago que transforma o ferro ingerido numa forma mais facilmente absorvida. A presença de ácido ascórbico, ácido cítrico e aminoácidos no intestino formam quelatos que promovem a absorção de ferro pela manutenção da sua solubilidade.
Por outro lado, a presença de substâncias inibidoras leva a formação de compostos que não liberam o ferro para absorção. Os principais inibidores da absorção são: os polifenóis presente no café, espinafre e vinho vermelho, o tanino presente no chá, o fitato encontrado em grãos integrais e produtos de soja, o oxalato no espinafre e chocolate, e o EDTA, presente nos alimentos industrializados.
Uma dieta equilibrada é aquela que considera os fatores promotores da absorção, os fatores inibidores da absorção e a biodisponibilidade do ferro, promovendo a ingestão de alimentos numa combinação que forneça uma quantidades de ferro suficiente para atender a exigência diária de cada indivíduo.
A demanda de ferro é aumentada durante períodos de rápido crescimento como a infância, adolescência e gestação. Homens adultos e mulheres depois da menopausa têm menor dificuldade em satisfazerem suas necessidades de ferro. Os bebês alimentados exclusivamente de leite materno recebem quantidade adequada de ferro para suprir suas exigências até triplicarem seus pesos de nascimento. Quando o bebê é desmamado, o ferro altamente disponível no leite materno é substituído pelo ferro pouco biodisponível nas comidas sólidas, o que pode representar um risco para a manutenção do nível deste nutriente nos bebes. Crianças de 0 a 10 anos, necessitam de 6 a 10 miligramas por dia.
Durante a adolescência a necessidade de ferro volta a aumentar para acompanhar o desenvolvimento de massa muscular nos meninos, que necessitam de 15 miligramas diárias, e suprir a perda de sangue pela menstruação nas meninas, que necessitam de 12 miligramas por dia. Quando jovens, as mulheres ingerem poucas calorias e perdem sangue o que pode causar a deficiência de ferro, mesmo em pessoas de alto poder aquisitivo.
A necessidade diária para estas mulheres entre 19 e 50 anos é de 15 miligramas de ferro, enquanto que os homens nesta mesma faixa etária requerem 10 miligramas. Na gestação, a preocupação com a alimentação é ainda maior, pois a necessidade de ferro é elevada (acréscimo de 30 miligramas diárias) em função do aumento no volume de sangue, do desenvolvimento das células da placenta, do cordão umbilical e do feto.
Uma atenção especial deve ser dada aos atletas que são uma categoria exigente em ferro porque tem seus metabolismos alterados com o objetivo de incrementar a produção de energia e oxigenação nos músculos, além de suprir o desgaste que ocorre com a hemólise intravascular causada pelo impacto físico do movimento.
A falta de ferro no organismo causa anemia que é identificada por palidez, fraqueza, fadiga, dispnéia, palpitações e redução na capacidade para trabalhar. A principal causa da deficiência em ferro é a alimentação inadequada, que ocorria antigamente pela dificuldade em se conseguir alimentos ricos em ferro e que atualmente foi substituída pela ditadura das dietas de baixo valor calórico.
O pouco conhecimento sobre os valores nutricionais da carne e sua constante eliminação das refeições é um fator de risco para a manutenção dos níveis de ferro no organismo. O consumo de carne é recomendado como parte de uma dieta saudável por ser fonte de ótima qualidade de ferro, zinco, proteínas e vitaminas do complexo B que são nutrientes essenciais na dieta humana.
A carne bovina é o alimento mais indicado como fonte de ferro pela associação de três fatores. O primeiro é o fato de ser o alimento que contém a maior concentração de ferro heme, a forma biodisponível, que é mais facilmente absorvida. O segundo é o ” fator carne “, que significa o efeito promotor que a presença de tecido muscular causa na absorção da forma inorgânica do ferro. O terceiro é que a carne bovina possui o maior teor de ferro; comparando 85 gramas de carne: no contrafilé bovino há 2,9 mg, no lombo suíno há 1,3 mg e no peito de frango há 0,9 mg. Considerando os prejuízos que a falta de ferro pode ocasionar ao organismo e a forma eficiente com que a carne supre as necessidades deste elemento, fica evidente que uma alimentação equilibrada é aquela que inclui carne vermelha.
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1Gabriela Aferri – Pós graduanda em Qualidade e Produtividade Animal da Faculdade de Zootecnia e Engenharia de Alimentos da USP – Pirassununga – SP.