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A pecuária e o pecuarista

Por Marco Garcia de Souza1

Muito tem se falado do momento que estamos atravessando na pecuária nacional. Acredito que antes de tudo devemos questionar os números apresentados e a sua precisão, pois como sabemos, durante muito tempo o país e principalmente a pecuária ficou completamente desprovida de informações confiáveis, seja pelos abates clandestinos, seja pela total incapacidade logística de se atingir números precisos.

Já escutamos que o rebanho atingiu 180 milhões de cabeça, outros dizem 190 milhões e por último, ouvi até 210 milhões de cabeça, mas o fato é que o rebanho vem num crescimento acentuado à alguns anos.

Não sei se por mania de grandeza ou por especulação imobiliária, mas o fato é que a expansão foi grande e ainda continua. É possível ver disputas entre estados, para saber quem tem o maior rebanho, quem está em terceiro, quem cresce mais, parecendo se esquecer que o mercado aplica como ninguém uma lei irrevogável, chamada Lei da Oferta e da Procura.

Estamos com um rebanho excessivamente grande, com índices produtivos e reprodutivos cada vez melhores, estamos nos tornando cada vez mais eficazes, uns por necessidade e outros por conveniência.

Do outro lado temos o frigorífico, que também vem crescendo, vem se modernizando, vem conseguindo novos mercados (e aí está o mérito deles), e de maneira conjunta os grandes exportadores estão ocupando seu espaço no mundo.

Pra eles talvez seja mais fácil se unirem, para trilharem juntos um caminho. Facilmente podem se reunir (são 5 ou 6 industrias) e tomar decisões em conjunto. Algumas dessas decisões podem ser para expandir o mercado externo, outras podem ser para baixar o preço no mercado interno, mas ambas são para aumentarem seus lucros e garantir a viabilidade do seu negócio.

O pecuarista tem a dificuldade de atingir essa união, seja pela dimensão de sua classe, seja por uma questão cultural, mas o resultado é que não conseguem pensar de maneira uníssona e tomar decisões que venham influenciar o mercado.

Nos Estados Unidos da América, na década de 70, havia em torno de 132 milhões de cabeça, hoje esse número gira em torno de 93 milhões, esse “ajuste” se fez necessário para que a lei da oferta e da procura fosse respeitada. Esse trabalho contou com o apoio do governo, fazendo campanhas e dando incentivos para que os produtores reduzissem seus rebanhos, diminuindo a oferta.

Acredito que isso não ocorrerá no Brasil de maneira tão organizada, principalmente pela ausência completa de política agrícola consistente e de atuação preventiva, estando assim na mão dos produtores essa difícil iniciativa nada fácil, mas que ocorrerá de uma maneira ou de outra.

Essa decisão crítica só não será necessária, se houver um incremento na renda da população brasileira, que refletisse num maior consumo de carne, que gira em torno de 36Kg/habitante/ano (mais um número questionável), ou então um aumento ainda maior (se é que isso é possível) nas exportações, ficando neste caso dependente do (des) controle sanitário, que por sua vez recebe menos recursos por parte do governo federal.

Não quero ser o profeta do apocalipse, mas as previsões não são muito otimistas.
Espero que algo de novo acorra. Gostaria que a CNA estivesse certa, e tudo não passasse de um lobby dos 5 grandes frigoríficos e que através de uma investigação do CADE, tudo fosse revelado e o preço começasse a subir como num passe de mágica, mas até isso pode ser perigoso e ter um resultado inverso.

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1Marco Garcia de Souza é zootecnista e pecuarista em Três Lagoas/MS

0 Comments

  1. João Luiz Mella disse:

    Caro companheiro Marcos, avalizo suas idéias.

    Acredito que a classe produtora precisa, realmente, pensar em um todo. O grande problema não é só crescer a produção, mas sim, achar o consumo para essa produção.

    Sabemos do grande horizonte agrícola que ainda existe no Brasil, a grande expectativa de produtividade da pecuária.

    O nosso problema tende a aumentar (oferta de carne), precisamos urgentemente copiar saídas americanas, ou fazermos um incremento no consumo interno, ou, ainda, um aumento nas exportações.

    O importante é ter a certeza que essas saídas, só serão eficientes se toda a cadeia produtiva estiver engajada, para juntos, acharmos as soluções.

  2. Jose Luiz Couto Pedreira disse:

    Temos uma fazenda de pecuária de corte aqui na Bahia, além de uma empresa em consultoria (Gepecorte) voltada para esta atividade.

    Ao longo do 2o semestre de 2004 e no ano de 2005 temos escrito alguns artigos sobre a pecuária em nosso estado que via de regra não tem se comportado de maneira diferente do resto do país.

    Muito lúcido o seu artigo Dr. Marco.

    Quem realmente manda é o mercado. Que bom seria que fosse apenas um cartel que ditasse o preço da @ do boi neste momento. O enorme descompasso entre oferta e procura não será resolvido apenas com revolta e gritaria contra frigoríficos e varejo.

    E não sou advogado deles sob nenhuma hipotése. Pelo contrário estou do outro lado, como já falei!!

    Temos que aprender a lidar com planejamento estratégico e gerenciar as nossas propriedades interferindo fortemente em gestão dentro da porteira para amenizarmos a perda de rentabilidade que amargamos no momento e quem sabe até quando.

    As iniciativas associativistas serão sempre bem vindas e necessárias.

    Estamos na verdade sendo o elo fraco desta cadeia, quando temos tudo para ser o mais forte.

    Afinal quem detém as 190 milhões de cabeças? Olhe os tais números não tão confiáveis aparecendo!

    Será que vamos ter que retroceder em produtividade para sermos remunerados como merecemos? Seria ridículo!

    Vamos agir profissionalmente, racionalmente e sem emoção.

    José Luiz Pedreira
    Salvador / Ba

  3. Jaime de Carvalho Neto disse:

    Em tempos de substituição das barreiras tarifárias pelas sanitárias, vaca louca, bioterrorismo, onde o protecionismo de mercado é palavra de ordem para a saúde financeira dos países, muitos daqueles que se dizem representantes dos interesses da classe produtora estavam trabalhando arduamente pelo retrocesso, queriam por motivos duvidosos desestruturar o SISBOV, acabar com a identificação individual, acabar com um processo que tem como objetivo auxiliar o desenvolvimento da pecuária nacional.

    O fim do SISBOV acaba com todo um trabalho já construído, com alguns erros, mas sem dúvida, cheio de benefícios e acertos.

    A agropecuária já vem sinalizando há algum tempo para o aumento de produção, para a eficiência de produção para que as propriedades rurais sejam administradas como empresas, hoje um produtor que administra uma fazenda de cria com 1000 matrizes está com seu orçamento apertado, os custos de produção aumentaram de tal forma que produtores menores estão abandonando a atividade. Se diminuírem as exportações aí é que o cenário piora.

    E onde fica a responsabilidade dos líderes que divulgam notícias desencontradas gerando mais descredibilidade ao sistema. Discussões sobre modelos de identificação animal, rastreabilidade por lote de animais, descentralização da BND do MAPA, tudo isso sem embasamento técnico consistente, feito sobre uma ótica política com um discurso para agradar alguns produtores que relutam em absorver a tecnologia e as exigências internacionais.

    O que falta para o SISBOV é divulgação correta e esclarecimento aos produtores sobre mercado externo e o verdadeiro motivo pelo qual foi desenvolvido o SISBOV.

    Até hoje muitos produtores ainda não sabem o que realmente quer dizer rastreabilidade, outros acham que rastrear é só para ter um diferencial no valor da arroba na hora do abate, aderem ao processo e quando vão abater os animais, por motivos da velha lei da oferta e procura, encontram frigoríficos trabalhando com valores semelhantes entre gado rastreado ou não, daí culpam o programa e não o mercado ou sua própria ingerência, ou se é que alguém tem culpa.

    Sob uma ótica ultrapassada baseada em preconceitos administrativos sobre como devem ser administradas as propriedades rurais, sem uma experiência econômica e sobre os interesses dos países importadores quase conseguiram acabar com o nosso programa de rastreabilidade.

    O que deveria acabar é o narcisismo de alguns representantes de classe e que estes trabalhassem com mais seriedade e profissionalismo para que juntos pecuaristas, produtores de insumos, empresas ligados ao agronegócio e frigoríficos, todos desfrutem de uma atividade segura e lucrativa, sem colocar em risco a saúde financeira dos produtores e empresas de todo país.

  4. Fabiano Mendes dos Santos disse:

    Concordo plenamente com o autor, falta ao pecuarista brasileiro união causada muitas vezes por falta de liderança.

    Hoje, no Brasil, há pouquíssimos políticos interessados em beneficiar o setor primário no Brasil.

    Precisamos urgente de líderes políticos interessados em nossa classe, classe esta que está sustentando a economia brasileira.

  5. Alexandre Foroni disse:

    Concordo com o que escreveu.

    Realmente o que tem ocorrido é um aumento da oferta de animais e o aumento da demanda não tem acompanhado no mesmo patamar.

    Mas agora eu pergunto, por que esse consumo não tem acompanhado? Será que o produto não tem qualidade? Será que o produto está caro? O que está ocorrendo?

    No meu ponto de vista, um dos problemas é a falta profissionalismo só setor intermediário da cadeia, que por não criar um diferencial no produto “carne” acaba deixando o mercado ofertado ao invés de ser demandado.

    Prova disso é o que ocorreu e vem ocorrendo com o frango, com o suíno e nas pequenas, mas promissoras, diferenciações que vem aparecendo no mercado da carne bovina, como o Nelore Natural, Montana e outros.

    Abraços

  6. Bruno de Jesus Andrade disse:

    De nada adianta bons índices zootécnicos dentro de uma propriedade se o pecuarista trabalha de forma egoísta. Por mais pejorativo que pareça “a união faz a força”.

    Estamos em um país jovem que ainda tem muito que aprender no que se diz respeito ao profissionalismo. O poder de negociação do pecuarista é muito baixo, pois este não consegue se articular com outros produtores, acredito eu, ser por causa de algum problema cultural que ainda não somos capazes de extrapolar.

    Enfim, o que falta é profissionalismo, estar preparado para entrar no mercado. Não se entra no mercado pensando somente na sua produção, ainda mais quando falamos de pecuária, um setor onde provavelmente toda a produção flui, não acredito que existam pecuaristas que foram prejudicados unicamente porque seu vizinho chegou na frente na hora do abate no frigorífico. Não existe competição na pecuária, portanto devemos nos dar as mãos e acharmos forças para lutarmos juntos.

  7. Carlos Arthur Ortenblad disse:

    Excelente artigo. Informativo, claro, objetivo, e direto ao assunto.

    Dizer coisas “óbvias”, ao contrário do que normalmente se pensa, não é uma platitude, e sim uma virtude.

    Fazendo analogia com famosa frase de Winston Churchill, quando se referia ao estilo dele ao escrever: “Das palavras, as mais simples. Das mais simples, as menores”.

    Assim, o que você me transmitiu, foi: “Das verdades, as mais contundentes. Das mais contundentes, as mais óbvias”.

    Parabéns.

    Forte abraço,

  8. Janete Zerwes disse:

    Caro Marcos,

    Concordo com você, o nó do agro negócio, encontra-se na politização dos nossos produtores, no conhecimento sobre o mercado consumidor, interno e externo.

    No estabelecimento de metas estratégicas conjuntas de produção, que podem ou até deveriam chegar a redução do rebanho nacional, justificada na melhora da eficiência produtiva, relacionada ao custo produção de carne por cabeça, tendo em vista, que nossos custos são calculados por cabeça, com isto, mudaríamos o foco da produtividade máxima /ano por hectare para produtividade máxima/ano por cabeça, enfocando lucratividade máxima para a propriedade.

    Representado recursos a serem utilizados em investimentos para o aumento do rebanho, para capitalização do produtor.

  9. paulo cesar teixeira leonel disse:

    Acho correta a opinião do Marco.

    Apenas tenho dúvida quanto ao número correto do rebanho, pois, na prática, tenho visto uma grande oferta de pastos para aluguel nas regiões de pecuária, coisa que estava escassa, isso mostra uma diminuição de rebanho.

  10. Carlos Alberto de Godoy Bueno disse:

    Difícil imaginar diminuição da produção de carne em mundo carente de alimentos, cuja população aumenta sem parar, mais parecendo que a comercialização necessite de aprimoramento em termos de acesso a nichos de mercados ainda não (ou completamente) explorados.