O que o consumidor entende por qualidade passa pela sua percepção sobre atributos sensoriais, nutricionais, de processo e de conveniência do alimento. Depois de várias crises sanitárias e escândalos, o consumidor alemão, mais do que outros povos europeus, na hora de comprar carne de boi, dá maior importância ao aspecto país de origem.
O ponto de partida desta pesquisa foi a curiosidade de se comparar as diferenças culturais entre o alemão e o brasileiro. Por possuírem valores e tradições diferentes em suas culturas, esses dois povos teriam por conseqüência padrões de consumo distintos, o que por sua vez, refletiria no uso da terra e sua sustentabilidade.
A sustentabilidade do agronegócio brasileiro é muitas vezes questionada na mídia e meio científico internacional por duas razões preponderantes: a subnutrição de quase 10% da população brasileira e os altos índices de desmatamento.
Economicamente o uso da terra brasileira mostra-se inquestionavelmente viável, todavia a variante econômica juntamente com a ecológica e a justiça social formam os três pilares da sustentabilidade. É justamente nestes dois últimos pontos que o Brasil deixa a desejar. E é especialmente para esses aspectos que o mercado consumidor de países do primeiro mundo vem dando maior atenção.
O alemão é um povo marcado por possuir um alto grau de saturação no mercado alimentício. Neste caso, a busca por quantidade de alimento é substituída pela busca por qualidade. O que o consumidor entende por qualidade passa pela sua percepção sobre atributos sensoriais, nutricionais, de processo e de conveniência do alimento. Depois de várias crises sanitárias e escândalos, o consumidor alemão, mais do que outros povos europeus, na hora de comprar carne de boi, dá maior importância ao aspecto país de origem.
Diversos fatores influenciam a percepção de um consumidor sobre um selo de origem, “made in Brazil”. Um deles é imagem que ele tem do Brasil de forma geral, mas também de forma específica, como produtor de carne.
Essa percepção foi levantada em nossa pesquisa e pode ser observada no gráfico abaixo. Como já esperado, o Alemão associa o Brasil principalmente com lazer (praias, sol, Rio), futebol, carnaval, Amazonas e miséria.
No gráfico pode ser visto um panorama da imagem da carne bovina brasileira e da agricultura brasileira na Alemanha. À esquerda do gráfico estão as questões relacionadas à carne bovina e mais à direita à agricultura e sustentabilidade. As afirmativas estão também ordenadas de forma que indo da esquerda para direita vai caindo o percentual de entrevistados que possui uma imagem positiva (área verde) do Brasil, paralelamente vai aumentando o número de entrevistados que possuem uma imagem negativa (área vermelha). No geral a imagem do Brasil é predominantemente positiva em questões que dizem respeito somente à carne, mas já em questões relativas à agricultura e sustentabilidade a imagem brasileira é predominantemente negativa.
A população alemã possui um menor grau de conhecimento sobre a carne bovina brasileira e sobre questões relacionadas à agricultura. Esses dados são ilustrados no gráfico acima. Para uma bateria de 12 afirmativas o entrevistado deveria dar uma nota de 1 a 10 de acordo com o seu grau de concordância com tais afirmativas.
A área branca mostra a parcela de entrevistados que ficou “em cima do muro”, na grande maioria das vezes por falta de conhecimento. Esta parcela está em torno de 40% da população. Já aproximadamente 50% dos entrevistados concordam que a carne bovina brasileira é tão boa quanto a carne produzida na Bavária (região alemã onde foram feitas as entrevistas) e que ela é tão gostosa quanto a argentina.
Para 40% dos entrevistados a agricultura brasileira não é tida como moderna. E 80% discordam que o Brasil seja socialmente justo. A área vermelha, como neste caso, ilustra o percentual de entrevistados que discordaram das afirmativas, ou seja possuem uma imagem mais negativa, e os tons mais claros e mais escuros de verde ou vermelho apontam o grau de concordância e discordância.
Como regra geral os consumidores preferem produtos de seu próprio país ou região. Entretanto há predileção por produtos de outros países se neles houver: trabalhadores com determinadas habilidades ou conhecimentos especiais; ou matérias-primas específicas devido ao clima, solo ou outra condição natural; ou ainda o domínio de tecnologias ou métodos tradicionais (Papadopoulos 1993).
Pesquisas de opinião (Sensus & CNT, TNS Emnid) mostram que os alemães, mais do que outras nações, valorizam bem o Brasil e dão especial importância à região Amazônica e à sua preservação ambiental. Anholt (2003) destaca o potencial ainda inexplorado da marca Brasil. Em recentes pesquisas Drouvot (2005) mostrou que para consumidores franceses o made in Brazil é associado a produtos de primeira necessidade e baratos. Giraldi (2005), em pesquisa com estudantes holandeses, ressalta que existe um efeito negativo do made in Brazil para móveis e sapatos, mas não para produtos agrícolas. Ela não constatou uma relação entre a imagem do Brasil e o comportamento do consumidor frente à carne de boi brasileira.
O levantamento de dados deste trabalho se valeu principalmente dos métodos conjoint de análise, questionário fechado além de métodos associativos. Em um teste, por exemplo, foi apresentada uma figura com uma dona de casa alemã que havia comprado carne de origem brasileira.
A pessoa entrevistada deveria completar os balões, apresentando motivos hipotéticos pela compra da carne brasileira e também qual seria a reação do marido (ver figura abaixo). Tal teste tem a vantagem de dar mais liberdade para o entrevistado responder, sem contudo o expor ou fazê-lo sentir-se constrangido por razões sociais ou éticas. Assim ele se projeta na situação, e acaba dizendo a sua própria opinião.
Algumas reações “negativas”, principalmente relacionadas ao etnocentrismo, foram também levantadas, como por exemplo o questionamento se não há suficiente boi na Bavária, ou se existe um bom controle de gêneros alimentícios no Brasil.
De fato, como afirma Carfantan (2006), o consumidor europeu ainda não tem uma clara idéia que ao lado da carne argentina existiria também uma carne de boi de origem brasileira. Todavia, especialmente para aqueles que já estiveram no Brasil a carne de boi (supostamente o churrasco) é tida como uma especialidade brasileira, juntamente com o café e as frutas tropicais.
As análises fatoriais e de regressão da pesquisa revelaram também que, somente para um segmento do mercado, a imagem geral do Brasil tem efeito positivo sobre a preferência pela carne brasileira. Mas na percepção deste produto um papel importante é exercido por aquilo que o alemão pensa sobre a sustentabilidade e o uso das terras brasileiras.
Isso aponta para uma necessidade de se efetivar o rastreamento e uma certificação de alta credibilidade, paralela a uma maior divulgação da imagem do Brasil (não somente turística) e de seus produtos agrícolas no mercado externo. Com certeza seria também muito bem sucedido no mercado alemão um selo que associe a origem brasileira à produção ecológica.
Bibliografia citada
Anholt. S. (2003): Brand New Justice: The Upside of Global Branding, Burlington.
Carfantan, J. (2006): Jean-Yves Carfantan: desafio de construir a imagem do Brasil no mercado europeu, in: beefpoint.com.br
Drouvot, H. (2005): Le Made in Brésil, Grenoble.
Giraldi, J. De M. E. (2005): A influência da imagem do Brasil na atitude de consumidores estrangeiros com relação a Produtos brasileiros: um estudo com estudantes universitários holandeses, São Paulo.
SENSUS und CNT (2001): Report: World Research – 22 Countries, Brasilia.
TNS Emnid. (2006): World Powers in the 21st Century, Bielefeld.