Associação visa promover bubalinocultura no MS
14 de outubro de 2002
Pecuaristas são ressarcidos por ataque de onças no MS
16 de outubro de 2002

A qualidade da carne bovina – parte 2 – O sistema UN/ECE (United Nations Economic Comission For Europe) de padronização

Introdução

Esse sistema surgiu da necessidade de definir e descrever qualidade e suas exigências, do ponto de vista comercial, tanto da carcaça, como de seus cortes, que movimentam o comércio internacional, assegurando que estejam apropriados para consumo humano. Adicionalmente, várias outras exigências, relacionadas ao padrão dos alimentos e aos controles veterinários, devem estar de acordo a fim de que essas carnes possam ser comercializadas internacionalmente. Esses padrões não são abordados pelo sistema UN/ECE sendo determinados por legislação específica de caráter nacional ou internacional.

UN/ECE é uma das cinco comissões regionais das Nações Unidas tendo sido estabelecida em 1947. Seu objetivo principal é incentivar uma cooperação econômica maior entre seus países membros. Conta com 55 países membros, mais de 70 organizações profissionais internacionais, assim como organizações não governamentais participando de suas atividades. As atividades de padronização de alimentos perecíveis começou em 1949, tendo hoje aproximadamente 100 padrões para frutas e vegetais frescos ou secos, batata semente, ovos e seus derivados, carnes e flores. Os padrões para carne bovina foram desenvolvidos pela AUS-MEAT (Australian Meat and Livestock Industry Body) responsável pela manutenção do sistema.

Os padrões UN/ECE procuram harmonizar os padrões e códigos nacionais com respeito à qualidade do ponto de vista comercial com os seguintes objetivos:

– Facilitar o comércio internacional diminuindo as barreiras técnicas, tornando as negociações mais fáceis e transparentes. No caso de discordâncias, os padrões podem ser utilizados como referência.

– Aumentar a lucratividade dos produtores e incentivar a produção de alimentos de alta qualidade. A padronização permite uma melhor organização da produção, diminuição dos estoques, redução de custos. A padronização indica o que é aceitável no mercado internacional facilitando a produção, separação e embalagem dos produtos de modo adequado.

– Proteger o interesse dos consumidores, garantindo maior qualidade dos produtos e transparência de mercado. Através da apresentação, embalagem e especificações é assegurado ao consumidor informações importantes sobre o produto.

Atualmente, mais de 70% do comércio mundial de alimentos, é baseado em padrões da UN/ECE.

A padronização da carne bovina

Aplicado para carcaças e cortes bovinos próprios para o consumo humano, esse sistema oferece várias opções aos compradores desses produtos, quanto à forma de obtenção, preparo e embalagem de acordo com as boas práticas internacionais de comercialização.

Como premissa básica, todos os produtos devem ser originados de animais abatidos em estabelecimentos que operam regularmente sob a legislação específica da inspeção e segurança dos alimentos.

Exigências gerais

Estas dizem respeito aos vários aspectos relacionados à obtenção do produto envolvendo refrigeração, espessura da gordura de certos cortes, pH e cor do músculo e da gordura, origem e histórico da produção, embalagem, armazenamento e transporte e ainda, informações de comercialização, inspeção e do sistema de codificação da EAN-UCC.

O processamento das carnes

Refrigeração

As carnes podem estar resfriadas ou congeladas e a manutenção da temperatura por toda a cadeia a fim de assegurar uma temperatura interna uniforme do produto deve ser mantida.

Carnes resfriadas: produtos mantidos rigorosamente à temperaturas entre -1,5 e +7oC por todo o tempo seguido do processo pós morte de resfriamento.

Carnes congeladas: produtos mantidos à temperaturas menores que -12oC após congelamento.

Carnes super congeladas: produtos mantidos à temperaturas menores que -18oC após congelamento.

Apresentação da carne

As carcaças ou cortes devem estar:
– Intactas com respeito à apresentação
– Livre de hematomas visíveis e resíduos da serragem dos ossos
– Livre de qualquer material estranho (sujeiras, madeira, metal)
– Livre de odores estranhos
– Livre de manchas de sangue
– Livre de ossos quebrados ou aparentes
– Livre de contusões
– Livre de queima pelo frio

No processo de desossar, cortar e aparar, cuidados devem ser tomados a fim de evitar cortes no músculo, mantendo a integridade e identidade do mesmo. Superfícies irregulares devem ser refiladas rente a superfície muscular. Com exceção daqueles cortes separados pela união natural dos músculos, todos os cortes devem ser feitos de forma que a superfície do corte apresente um angulo reto em relação à posição do couro. O mínimo possível de músculo, osso ou cartilagem oriundos de um corte ou músculo adjacente poderão estar presentes. No caso dos cortes sem osso, todos os ossos, cartilagens e gânglios linfáticos aparentes, devem ser removidos.

Avaliação e limitações na espessura e conteúdo de gordura

Basicamente duas definições são utilizadas na descrição dos limites de gordura:

1 – Espessura máxima de gordura num determinado ponto. Avaliado visualmente naquele ponto do corte onde a espessura de gordura é maior e medindo essa espessura naquele ponto.

2 – Espessura média da gordura. Avaliada visualmente e determinada por várias medidas da espessura de gordura somente nas áreas superficiais onde a gordura é evidente. A espessura média é obtida calculando-se a média dessas avaliações.

Com respeito à quantidade de gordura o comprador pode especificar a espessura máxima de gordura:
– gordura superficial e membrana removidas
– gordura superficial removida
– praticamente desprovida de gordura (75% da superfície do músculo exposta)
– um máximo de espessura de gordura em milímetros (ex. 3, 6, 13 ou 25 mm)
– quantidade química de gordura (usado mais comumente para aparas)

A marmorização

Marmorização ou gordura intramuscular é um dos critérios utilizados comumente na determinação da qualidade e dois sistemas são recomendados no que diz respeito à esse padrão:
– o padrão USDA
– o padrão AUS-MEAT

O sistema USDA é baseado numa escala fotográfica, com vários graus de marmorização (6 graus) ou seja: leve, pequeno, modesto, moderado, levemente abundante e moderadamente abundante.
O sistema da AUS-MEAT é baseado num sistema de chips com 7 níveis variando de 0 a 6.

A cor e o pH da carne bovina

A cor da carne e da gordura é uma característica específica de cada espécie. A carne bovina normal apresenta uma cor vermelha. Carne com pH final acima de 6.0 é considerada escura, firme e dura (DFD). O pH final é medido no músculo Longissimus dorsi segundo a ISO 2917:1974 “Meat and meat products“. Qualquer outra condição de pH deve ser definida em contrato. A cor da carne deve ser avaliada organolepticamente em um corte transversal usando uma escala apropriada.

A origem e o histórico da produção

Embora opcional, o comprador poderá exigir do vendedor, provas documentais desses procedimentos no que diz respeito a:

categoria animal
– macho inteiro (evidências de características sexuais maiores do que 24 meses)
– macho inteiro jovem (menos que 24 meses)
– novilho (castrado jovem)
– novilha (fêmea jovem, sem parir)
– novilho ou novilha
– vaca jovem (fêmea adulta com < 5 anos) - vaca adulta (fêmea adulta com > 5 anos)
– bovino jovem (6 a 12 meses)

sistema de produção e alimentação
– sistema intensivo
– sistema extensivo
– sistema orgânico
– sistema de controle específico (ex. utilização de promotores de crescimento)
– outros sistemas

sistema de abate
– tradicional
– kosher
– halal
– outros

processamento pós abate
– estimulação elétrica
– método de suspensão da carcaça
– tipo de resfriamento da carcaça
– processo de maturação
– outros

A verificação desses procedimentos exigem a utilização de sistemas de rastreabilidade em funcionamento.

A embalagem, o armazenamento e o transporte

A embalagem primária ou pré embalagem devem ser material aprovado para uso em alimentos. A embalagem secundária é aquela que recobre os produtos já embalados. Durante armazenamento e transporte as carnes deverão estar embaladas segundo os seguintes requisitos:

A – Carcaças e quartos
– resfriada com ou sem embalagem afim de proteger o produto

B – Cortes
– congelada ou super congelada e embalada
B1 – resfriados
– embalado individualmente (I.W.)
– embalado a granel (plástico ou papel encerrado)
– embalado à vácuo (VP)
– embalado em atmosfera modificada (MAP)
– outro tipo

B2 – Congelado/Super congelado
– embalado individualmente (IW)
– embalado a granel (plástico ou papel encerrado)
– embalado à vácuo (VP)
– outro tipo

As condições de armazenamento antes do embarque e o tipo de equipamento para transporte devem ser apropriados afim de manterem as condições físicas e térmicas de acordo com as exigências do país importador.
Rotulagem e informações a serem afixadas na embalagem primária

Várias outras informações de produção, processamento, e fatores associados à qualidade podem ser necessários na rotulagem ou documentação pertinente tais como:
– pH e cor do músculo e da gordura
– sistemas de produção e processamento
– classificação / tipificação
– procedimentos de abate
– características do gado, produção e sistemas de alimentação

Códigos utilizados na especificação da carne bovina

1 Espécie
1 = bovino

2 Código de 4 dígitos do corte específico

3 Categoria
0 = sem especificação
1 = macho inteiro
2 = macho inteiro jovem
3 = novilho
4 = novilha
5 = novilho ou novilha
6 = vaca jovem
7 = vaca velha
8 = bovino jovem

4 Sistema de alimentação
0 = sem especificação
1 = intensivo
2 = extensivo
3 = orgânico
4 = específico
5 = outro

5 Certificação
0 = sem especificação
1 = tipificação ou classificação
2 = certificação por terceiros
3 = identificação animal especificada
4 = tipificação e classificação e certificação por terceiros
5 = tipificação e classificação e identificação animal
6 = certificação por terceiros e identificação animal
7 = tipificação ou classificação, por terceiros e identificação animal

6 Sistema de abate
0 = sem especificação
1 = tradicional
2 = kosher
3 = halal
4 = outra

7 Processamento pós abate
0 = sem especificação
1 = especificado

8 Nível de espessura de gordura externa
0 = sem especificação
1 = gordura superficial e membrana removidas
2 = gordura superficial removida
3 = praticamente livre (75% músculo / superfície interna removida)
4 = máximo 3 mm de espessura de gordura
5 = máximo 6 mm de espessura de gordura
6 = máximo 13 mm de espessura de gordura
7 = máximo 25 mm de espessura de gordura

9 Marmorização
0 = sem especificação
1 = AUS-MEAT 0 chip
2 = AUS-MEAT 1 chip
3 = AUS-MEAT 2 chip
4 = AUS-MEAT 3 chip
5 = AUS-MEAT 4 chip
6 = AUS-MEAT 5 chip
7 = AUS-MEAT 6 chip
8 = sistema USDA
9 = outro sistema especificado

Implicações

Desse sistema de padronização, proposto pelas Nações Unidas, pode-se inferir que todos os fatores descritos a seguir; categoria animal (depende de idade), sistema de produção e alimentação, sistema de abate, tipo de processamento pós abate, quantidade de gordura externa e marmorização, interferem na qualidade do produto carne bovina, tanto no que diz respeito à quantidade quanto à palatabilidade. Obviamente, em diferentes países e culturas, a importância relativa de cada um dos fatores pode variar. Ao programarem seus negócios todos os envolvidos no sistema de produção devem ter em mente, claramente, quem é o seu consumidor alvo, e conhecer o que esse consumidor aprecia.

Bibliografia

HEDRICK, H.B. et al. 1994. PRINCIPLES OF MEAT SCIENCE. 354 P. 3rd EDITION.

LUCHIARI FILHO, A. 2000. PECUÁRIA DA CARNE BOVINA. 134 P. 1a EDIÇÃO.

UNITED NATIONS, UN/ECE GENERAL REQUIREMENTS, STANDARDS FOR MEAT CARCASES AND CUTS. 1st edition, 2001. Sections 1/2/3.

Os comentários estão encerrados.