A Marfrig Global Foods, segunda maior indústria de carne bovina do mundo, se descolou do pavor que tomou conta dos investidores desde que a pandemia de covid-19 se tornou o assunto dominante. Entre os raros papéis do Ibovespa que subiram em 2020, os da empresa de carne tiveram a maior valorização.
Desde o início deste ano, as ações da Marfrig subiram 25,6% na bolsa – o Ibovespa caiu 28% -, o que fez a empresa ganhar R$ 1,8 bilhão em valor de mercado. A companhia controlada por Marcos Molina vale R$ 8,9 bilhões atualmente. Quando se considera o início do lockdown em Wuhan, em 23 de janeiro, o valor de mercado da Marfrig aumentou R$ 291,6 milhões na B3.
Ao longo da crise, é verdade que as ações também sofreram – em 18 de março, a empresa fechou o pregão avaliada em R$ 4,6 bilhões -, mas a recuperação foi rápida, também porque a indústria de alimentos é apontada como mais resistente à pandemia. As ações de JBS e Minerva, concorrentes da Marfrig, também tiveram desempenho melhor que o Ibovespa, mas seus papéis ainda acumulam queda no ano – de 4,45% no caso da JBS e de 4,75% no da Minerva.
Em entrevista concedida ontem ao Valor, o CEO da Marfrig, Miguel Gularte, disse que o amplo acesso da empresa à China é um dos grandes responsáveis pela resiliência.
“Se estamos vendo que o mercado chinês vai liderar as exportações e praticar os melhores preços e margens, evidentemente temos um diferencial importante”, disse o executivo, ressaltando que a Marfrig é a companhia da América do Sul com mais frigoríficos habilitados a exportar para o país asiático.
Ao todo, 13 abatedouros do grupo estão aptos a vender aos chineses – sete no Brasil, quatro do Uruguai e dois da Argentina. No quarto trimestre de 2019, a China já havia sido bastante relevante para a companhia, respondendo por 14% da receita – à frente do Brasil e só atrás dos EUA, que representaram 60%.
Gularte também destacou que a Marfrig conseguiu superar o desempenho da indústria brasileira nas exportações de carne bovina. Nos primeiros três meses do ano, as exportações de carne bovina da Marfrig a partir do Brasil aumentaram 25%. Os embarques dos frigoríficos brasileiros como um todo cresceram bem menos. Conforme dados da Secretaria de Comércio Exterior (Secex) compilados pelo Ministério da Agricultura, as exportações de carne bovina in natura nesse período aumentaram 5,1% na comparação com o primeiro trimestre do ano passado e alcançaram 336,4 mil toneladas.
Na avaliação do CEO da Marfrig, a companhia conseguiu se posicionar bem no mercado chinês, sobretudo nos momentos de maior estresse. No primeiro bimestre, as vendas para o país asiático foram fracas e muitas indústrias amargaram forte queda e encararam agressivos pedidos de desconto por parte dos importadores do país asiático. Em fevereiro, citou o executivo, a Marfrig foi responsável por cerca de 30% das exportações brasileiras de carne bovina à China – essa fatia costuma ser da ordem de 17%.
Além de ter sofrido menos durante o período inicial, quando os importadores chineses estavam retraídos, a Marfrig contava com uma carteira de encomendas do país asiático alongada, o que deu fôlego para esperar a melhora dos preços da carne bovina paga pela China. “Não agarrei a primeira oferta de US$ 4 mil pelo dianteiro bovino”, disse, argumentando que é normal que as primeiras ofertas dos importadores sejam a preços piores. Com o tempo, o movimento especulativo passa e os preços convergiram para níveis maiores. Foi aí que a Marfrig fez novas vendas ao país asiático. Agora, afirmou Gularte, a empresa conta com uma carteira com vendas garantidas ao mercado chinês até os primeiros dez dias de junho.
Nesse processo, a Marfrig também ampliou a fatia do que é exportado. Com isso, a companhia se beneficia do dólar apreciado, o que engorda as margens de lucro. No Brasil, as exportações da empresa passaram a representar 70% da produção, ante uma fatia anterior de 60%. Na operação argentina, mais de 87% exportada – para atender os clientes no mercado interno argentino, a Marfrig está comprando carne de outros frigoríficos do país vizinho.
No mercado brasileiro, as vendas de hambúrguer também surpreenderam, o que ajuda a compensar a fraqueza da vendas de cortes nobres. Como o produto é mais barato e fácil de preparar, as vendas aumentaram, mesmo com a piora das vendas nos restaurantes. Em maio, a Marfrig baterá o recorde de produção de hambúrguer na fábrica de Várzea Grande (MT), disse Gularte. A empresa vende hambúrguer para grandes redes como McDonald’s, fornece para a BRF e estreou recentemente no atacado e varejo com a marca Montana.
Fonte: Valor Econômico.