Análise semanal – 21/06/2006
21 de junho de 2006
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23 de junho de 2006

Alberto Pessina: o diferencial está na gestão estratégica


Alberto O´Farrill Vannini Pessina é diretor executivo da Aliança Pecuarista e diretor executivo da Agropecuária Pessina Ltda. Formado na Esalq/USP em 1995 como engenheiro agrônomo, trabalha na Agropecuária Pessina Ltda, confinamento de 6.000 cabeças, desde o início do projeto.

Participa do planejamento e implantação de todas as atividades da empresa e opera no mercado futuro do boi há mais de oito anos, estruturando as operações de hedge na empresa. Em 2002 fez MBA em gestão empresarial na Fundação Dom Cabral em Belo Horizonte/MG, onde realizou seus trabalhos finais voltados para análise estratégica de mercado.

Alberto concedeu essa entrevista ao BeefPoint, onde fala sobre gestão estratégica do negócio e da cadeia produtiva, formas de organização da classe produtora e aspectos de comercialização no mercado do boi gordo.

BeefPoint: Você poderia nos falar um pouco mais do projeto Aliança Pecuarista?

Alberto Pessina: A Aliança Pecuarista surgiu em 2004, quando em conjunto como engenheiro agrônomo Marcus Petrosino, vislumbramos a necessidade de organizar o elo mais fraco da cadeia de produção de carne, na busca de melhores resultados para o setor. A empresa tem por objetivo auxiliar o produtor através de ferramentas modernas de gestão e garantir uma melhor rentabilidade no seu negócio.

Um dos serviços prestados pela empresa é a orientação estratégica do mercado futuro como ferramenta de gestão. Para isso, auxiliamos o produtor na formatação da estratégia de hedge, através de relatórios setoriais e macroeconômicos. Orientamos também, quanto à formatação dos custos e a rentabilidade do hedge. O pecuarista mantém contato direto com os analistas que fazem a orientação e as operações junto a corretora, auxiliando também na gestão dos contratos. Todo o serviço está incluído na corretagem junto a corretora, ou seja, não há um custo adicional.

Outro serviço oferecido ao produtor é a organização de “Pools de Compras” de alimentos para confinamento e outros insumos. Neste serviço visamos organizar os produtores de forma estratégica para que juntem as suas necessidades e realizem negociações com maior volume e assim com maior poder de barganha.

BeefPoint: Nos últimos anos, qual o ganho médio por @ com o hedge na BM&F, ao se comparar o preço de venda no físico, com o negociado na bolsa, no confinamento de vocês?

Alberto Pessina: No nosso confinamento temos conseguido um ganho médio de R$ 2,50/@ nos últimos três anos. Sendo que realizamos hedge de apenas 30% a 50% dos animais confinados nestes anos.

O mercado futuro deve ser usado como uma ferramenta de gestão, ou seja, em momentos onde há uma percepção de maior risco de queda de preço, as posições devem ser aumentadas. Em momento onde se percebe uma possibilidade de alta no mercado, as posições devem ser reduzidas. Ou seja, é uma ferramenta para se garantir rentabilidade e segurança dos negócios. Nem sempre ela possibilita ganhos, mas sempre deve gerar rentabilidade. Por isso nossa filosofia é auxiliar o produtor a utilizar a ferramenta de modo estratégico.

A pior condição para qualquer negócio é ter que vender o produto a preços abaixo do custo de produção ou com rentabilidades menores que a renda fixa. E nos últimos três anos, devido ao ciclo de baixa da pecuária e a valorização do real, é exatamente o que temos visto acontecer na pecuária. Porém, aqueles que utilizaram a ferramenta de modo estratégico, fizeram excelentes negócios.

BeefPoint: Na sua opinião, para um confinador, qual a melhor opção: venda de contratos na BM&F, venda de opções ou venda de boi a termo para um frigorífico?

Alberto Pessina: Acredito que as três opções são interessantes quando o produtor as realiza com rentabilidade, para isso ele tem que conhecer bem seus custos. Porém cada uma tem suas peculiaridades. Vamos analisar cada uma delas:

Contrato a Termo

Vantagem: permite ao produtor travar o seu preço de venda, utilizando-se menos do seu capital de giro. Ou seja, ele faz a proteção do seu preço de venda e não precisa reservar um capital para margem de garantia e ajustes diários exigidos nos contratos futuros.

Desvantagem: em um eventual momento de alta do mercado, ele não tem como liberar suas posições e, caso não tenha feito hedge de seus insumos, a sua rentabilidade pode ser reduzida. Exemplo: Uma desvalorização do real poderia gerar um aumento dos insumos de confinamento e o preço de venda já estaria travado com o frigorífico. Outra desvantagem é que você só poderá vender para um determinado frigorífico. Caso este venha a ter algum problema, o contrato poderá não ser cumprido.

Outro ponto que deve ser observado, é que o produtor passa a garantir a escala futura do frigorífico, o que pode dar mais força ao mesmo no momento da compra de animais no mercado “spot”. Ou seja, os frigoríficos que garantiram suas escalas através de contratos a termo, terão mais poder de negociação no momento que foram fechados os contratos.

Contrato futuro da BMF

Vantagem: permite ao produtor maior flexibilidade nas suas posições. Ou seja, você pode aumentar ou reduzir a sua posição conforme a análise de mercado. Exemplo: a desvalorização do real poderia aumentar o custo dos seus insumos, mas também aumentaria o valor de venda do boi. O pecuarista neste caso poderia reduzir suas posições e aproveitar à alta do boi. Além disso, poderá vender no frigorífico que desejar.

Desvantagem: necessidade de capital de giro para cobrir eventuais ajustes e margens de garantia.

Contrato de Opção

Vantagem: é um contrato que permite utilizar menos capital de giro e aproveitar as eventuais reversões de mercado.

Desvantagem: você é obrigado a pagar um prêmio para garantir a opção comprada e este não é recuperado. É como se comprasse um seguro de preço. A outra desvantagem é a baixa liquidez deste mercado. Com o aumento do volume de negócios no mercado futuro, a tendência é ocorrer também um aumento na liqüidez dos contratos de opção.

BeefPoint: Como é o controle de custos no confinamento e como adequar? Quais têm sido os avanços nessa área?

Alberto Pessina: Considero hoje, que a gestão de custos não é mais um diferencial e sim uma obrigação. O confinamento é uma ferramenta cara no sistema de produção e como ele tem uma participação alta nos custos gerais da empresa, deve ser acompanhado por um bom sistema de gestão.

O bom sistema de gestão, não é aquele que apenas gera a informação do custo da arroba, mas aquele que permite gerar também informações de produtividade e eficiência. O produtor não deve se apegar apenas à informação financeira, pois esta será o resultado do seu sistema de gestão. O produtor deve ter indicadores de mercado para saber se o seu produto está adequado. Deve ter informações de eficiência e produtividade dos seus ativos, para maximizar a utilização destes. Deve ter um programa de aprendizado para os funcionários, ensinando-os a ser mais eficientes em suas tarefa.

A tecnologia nesta área não pára de crescer. Observamos o aparecimento de novos produtos e máquinas a todo o momento, porém nada disso adianta se você não estiver maximizando o potencial dos seus ativos. Ou seja, de nada adianta ter um misturador com potencial de alimentar 20.000 cabeças quando o seu projeto é para 2.000 cabeças.

Acredito que o diferencial está na análise estratégica do mercado e saber aproveitar as oportunidades que nela aparecem. Só assim poderemos obter sucesso em nossa atividade. Cada vez mais estamos inseridos em um mundo globalizado e a competição não é mais local e sim global. Portanto, temos que ser melhores que o mundo, não apenas como produtores, mas como cadeia de produção.

BeefPoint: Vocês estão criando uma central de compra de insumos? Quais as principais dificuldades e problemas já enfrentados? Como contornar a possível “fuga” de parceiros desse tipo de organização?

Alberto Pessina: Não é bem uma central de compras, consideramos mais um Pool de Compras. A diferença é que não cotamos qualquer produto. Reunimos um grupo de produtores que têm interesse em comprar alguns produtos em comum. Procuramos trabalhar com produtos que têm peso nos custos e são commodities. Levantamos os volumes e organizamos os produtores. Quando formamos um volume grande procuramos fornecedores interessados e analisamos quais vantagens podemos conseguir.

A nossa idéia é trabalhar estrategicamente. Os produtores precisam perceber que eles estão inseridos em uma cadeia e que dentro desta, é o elo mais fraco. Se observarmos a cadeia, percebemos que as cinco maiores redes de supermercado possuem algo próximo a 35% do mercado. Os nove maiores frigoríficos detêm 85% do faturamento nas exportações, sendo que os dois maiores ficam com 45% deste. Do outro lado, também podemos observar concentração de alguns elos, como farelos (algodão e soja), adubos e algumas multinacionais de produtos veterinários e defensivos.

No lado do produtor, segundo levantamento do IBGE 1996, somos 3,2 milhões de produtores. Observa-se claramente a diferença de concentração. E como sabemos os elos mais organizados têm maior poder de barganha que os mais pulverizados e desorganizados. Por esse motivo o produtor vem arcando com os custos da cadeia e da perda de competitividade com a desvalorização da moeda.

A nossa estratégia está em reunir produtores que perceberam isso e que estão buscando se organizar. O maior problema é aquele que não percebeu isso e acaba usando o Pool apenas para cotar preços e depois tentar conseguir algo melhor sozinho. Quando conseguem algum beneficio sozinho, não percebem que este é muito pequeno em relação ao benefício que teria em mostrar a união e organização para os outros elos. Como afirmamos no início, o nosso objetivo estratégico está em conseguir criar vantagem competitiva para o produtor e melhorar a sua rentabilidade.

BeefPoint: No Pool de Compras, o foco é diminuir preço de compra, ou se busca maior oferta de serviços agregados a venda de produtos? Há empresas fornecedoras de insumo interessadas em desenvolver um trabalho em conjunto?

Alberto Pessina: Quando se trata de commodities, o preço com certeza será um ponto relevante. Porém, não podemos descartar outros pontos como logística, condições de pagamento e algum atendimento personalizado. Quando encontramos algum parceiro que pode fornecer um pacote mais completo, com certeza isto será considerado.

BeefPoint: Há interesse em acordo com outras associações? O que vêem como possibilidade de trabalho?

Alberto Pessina: Quando se fala em Pool de Compras todos têm o mesmo interesse. E quanto maior o volume maior o poder de barganha. Podemos observar redes de supermercado comprando insumos em conjunto. Frigoríficos que se comunicam para manter os preços ajustados e não desalinharem perante os produtores. Multinacionais se unindo para comprar commodities em comum. Portanto, a união é sempre bem vinda desde que os objetivos sejam os mesmos.

Outro exemplo interessante são as redes de farmácias, onde os pequenos se uniram em “Pools de Compras” e ficaram mais competitivos em relação aos grandes grupos farmacêuticos.

Acabamos de realizar um trabalho em conjunto com a Assocon (Associação dos Confinadores), onde unimos o nosso grupo com o deles e conseguimos triplicar os volumes. Foi bom para todos, pois efetivamos um excelente preço para todos os pecuaristas envolvidos.

O segundo movimento que estamos realizando em conjunto é a união de diferentes grupos ou associações, com o mesmo objetivo de aumentar a base de negociação.

BeefPoint: Quem pode participar dessa associação? Há restrição de local da fazenda ou tamanho mínimo?

Alberto Pessina: Hoje Pool de Compras está mais focado em confinamento, porém também pretendemos organizar alguma coisa com fertilizantes. O mercado futuro é aberto a todos inclusive pessoas que desejem apenas fazer investimentos.

BeefPoint: Qual a sua opinião sobre a atividade de confinamentos esse ano, em relação a 2005?

Alberto Pessina: Acredito que 2006 será parecido com 2005, pois estamos percebendo que os preços indicados em alguns vencimentos do mercado futuro estão desinteressantes. Com isso, os confinamentos passam a não ter interesse em entregar animais nestas datas. Caso isso se confirme, deverá ocorrer uma menor oferta em um dos ciclos de confinamento.

Os sistemas de boitel e parceria introduziram aos pecuaristas uma possibilidade de alta flexibilidade. Quando os vencimentos futuros estão interessantes, a procura por esses sistemas aumenta bastante. Porém, o pecuarista ainda não aprendeu a fazer o hedge, e no momento da venda, a oferta passa a ser maior que a esperada e os preços caem.

BeefPoint: Qual sua visão de futuro da cadeia da carne?

Alberto Pessina: O Brasil é extremamente competitivo na carne bovina, o que falta é fazer a lição de casa. Se observarmos o sistema australiano, percebemos que eles organizaram uma única associação que se preocupa com o desenvolvimento da cadeia de carne bovina. Esta associação tem por objetivo organizar a cadeia de forma que ela seja competitiva globalmente. Ou seja, tudo que afeta a competitividade, eles estão procurando melhorar (tributação, logística, sanidade, imagem etc).

Os frigoríficos já estão fazendo um trabalho interessante através da Abiec. Estão trabalhando o marketing da carne brasileira. Porém fica difícil se trabalhar a imagem quando ocorrem problemas na estrutura da cadeia, por exemplo, a aftosa. Aí entra-se o conceito da gestão da cadeia como um todo.

No Brasil, ainda falta este tipo de pensamento dentro das associações dos pecuaristas. Podemos ter várias associações com interesses diferentes, porém todas devem apoiar a uma só que lute para melhorar a competitividade global do Brasil. Aí entram assuntos que afetam toda a cadeia, como: tributação, logística, sanidade, oligopólios, imagem etc. Nesta associação, devem existir participantes de todos os elos. Afinal, estamos brigando pela competitividade global.

Quando conseguirmos montar este tipo de trabalho, venderemos carne para o mundo todo. Não apenas para países que compram carne barata, mas sim para os maiores e melhores compradores, como EUA, Japão, México e Canadá. Neste momento, dificilmente algum país será tão competitivo quanto o nosso.

0 Comments

  1. Diego Baroni Guterres disse:

    Parabéns!!!!

    Assunto muito interessante, posicionamento realista: o caminho é por aí!

  2. Hussein Gemha Bianco disse:

    Achei fantástica a entrevista do Pessina, ele se posiciona como estrategista da cadeia da carne o tempo todo, pondera sobre diferentes temas com racionalidade e transparência, é disso que a pecuária precisa.

    Gostaria de ter parceiros como ele na minha região (São Miguel do Araguaia/GO), e quem sabe extender essas parcerias por todo o Brasil. O pecuarista precisa desinflar o ego e virar empresário, como fizeram os donos de Frigorífico.

    Parabéns.

  3. Graciele Possan disse:

    Muito interessante o artigo de Alberto Pessina. Muitos produtores estão sem opção na comercialização. É importante que esse projeto cresça e fortifique.

  4. Nelson de Souza Paiva disse:

    Artigo e/ou entrevista de grande importância tanto o aspecto de pool de compras como o da estratégia de comercialização via mercado futuro. Gostaria de saber do entrevistado Alberto Pessina qual é o problema da falta de liqüidez do contrato de opção?

    Como utilizar os serviços de Alberto Pessina na estratégia do momento adequado para fazer o hedge? Como participar com sua assessoria nesse sentido?

    E qual a opinião dele para este ano de 2007 comparado com o ano anterior de 2006? Quais são as perspectivas?

    Minhas congratulações ao BeefPoint pela entrevista o que acho que deve ser repetida anualmente principalmente agora que necessitamos de informações para tomada de decisão de confinamento face a previsão de insumos mais caros comparados com o ano anterior.

    Nelson de Souza Paiva – produção de gado de corte – confinamento
    Porangatu/GO