Nossos “amazonistas de ar condicionado” voltam aos jornais com afirmativas enganosas, uma verdadeira mistificação do público menos avisado.
Um conceituado periódico de S.Paulo publicou recentemente artigo sob o título de “O Governo Sabe Quem Desmata” (OESP, 13.03, pág.A11), inserindo foto espacial de uma abertura de 6.200 ha, no município de Altamira/ PA, ao lado de outra imagem do mesmo local, obtida tempos atrás, antes da abertura.
O detalhe de pasto retangulares, cuja cor avermelhada indica vegetação de baixo porte, como gramíneas, mostra tratar-se de uma fazenda consolidada, de mais de 2 anos. Uma foto de satélite logo após a queima daria uma cor cinza de vários matizes, jamais rosada.
Em nenhuma hipótese uma área desse porte poderia ser aberta em “pouco mais de um mês” como reza demagogicamente a notícia. Entre a roçada da vegetação fina (chamada broca e destinada a formar facho para a queima), a derrubada, o período para secar e a queimada no final da estiagem, gastam-se geralmente cerca de 8 meses.
As aberturas de floresta alta, geralmente autorizadas dentro do limite legal de 20%, representam um investimento substancial. Custa muito dinheiro, no mínimo R$ 200/ ha, remover as copas arbóreas e limpar o terreno, a fim de deixar entrar luz para inicialmente produzir carne vermelha e mais tarde seja lá o que for. No início, geralmente semea-se capim para formar pasto que convive bem com troncos e tocos remanescentes da derrubada, pois são muito caros de arrancar e amontoar.
As lavouras “no toco”, igualmente viáveis, são bastante raras hoje em dia pelo tipo de mão de obra envolvida para semear com matraca, para depois fazer a colheita manual. Ainda são praticadas por “posseiros”, que fazem novas derrubadas a cada dois anos quando o terreno cultivado se torna praguejado de invasoras, com redução da área que a família pode plantar, tratar e colher. Segundo o ministro Roberto Rodrigues, em recente depoimento no Senado Federal, existem 500.000 famílias na Amazônia vivendo neste sistema tradicional de “derrubar, queimar, plantar duas safras e deixar virar capoeira”, sempre escolhendo a mata mais alta onde a terra é mais fértil e dá menos rebrota (juquira), como já faziam os índios com sua mandioca (P.João Daniel: “Tesouro Descoberto no Máximo Rio Amazonas”, 1776 1.200 pág. Editora Contraponto, 1985).
Vamos questionar se vale a pena produzir carne vermelha, e mais tarde cereais, nas terras altas, não montanhosas, não pedregosas e não alagadas da Amazônia, com o melhor clima do mundo para agricultura tropical, em lugar de manter a mata que nada não dá nada após a retirada da madeira de serraria. É uma opção de renúncia à produção de riqueza, a exemplo do limite de 20%, que vale analisar e discutir. Mas dizer que formar pastagens, criar gado ou produzir cereais significa devastação é um absurdo. Que dizer então dos milhares de pequenos sítios onde se desmata anualmente a roça que a família pode tocar, para abandoná-la pouco depois?
Quando a matéria vier a ser tratada por amazonistas de pé no chão, que entraram na mata, arriscaram-se a uma malária e conviveram com posseiros, madeireiros e pecuaristas, então será possível uma discussão construtiva, para o bem de nosso país.
Não será a lengalenga das ONGs estrangeiras e de seus seguidores nativos, que trará argumentos válidos para esse fórum. As palavras sempre repetidas, tais como tragédia, desastre, destruição, devastação, etc. não passam de chavões sensacionalistas, do agrado dos amazonistas de gabinete e ar condicionado, bem como da imprensa ávida de impressionar seus leitores com fantasias sobre nosso deserto verde, pouco se importando com a renúncia de produzir riqueza.
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Para nós que somos amazonidas, de verdade…
Estamos aqui por muitos anos querendo que os amazonidas de gabinete tragam uma proposta de sobrevivência para os povos tradicionais da Amazônia.
Tanto o grande como o pequeno aqui estão afundando nos mesmos problemas. Estes bio-picaretas só querem os nossos bens ou o nosso bem?
Waldecy
Sr. Fernando P. Cardoso,
Concordo com o que o senhor considera em seu artigo, como os “amazonistas de ar condicionado”, que realmente pregam teorias demagógicas lá em Brasília e nunca estiveram nem em fotos, numa área realmente devastada. Mas pelo menos, fala-se no assunto e assustam os leitores das grandes cidades, que nem lembram que a comida comprada no hipermercado depende do árduo trabalho do campo.
Nunca escrevi nenhum comentário a respeito dos artigos que leio no site, mas o artigo do senhor me deixou estarrecida e revoltada. Ao invés de se pensar em qualquer questionamento de qual terra deveria ser usada e produzir carne vermelha ou agricultura após a derrubada de uma mata por uma madeireira, porque não se questionar o que fazer com os 70% de pastagens degradadas no país, durante anos de utilização inadequada?
Mesmo na região Norte, onde não se consegue manter índices adequados de aproveitamento nas regiões já consolidadas, devido ao empobrecimento gradativo do solo, já está comprovado que nossa riqueza não está no avanço de novas fronteiras.
Deveríamos sim, procurar preservar o que ainda existe, incentivando a utilização racional do que é próprio da floresta (e que o mundo inteiro está de olho) e não a destruição irracional de uma região que comprovadamente não se mantém rica e produtiva depois da quebra do seu ecossistema sensível, exigindo muito mais cuidados em adubações e etc, que muitas outras regiões brasileiras.
Não participo de nenhuma ONG nem faço parte de grupos de seguidores radicais. Sou uma profissional ligada ao campo, já que, como Veterinária, trabalho e pesquiso sobre produção animal. Mas ao longo de minha vida e através de meu aprendizado e observação, aprendi que o solo (e a natureza que nele age), é o patrimônio de gerações futuras e que nós apenas temos a posse temporária.
Vamos pensar na responsabilidade que temos, não apenas em novas oportunidades de riquezas, que ficam nas mãos de poucos, é mal distribuída e que é a eterna repetição da história do homem.
Tem muita riqueza se olharmos pra trás, no rastro de devastação que foi ficando da má utilização da terra. Olhe o que tem sido feito na região Centro-Oeste, especificamente em Goiás onde estive recentemente. Vi áreas que têm sido recuperadas e que estão em equilíbrio, diminuindo a necessidade de tantos investimentos em adubações pesadas e utilização de agrotóxicos.
Com relação ao futuro e ao que se relaciona com a terra e o uso dela, nossa visão tem que ser mais holística, pois o colapso é iminente e não é conversa pra boi dormir ou lengalenga de cientistas internacionais. Só não se conscientiza quem não quer e acha que não vale a pena qualquer esforço, mínimo que for, para que realmente a mentalidade reinante comece a se modificar, começando nos camponeses que abandonam a terra após sugarem a fertilidade inicial e gratuita que ela oferece, até chegar aos gabinetes frescos dos que se dizem amazonistas, culminando no governo, que deveria ensinar a pescar e não apenas dar o peixe. Sistemas organizados para isso existem em Brasília, não?
Sinceramente, sendo o senhor um empresário e criador, além de ter uma formação técnica como agrônomo, acha que minha revolta é sem fundamento, após ter lido seu artigo?
Imagino que o senhor seja um formador de opinião e suas idéias sejam ouvidas por muitas pessoas. Será que não está na hora de ampliarmos nossa visão e ver o potencial que o Brasil carrega, como uma nação do futuro e cuidarmos do nosso legado conscientemente? Lá fora, o mundo já sabe disso.
Saudações,
Andréa Amaral Alves
Muito bem Dr. Fernando,
Eu estou lá perto de Itaituba noroeste do Pará, gastando meu dinheiro, trabalhando em condições bem difíceis, malária, enfim acreditando que este país tem as oportunidades que no resto do mundo já são muito difíceis, mas parece que a cada dia que passa o governo me “diz”, vá para São Paulo e ponha seu dinheiro no banco, não venha aqui trabalhar, importunar, pedir “licenças”, vá jogar golfe com seus amigos.
Gosto de fazer uma comparação com o tempo que meu pai saiu por este Brasil formando fazendas de mato, que hoje produzem soja e carne, enfrentando todas as dificuldades, como falta de estradas, de comunicação, de veículos apropriados etc…, Mas o governo “dizia” para ele produza, faça, nós financiaremos desde que você trabalhe, senão tomaremos a terra de volta.
Hoje temos a nosso dispor GPS, telefone GLOBAL, veículos com tração para escolher etc… Mas o governo nos trata como bandidos.
Não sei o que dizer a meus filhos, pois sou um brasileiro que acredita neste país e nas grandes oportunidades que ele tem.
Um grande abraço
Silvio Torquato Junqueira
Parabéns pela coragem. Saibam todos que estamos aqui defendendo o Brasil. Sábias as palavras de Chico Buarque “porque não internacionalizar o petróleo”.
A Amazônia é nosso patrimônio, temos que utilizá-lo de forma racional e não simplesmente entregá-lo.
Somos sim heróis patriotas e não bandidos como interessados nos colocam.
Defendam-se.
É isso, mesmo!
Nós, brasileiros, é que deveremos determinar o que deverá ser feito na Amazônia. Brasileiros que verdadeiramente conheçam a realidade amazônica.
O Dr. Fernando Cardoso deixou de citar as organizações religiosas, geralmente representadas por estrangeiros, que em conluio com as ONGs internacionais, tentam ditar os rumos que devemos seguir.
Infelizmente, nossas autoridades estão muito interessadas em impressionar o “estrangeiro”, não sei com quais motivos reais.
Os fatos recentes ligados à morte da freira americana na Amazônia, com a movimentação de parlamentares, de ONGs, de tropas, de policiais, de quase toda a mídia e, inclusive, do FBI, quando comparados com a repercussão da execução aleatória de 30, eu disse trinta, brasileiros no estado do Rio de Janeiro, dão-nos a exata dimensão da incapacidade oficial de lidar com a Amazônia.
Chega a ser patético vermos pessoas oriundas de países, que verdadeiramente poluem nossa atmosfera, que compram e pagam pelos produtos que saem, legal ou ilegalmente, da Amzônia, posarem de mocinhos.
Está na hora de tratarmos a Amazônia com o respeito que ela merece. O governo do Pará deu os primeiros passos nesse sentido, com o encaminhamento de um Plano Estratégico pra a sua exploração.
Prezada Andréa,
São as pessoas como você que justificam meu empenho em esclarecer: apaixonadas, idealistas, patriotas, mas mal informadas.
Antes de iniciarmos um diálogo, peço que leia atentamente minhas duas crônicas publicadas no Beefpoint: “Anapu da Amazônia” e “Amazonistas de Gabinete”.
Quando menciono “ler”, quero dizer “compreender”, para o que é indispensável a isenção de ânimo. Não é com espírito preconcebido ou com preconceito que se alcança toda a abrangência do pensamento do autor.
Você se confessa “estarrecida e revoltada”, sentimentos esses que deixam desconfiar de uma leitura dinâmica, um tanto “por cima”, quase do tipo “não li e não gostei”. Atenda a meu pedido: leia, entenda, compreenda, penetre no pensamento do autor e certamente sua conclusão será menos radical e emocional, para, com modéstia, aceitar: “Ah! eu não sabia que era assim. Agora estou começando a enxergar o que se passa em nosso grande deserto verde!”
Você estabeleceu uma conexão entre Amazônia e Cerrado, talvez sem atentar que na Amazônia ha muito cerrado.Tempos atrás, ao abordar o tema “Santa Brachiaria”, ousei redigir um histórico do cerrado, com vistas principalmente àquele localizado no Brasil Central, de estiagem prolongada e quente. Estou anexando, na esperança que venha a merecer sua leitura serena e desapaixonada.
Um último pedido: visite o site http://www.agrisus.org.br para ter uma idéia do que fazemos e de como pensamos.
Cordial abraço,
Fernando Penteado Cardoso
Eng. Agr. Sênior – Fundação Agrisus, São Paulo
Caro Dr. Fernando,
Parece-nos, que as coisas continuam no mesmo marasmo de, os cães ladram e a caravana passa. A tratativa do tema amazônico, é cercada de mistérios e crenças, certamente produzido por sistemas exóticos ao trabalho consistente com o nosso solo brasileiro. Na pretensão de um protecionismo, deixam-no à mercê de biopiratas…
Abraços,
Fiquei encantado com a carta da Dra Andréa Amaral, comentando o artigo em questão. Ela escreve muito bem. Mas por outro lado, fiquei bastante triste por ela julgar que falta mais abrangência e um pouco mais de visão para o autor.
Eu, ao contrário, aguardo sempre ansiosamente artigos escritos pelo Dr Fernando Cardoso, pois é uma rara oportunidade de aprender, refletir e conhecer a opinião de um dos maiores agrônomos do Brasil e do mundo, pioneiro na recuperação de terras do cerrado e plantio direto na palha.