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Antônio Sodré: a rastreabilidade para garantir mercados atuais e melhores preços

O pecuarista Antônio Sodré concedeu essa entrevista ao BeefPoint, falando do projeto de pecuária que desenvolve no estado de São Paulo e da recente implantação do sistema de rastreabilidade em sua propriedade, onde desenvolve cria, recria e engorda em confinamento. Falou também das perspectivas de exportação e conquistas de novos mercados. Segundo ele, devido à crescente exigência dos consumidores por segurança alimentar, a rastreabilidade será fundamental para a exportação para os atuais e novos mercados e para a agregação de valor do produto carne.

Veja a entrevista na íntegra:

O Sr. poderia apresentar resumidamente o trabalho desenvolvido ?

AS: As fazendas ficam nos municípios de Leme e Corumbataí, em São Paulo, com rebanho composto por 2200 cabeças, fazendo cria, recria e engorda. Há em torno de 800 matrizes, em sua maioria gado Nelore (comercial) e algumas matrizes meio sangue Nelore/Canchim. Para a reposição de fêmeas é feita inseminação em algumas matrizes com a raça Nelore. Além disso, utilizamos Brangus há 14 anos, quando foi trazido para a fazenda sêmen de um touro campeão em Houston/EUA, além de 5 novilhas para transferência de embriões. Esse touro foi o primeiro touro Brangus em Central de IA, no Brasil.

Antes do plano real, conseguíamos vender todos os bezerros pelo preço de bezerro macho, na cotação de Araçatuba. Naquela época, gado era uma reserva de valor. Com a chegada do plano real, tivemos que começar a fazer recria e engorda, pois o bezerro diminuiu de valor e não compensava vender o bezerro de qualidade por um preço mais baixo.

Trabalhamos com novilho precoce há mais de 10 anos, recriados em pasto rotacionado e terminados em confinamento, onde se utiliza silagem de capim Mombaça. Hoje, os animais são abatidos com 2 anos de idade.

O tempo de confinamento varia de acordo com o mercado, com média de 100-120 dias (alguns lotes já ficaram menos de 50 dias confinados). Hoje, são abatidos em torno de 600 animais, que é a capacidade do confinamento. Há um pouco de compra de terceiros para colocação no confinamento e também há descarte dos animais crioulos que não se adequam ao padrão da fazenda.

Quais as razões que o levaram a ser um pioneiro em rastreabilidade no Brasil?

AS: Procuro buscar e utilizar modernas tecnologias. Estive na feira de Anuga, na Alemanha, no ano passado para conhecer mais sobre o mercado internacional da carne.

Hoje, produzo um animal de qualidade diferenciada, mas não tenho nenhum sobre-preço por isso. Meus animais são em sua maioria exportados. Todos os meus procedimentos são adequados à exportação. Por exemplo, há muito tempo não uso cama de frango.

Estamos buscando formar um grupo de pecuaristas, ainda um embrião, para fornecer, num futuro próximo, animais que alcancem um preço diferenciado. Esse grupo de pecuaristas já está procurando se adequar às normas de rastreabilidade, mas isso é um pouco demorado. Os ajustes vão começar a ser feitos no segundo semestre. Acreditamos que será uma boa solução. Hoje, a maioria tem o mesmo número de matrizes (o maior tem 2.000). O número de produtores que têm esse tipo de animal não é muito grande, mas tende a crescer muito se o projeto der certo. Provavelmente iremos fazer abates bimensais. Participei do programa de novilho precoce de SP. Hoje, não participo de nenhum programa de parceria, pois não há nenhum disponível em São Paulo.

Quais os custos de implantação?

AS: Estamos utilizando o sistema de rastreabilidade da OIA e Planejar. O software custa em torno de R$700,00. O preço do brinco ainda não está definido, variando com o modelo. No nosso caso custou R$ 3,50.

Iremos empregar apenas um brinco, pois utilizamos tatuagem para que se tenha uma garantia, caso se perca o brinco. Hoje, a tatuagem tem o número da mãe, mas na próxima geração terá o mesmo número do brinco.

O custo total por cabeça está em torno de R$4,00 a R$5,00 por ano. Acredito que esse custo não irá influenciar muito, isto é, não fará grande diferença.

O senhor acredita que terá maior facilidade de gerenciamento do rebanho e da propriedade, tendo assim uma compensação de custos ?

AS: Não, pois já temos todos os dados cadastrados em nossa fazenda há mais de 10 anos, com um sistema implantado por meu filho. Não houve grandes mudanças em nossa propriedade.

Foi bem fácil implantar o sistema. No nosso caso, quem irá fazer a entrada dos dados será a esposa do administrador. Já tínhamos todos os dados cadastrados, sendo apenas necessário transpor os dados para o sistema da empresa que faz a rastreabilidade.

Quais foram os problemas e os gargalos da implantação?

AS: Tivemos apenas alguns pequenos problemas. Quando foi feita a inspeção, alguns procedimentos precisaram ser modificados. Antes, não havia a preocupação em fazer a identificação de cada animal de forma extremamente precisa. Hoje, isso mudou.

Outro problema foi uma dificuldade normal em identificar alguns animais. Nos animais escuros (sangue Angus) precisamos mudar a cor da tinta da tatuagem, da preta para a verde, importada.

O senhor está otimista com a pecuária de corte brasileira em 2002?

AS: Sim. O trabalho do ministro Pratini foi muito bom. O ano passado foi um ano excepcional. Vários fatores nos ajudaram, o Canadá, a Irlanda, a Argentina e o Uruguai ficaram for do mercado. E o Brasil ocupou seu lugar.

Eu ouvi de um inglês que esteve recentemente no Brasil, que a carne brasileira, que antes era vista com alguma restrição, hoje é absolutamente comparável com os cortes especiais da argentina, quando colocada lá no exterior. De fato, nós temos uma carne de primeira. É claro que os frigoríficos selecionam, pois abatem muitos animais por dia, não sendo difícil selecionar cortes de alta qualidade.

Hoje, não recebemos um extra no preço, de forma constante, quando entregamos um animal de qualidade, pois trabalhamos num mercado commoditizado. Cerca de 95% das vendas de um frigorífico são feitas para supermercados, que o apertam no preço, e ele nos aperta de volta. Os frigoríficos se unem para baixar os preços, isso é sabido por todos. Para isso, temos que nos unir para lutar por um preço melhor.

Qual o recado que o senhor daria para os produtores que ainda não estão buscando a rastreabilidade, ou que ainda não acreditam nesse sistema?

AS: A rastreabilidade é inexorável. É preciso fazer.

Eu aprendi muito no seminário que participei na Alemanha, onde estavam presentes advogados de associações de consumidores, de varejistas e de cadeias de supermercados. Eles reclamavam da inspeção sanitária alemã. Foi possível sentir o problema deles, a exigência lá é grande. Os consumidores desejam que a inspeção sanitária alemã garanta que a carne é de qualidade. Também tive a oportunidade de assistir apresentações de outros países, como o Japão.

Deu para perceber que a preocupação é ter a segurança do produto final. Essa segurança é a rastreabilidade. É a certeza de que se houver algum problema, ele pode vir buscar todos os outros animais, sabendo o porquê e o que aconteceu. A única certeza de que esse alimento não apresenta nenhum problema é a rastreabilidade.

O senhor acredita que receberá um sobre-preço nos animais rastreados?

AS: Hoje recebo 3% acima da cotação da arroba do dia de apenas um frigorífico.

Tenho uma proposta de um frigorífico nacional que nos pagará 10% a mais do preço da arroba, quando chegarmos a uma escala de 10.000 animais, programada anualmente, com 3mm de gordura. Para isso, é preciso ter um número de 12 mil matrizes para se alcançar uma escala programada para um ano.

A idéia é ter uma parceria com frigoríficos que já estão realizando um bom trabalho no exterior. De maneira alguma desejamos construir nosso próprio frigorífico.

Há também a possibilidade de receber a mais pelo couro, se for feito todo um programa para se manter a qualidade, com controle de parasitas e cuidados para que não este não se estrague em cercas ou no caminhão a caminho do frigorífico.

Vamos buscar exportar cortes nobres e também o dianteiro, que tem muito mercado no exterior. Os importadores europeus querem qualidade, mas como todo comprador, buscam bons preços. Temos que parar de vender commoddity e começar a vender qualidade, pois as margens são muito pequenas em mercados comoditizados.

Sem a rastreabilidade, todo esse trabalho de se produzir uma carne de alta qualidade não fará sentido, pois não será possível se garantir a procedência do produto e, ao mesmo tempo, se garantir o sobre-preço desse nosso animal diferenciado.

0 Comments

  1. ROMÃO MIRANDA VIDAL disse:

    Se todos tivessem a mesma postura do Sr. Antônio Sodré, a Rastreabilidade provavelmente implantaria uma das maiores revoluções na pecuária brasileira. Mas… é necessário ficar com um pé atrás, em função de uma onda crescente de que a Rastreabilidade seria de única e total administração do ESTADO, assim como não seria necessário o uso de nenhum tipo de instrumento (brinco, chip, bolo), mas sim o uso de uma Caderneta na qual se anotaria todos os procedimentos e posteriormente seria copiada pelo Técnico do ESTADO.

    Afora o pensamento crescente de algumas entidades que estão buscando para si a Administração e Controle de todo o Sistema de Rastreabilidade, incluindo nesta fagocitose desmesurada a Certificação, na assepção da palavra.

    Parabéns ao Sr. Antônio Sodré, é para frente que se anda e para cima que se olha.