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Redes globais de varejo e fast-food selecionam fornecedores por boas práticas de produção

Algumas edições atrás, nesta coluna, falei um pouco sobre bem-estar animal. Gostaria de resgatar o tema, pois nos Estados Unidos algumas mudanças puxadas pelos varejistas, que são a voz do consumidor nas ruas, começam a dar curso em um cenário para os próximos anos sobre o tema.

Há pouco tempo, os maiores varejistas norte-americanos focaram na proteína suína, no que diz respeito às baias de gestação de matrizes, onde estas ficam imóveis para geração das crias. Redes como Kroger, Safeway, Kmart e, mais recentemente, Costco, determinaram aos seus fornecedores de suínos que não mais aceitarão carne que provenha de animais manejados dessa forma. Dependendo de cada rede, o limite para adequação dos fornecedores pode variar de 2017 até 2022. Em recente carta endereçada aos seus fornecedores de suínos e à Sociedade Humanitária Americana (HSUS), o vice-presidente executivo de Produtos da Costco, Doug Schutt, escreve: “Todos nós, na Costco, levamos o tema do bem-estar animal a sério e consideramos imperativo o manejo animal de forma humanitária”.

Não somente os varejistas, mas também outros segmentos estabeleceram, neste ano, critérios muito parecidos, levando o tema do bem-estar animal bastante a sério. Redes de fast food como Burger King, McDonald’s, Wendy’s, Carl’s Jr, entre outras menos expressivas, bem como empresas globais importantes de food service – Sodexo e Compass Group, sendo esta última atuante em mais de 10 mil escolas, universidades, empresas, hospitais, centros para idosos, parques esportivos, entre outros estabelecimentos, provendo serviços de alimentação –, também tomaram essa decisão corporativa a pedido dos seus clientes e instituições que atendem. Algumas indústrias, que compram matéria-prima suína para fazer seus produtos industrializados, partiram também para garantir a imagem de suas principais marcas no mercado americano, tais como Heinz e Kraft Foods, tendo como principal plataforma a sua marca Oscar Mayer.

Assim como escrevi na edição de junho sobre o LFBT (carne magra, fina e texturizada), um gatilho foi disparado, no caso do LFBT, pela imprensa e pelo chef Jamie Oliver. Já o disparo no exemplo dos suínos partiu de grupos ligados à defesa dos animais, como o Mercy for Animals. Em visita a um confinamento de suínos, fornecedor da rede de varejo Costco, a entidade divulgou um vídeo na internet no qual mostra o tratamento dado aos animais em sua gestação em baias onde não podem se movimentar.

No âmbito bovino, também existem discussões a respeito sobre o manejo nos confinamentos, no transporte de animais e nas plantas de abate, bem como nos rituais de abate religiosos como o kosher e o halal, que não insensibilizam os animais previamente à degola e podem expor estes animais ao estresse e sofrimento. No entanto, as leis judaica e muçulmana carregam, desde os seus ancestrais, princípios de bem-estar animal nos quais, por exemplo, a lei judaica proíbe o consumo de membros de animais vivos, além da proibição de abater a mãe e suas crias no mesmo dia. Alguns muçulmanos permitem uma insensibilização prévia por concussão, desde que esta não penetre o corpo do animal. Insensibilização elétrica em bovinos e caprinos é aplicada na Nova Zelândia, que proíbe o abate halal sem insensibilização prévia, e esta técnica também começa a se espalhar pela Austrália. Proibir o abate religioso em nome do bem-estar animal seria uma afronta aos seguidores destas religiões; e privá-los de uma proteína importante como a bovina é impensável.

A discussão sobre como tratar melhor os animais que nos alimentarão e a pressão cada vez maior da sociedade, em busca de mais alimentos a um preço possível de ser consumido, abrem as portas para se pensar em novas formas de manejo e produção de proteína animal. Uma tendência já foi evidenciada pelo consumidor desde a década passada, que é a de consumir produtos obtidos da forma mais natural possível. Produções orgânicas vêm crescendo e também aumenta o incentivo de consumir produtos produzidos localmente pelo apelo do frescor, do custo do transporte, da perda e do impacto nos gases do efeito estufa, porém, por outro lado, como fazer isso em escala global a fim de alimentar um mundo em expansão, onde a necessidade de alimentos dobrará até 2050, segundo a FAO [Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação]?

Essas mudanças para atender às necessidades do bem-estar animal, inicialmente, sempre impactam em custos maiores, e isto pode ser usado para elevar preços. Mas o bem-estar animal, como disse no artigo passado, também contribui para melhores rendimentos, maior vida útil de prateleira, consumidores menos resistentes ao consumo, mais vendas e, possivelmente, melhores lucros. Essa pode ser a chave do sucesso para melhorar essa relação entre criação, manejo dos animais, consu- midores e lucros.

6 Comments

  1. Fabiano Pagliarini Santos disse:

    Senhor Hudson, muito eloquente seu artigo e gostaria de me ater a alguns detalhes, especificamente a bovinos e daquilo que tenho com uma pequena vivência.

    Quanto a maus tratos de bovinos é muito, mas muito maior a falta de qualidade de manejo dos frigoríficos que na propriedade que trabalhamos. O uso de choque de forma moderada, somente é permitido na pesagem dos animais que resistem a entrarem na balança que é mecânica. A um bom tempo usamos bandeiras, e evitamos manejo desnecessário que cause stress ao animal.

    No entanto tivemos casos de animais que chegaram stressados e machucados nos abatedouros, nos causando prejuízo não reparado. Ai questionamos culpar a quem?
    Ao transportador que recebe um valor que é insatisfatório e com isso tem que acelerar para fazer várias viagens, detalhe em estradas rurais não assistidas pelo poder público.
    Ao frigorífico que além da quebra de balança e faca ainda quer descontar da carcaça o peso, lembre que fomos nós que cuidamos do bem estar do animal até o embarque.

    Quando o senhor fala em aumento de custos que são repassados ao valor final do produto, muitas vezes quem paga isso é quem faz o manejo a indústria se isenta repassando custos ao produtor, isso ainda é mais acentuado, nas cadeias de suínos e aves.

    Outro ponto é a questão dos rituais religiosos, devemos lembrar que são um mercado importante e destinado a um público específico, eu nunca acompanhei a um abate desse, mas pior que isso é constituir lucro em prejuízo de outros.

  2. FELIPE SILVA S. DE P . BARBOSA disse:

    Acho interessante a posição do Brasil com relação ao abate religioso , a acho que proibi-lo seria privar essas pessoas de um direito mundial que é o direito a crenças religiosas, além de permitir que a nossa carne atenda a necessidade cultural dessas pessoas , fortalecendo nosso mercado

  3. Jefferson Luiz Marciano do Nascimento disse:

    Primeiramente, dou-lhe meus cumprimentos Sr. Hudson Carvalho, pela difusão de notícias importantes sobre o assunto bem-estar animal. Creio que nosso país ainda tem muito a ser feito a respeito da questão Produção Animal x BEA, porém acredito no potencial de nossos profissionais.
    Fiquei admirado ao ver que as preocupações estão partindo de muitos os lados, tendo em vista a formação profissional do referido autor desse noticiário, importante contar com a colaboração dos demais profissionais de outras áreas.

    “Sozinhos vamos mais rápidos, juntos vamos mais longe”!

    Jefferson Luiz – Estudante de Agronomia pela Universidade Federal de Viçosa – MG
    Aluno do CEI – Cambridge E-learning Institute – Certificado Online em Bem-Estar Animal

  4. wandadallamarta disse:

    Acho que deveriam abrir um debate sobre o uso de choques,nos embarques dos animais ,para os frigorificos pois os motoristas abusam dos mesmos.

  5. Neilor Consentino Fontoura disse:

    O caminho do Bem estar Animal é uma via única e sem volta, não é mais uma questão de nichos ou mercados específicos e sim uma necessidade para se manter na atividade, estamos chegando em um ponto que a agricultura e pecuária estão conquistando espaço e respeito na sociedade em geral, com isso o ônus de prestarmos contas a mesma é inevitável, recentemente realizei um curso de Boas Práticas de Manejo para colaboradores de uma empresa que dou assistência, e o resultado me impressionou, funcionários antigos que poderiam apresentar resistência foram os mais interessados e dispostos a fazer uso das novas técnicas, menos estressantes aos animais e mais seguras para eles, portando vejo como uma realidade o Bem Estar Animal dentro das nossas propriedades, quanto aos frigoríficos, uma manofatura altamente especializada, uma obrigação que inclui preparação dos seus transportadores.

    Neilor Consentino Fontoura
    Médico Veterinário

  6. Paulo Filipin disse:

    Corrigindo a sua informação, somente o Kosher não insensibiliza os animais, sendo bem complicado o processo para abater os animais. Já Halal, em sua maioria, se não a totalidade, permite a insensibilização antes da degola, tanto em frango quanto em bovinos, a diferença é que eles não querem que os animais morram antes da sangria (nossa legislação também não) e os novos conhecimentos já falam que não há influencia se o animal morrer antes. No caso de bovino o que difere é que não abre a barbela do animal, mas isso não influencia na qualidade da extração do sangue, mas sim na higiene da operação. Quanto à aplicação dos preceitos do Bem estar animal, eu considero que a IN 03/2000 uma legislação bem interessante, que se bem interpretada pelo fiscal, dá pra cobrar muita coisa no estabelecimento abatedouro. Fiz um trabalho de supervisão e acompanhamento da equipe da WSPA bem interessante e posso dizer que há frigoríficos que aplicam os preceitos de BEA de maneira exemplar, pena que não é todos.