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Aumento da taxa de prenhez em receptoras bovinas pela sincronização da ovulação e inovulação de embriões em tempo fixo

Por Pietro Sampaio Baruselli1 e Márcio de Oliveira Marques2

1. Introdução

Cerca de 70.000 embriões bovinos são transferidos anualmente no Brasil, quantidade inferior apenas aos 176.000 embriões transferidos dos EUA (Thibier, 2001). Inúmeros fatores interferem na eficiência de programas de Transferência de Embriões (TE), com destaque especial às receptoras. Isto porque os programas de TE comerciais apresentam baixas taxas de aproveitamento. Normalmente, em um rebanho de receptoras tratadas com protocolos tradicionais, somente 40 a 50% dos animais são aproveitados para a inovulação. Considerando uma taxa de concepção de 50% do total de animais aproveitáveis, obtém-se apenas 20 a 25% de gestações ao final do tratamento.

Desta forma, o incremento das taxas de concepção e de prenhez das receptoras é fundamental para maximizar o retorno zootécnico e econômico da TE, determinando, além de maior número de bezerros/ano, redução dos gastos com fêmeas não prenhes no rebanho. E, para aumentar a eficiência das receptoras de embriões nas condições brasileiras, o Departamento de Reprodução Animal da FMVZ-USP implantou uma linha de pesquisa específica, cujos resultados são apresentados a seguir.

2. Inovulação de embriões utilizando Prostaglandina e detecção de cio

Alguns dos principais problemas da sincronização de receptoras com análogos da prostaglandina (PGF2alpha) são: a) mão-de-obra capacitada para detectar o cio; b) variação no tempo da administração da PGF2alpha à ocorrência do estro; c) presença de corpo lúteo (ciclicidade) para responder ao tratamento e d) limitada quantidade de receptoras detectadas em cio. Para reduzir tais problemas, nosso grupo de pesquisa (Baruselli et al., 2000a) obteve, pela monitoração ultra-sonográfica do desenvolvimento folicular, maior número de ovulações sincronizadas e menor variação do momento da ovulação em novilhas cruzadas submetidas ao protocolo “Ovsynch” (Dia 0=GnRH; Dia 7= PGF2alpha; Dia 9=GnRH), que naquelas submetidas à administração única de PGF2alpha (Figura 1).

Figura 1. Distribuição das ovulações (horas) após a administração de PGF2alpha em novilhas receptoras de embrião tratadas com “Ovsynch” ou dose única de PGF2alpha. Baruselli et al., 2000a.

Esse protocolo inicial levou ao desenvolvimento de novas condutas voltadas ao aumento da eficiência de receptoras mantidas a campo.

3. Programas de inovulação de embriões em tempo fixo

Alguns investigadores (Tríbulo et al., 2000; Baruselli et al., 2000b, 2000c e 2001; Bó et al., 2002) demonstraram que as taxas de aproveitamento (= (número de receptoras aptas à inovulação x 100) / número de receptoras tratadas) são maiores em receptoras submetidas a protocolos de TE em tempo fixo do que naquelas tratadas com uma ou duas administrações de PGF2alpha e posterior detecção de cio. Assim, e como as taxas de concepção (= (número de receptoras prenhes x 100) / número de receptoras inovuladas) de tais protocolos são similares àquelas obtidas em receptoras tratadas exclusivamente com PGF2alpha, o resultado final é o aumento das taxas de prenhez (= (número de receptoras prenhes x 100 ) / número de receptoras tratadas) dos programas de TE em tempo fixo, além da vantagem de possibilitarem a programação do dia da inovulação e de evitarem o trabalho com a detecção de cio.

Nosso grupo (Baruselli et al., 2000b) também verificou que o tratamento Ovsynch para inovulação de embriões a fresco em tempo fixo determinou taxa de concepção semelhante (P>0,05) àquela observada em novilhas inovuladas após a administração única de PGF2alpha e detecção de cio por 5 dias (Tabela 1). Entretanto, como a taxa de aproveitamento (receptoras portadoras de corpo lúteo ≥ 10 mm que foram inovuladas) foi maior (P<0,0001) no grupo Ovsynch, a taxa de prenhez desse grupo foi estatisticamente mais elevada (P<0,05; Tabela 1). Tabela 1. Taxas de aproveitamento, concepção e prenhez de novilhas receptoras de embrião bovino (Bos taurus x Bos indicus) detectadas em cio após dose única de PGF2alpha ou inovulação em tempo fixo após o protocolo Ovsynch. Baruselli et al., 2000b.

Tríbulo et al. (2000) compararam a eficiência de receptoras tratadas com 2 administrações de PGF2alpha (intervalo de 14 dias) com a de fêmeas submetidas ao protocolo descrito a seguir: no Dia 0, inseria-se um CIDR-B (InterAg) juntamente à administração IM de 2mg de Benzoato de Estradiol e 50 mg de Progesterona; no Dia 7 os dispositivos eram retirados, e administrava-se 0,150 mg de PGF2alpha; no Dia 8 – cerca de 24 horas após a retirada dos implantes – 1mg de Benzoato de Estradiol era administrado IM; o Dia 9 era considerado o momento do cio; assim, procedia-se à inovulação “one-step” em tempo fixo pelo método não-cirúrgico no Dia 16. A inovulação das receptoras tratadas apenas com PGF2alpha foi realizada 7 dias após a detecção do estro. Somente as vacas portadoras de corpos lúteos (CL) ≥ 15mm à avaliação ultra-sonográfica foram inovuladas. Os resultados desse estudo encontram-se na Tabela 2.

Tabela 2. Taxas de aproveitamento, concepção e prenhez em vacas solteiras detectadas em estro após 2 administrações de PGF2alpha ou transferidas em tempo fixo após tratamento com CIDR-B e Benzoato de Estradiol. Córdoba, Argentina, 2000.

Como pode ser observado, nas condições ótimas de resposta ao tratamento com PGF2alpha, os protocolos que utilizam progesterona para TE em tempo fixo apresentam resultados semelhantes, com a vantagem de dispensar a detecção do cio. Entretanto, esse experimento foi realizado nas condições de manejo e pastagem argentinas, havendo seleção prévia apenas de receptoras cíclicas, de maneira que a taxa de aproveitamento do grupo PGF2alpha está acima da média brasileira.

4. Área do CL e Concentração plasmática de progesterona na taxa de concepção de receptoras Bos taurus x Bos indicus

A relação entre a taxa de concepção e a concentração plasmática de progesterona e o tamanho do CL em receptoras de embriões bovinos é objeto de controvérsias entre os estudiosos. Vários pesquisadores têm verificado correlação positiva entre tais variáveis. De acordo com Vasconcelos et al. (2001), quanto maior o volume do corpo lúteo, maior será a concentração de progesterona, e, conseqüentemente, maior taxa de concepção será obtida em vacas inseminadas em tempo fixo. Esses achados concordam com experimento realizado por nosso grupo (Baruselli et al., 2000b), no qual verificou-se que a área do CL está associada à concentração plasmática de progesterona e à taxa de concepção de receptoras Bos indicus x Bos taurus, conforme demonstrado na Tabela 3.

Tabela 3. Concentração de progesterona e taxa de concepção conforme a área do corpo lúteo no dia 6 do ciclo estral em receptoras de embrião bovino (Bos indicus x Bos taurus).

Outra investigação por nós realizada com o objetivo de superovular receptoras para a inovulação de embriões em tempo fixo (Baruselli et al., 2000c e 2001) também demonstrou relação positiva entre o número de corpos lúteos, a concentração de progesterona e a taxa de concepção após a transferência de embriões congelados em etileno-glicol. Nesse estudo, foram utilizadas 100 novilhas mestiças Bos taurus x Bos indicus mantidas a pasto no município de Botelhos (MG).

No grupo Controle (n=50), inseriu-se um implante intravaginal contendo 1,9g de Progesterona (CIDR-B, Pharmacia), juntamente à administração de 2mg de Benzoato de Estradiol (BE), IM (Estrogin, Farmavet) e de 50mg de Progesterona, IM (dia 0). No dia 7 pela manhã foram aplicados 500microg de PGF2alpha (Cloprostenol sódico IM, Ciosin, Coopers), e à tarde os implantes foram retirados. No dia 8 pela manhã administrou-se 0,5 mg de BE, IM. O grupo superestimulado com eCG (n=50) recebeu o mesmo protocolo, acrescido da administração de 800 UI de e.C.G., IM (Novormon, Tecnopec) na manhã do dia 5. Para a contagem do número de folículos ≥ 0,8cm (FG), a avaliação ultra-sonográfica ovariana foi realizada no dia 8 (Controle, n=25 ; eCG, n=24).

No dia 15 foram colhidas amostras de sangue para dosagem da concentração plasmática de progesterona (48 animais por grupo), bem como realizadas avaliações ultra-sonográficas (todos animais), para contagem do número de corpos lúteos e classificação das receptoras para inovulação. Os corpos lúteos únicos foram classificados em: CL 1 (área ≥ 2,2 cm2), CL 2 (área ≤ 2,19 cm2 e ≥ 1,4 cm2) ou CL 3 (área ≤ 1,39 cm2 e ≥ 1,30 cm2). No dia 16, todas as receptoras classificadas como aptas (Controle: n=17 e eCG: n=40) foram inovuladas em tempo fixo com um embrião descongelado “one step” (etileno-glicol), pelo método não-cirúrgico e pelo mesmo veterinário. Os resultados estão apresentados nas Tabelas 4 e 5.

Tabela 4. Número médio de CL (± desvio padrão), concentração plasmática de progesterona (P4) (1 dia prévio à TE) e taxas de prenhez em receptoras Bos taurus x Bos indicus tratadas com dispositivos CIDR-B + Estradiol/progesterona no Dia 0, com ou sem 800 UI de eCG no Dia 5 e inovuladas em tempo fixo.


abMédias ou porcentagens nas colunas com diferentes sobrescritos diferem significativamente (P<0,05). cdMédias ou porcentagens nas colunas com diferentes sobrescritos diferem (P=0,07)

Tabela 5. Área do CL, concentração de progesterona e taxa de concepção de receptoras de embrião portadoras de corpo lúteo único conforme o tratamento.

Assim, o tratamento com eCG no momento esperado da emergência da nova onda de crescimento folicular foi eficaz na superovulação ou desenvolvimento de um folículo dominante único de maior diâmetro e determinou, além de maior número de corpos lúteos (ou corpo lúteo único maior), maior concentração plasmática de progesterona e maiores taxas de aproveitamento, concepção e prenhez que o tratamento utilizado no grupo controle.

Bó et al. (2002) propuseram um protocolo semelhante (Figura 2), e verificaram que a utilização de 400 UI de eCG no momento da emergência da onda de crescimento folicular determinou apenas 2% de dupla ovulação em receptoras cruzadas. No entanto, esse tratamento formou corpo lúteo único maior e incrementou a taxa de concepção e de prenhez em receptoras inovuladas com embriões congelados em etileno-glicol que aquele empregado no grupo controle, que não recebeu eCG (Tabela 6).

Tabela 6. Diâmetro do CL (média ± desvio padrão; dia prévio à TE) e taxa de prenhez em receptoras tratadas com dispositivos DIV-B + estradiol/progesterona no Dia 0, com ou sem 400 UI de eCG adminsitrados no Dia 5 e inovuladas em tempo fixo.


a Diâmetro do CL aferido por ultra-sonografia em receptoras transferidas (CL ≥ 10 mm).
bc Médias ou percentagens nas colunas com diferentes sobrescritos diferem significativamente (P<0,02).

Figura 2. Protocolo para TE em tempo fixo em bovinos. O tratamento consiste na inserção de um dispositivo liberador de progesterona juntamente à administração de Benzoato de estradiol (BE) e progesterona (P4) no Dia 0, PGF e 400 UI de eCG no Dia 5, remoção do dispositivo no Dia 8, e BE no Dia 9. O estro não é observado e a TE é realizada no Dia 17 em receptoras com CL >10 mm. (Bó et al., 2002).

A formação de corpo lúteo de maior diâmetro também é possível a partir da indução de um folículo ovulatório persistente, originado pela permanência prolongada (até 14 dias) de implantes contendo progesterona ou progestágenos (Moura et al., 2001; Mantovani et al., 2002). Os dados preliminares desses nossos experimentos indicam que tratamentos que buscam induzir a persistência folicular determinam maiores diâmetros do folículo ovulatório e do corpo lúteo, e concentração plasmática de progesterona mais elevada. Além disso, houve aumento significativo nas taxas de aproveitamento, de concepção e de prenhez das receptoras submetidas a tais protocolos.

Uma possibilidade alternativa para incrementar a progesterona plasmática (P4) é a realização de tratamentos com GnRH, LH, hCG (para indução de corpos lúteos acessórios), ou com o suprimento exógeno de progesterona liberado por dispositivos intra-vaginais. O tratamento com hCG no dia 7 do ciclo estral promoveu maior aumento nas concentrações plasmáticas de P4 e maior duração do ciclo estral que aqueles realizados com GnRH, LH e progesterona em novilhas Bos taurus x Bos indicus (Marques et al., 2002). Todos esses tratamentos foram testados a campo em novilhas inovuladas com embriões previamente congelados em etileno-glicol. Os resultados seguem na Tabela 7.

Tabela 7. Taxa de concepção em novilhas submetidas a diferentes tratamentos (GnRH, hCG, LH e CIDR) no momento da inovulação de embriões congelados em etileno-glicol.

Como se verifica na tabela anterior, todos os tratamentos que objetivavam formar um corpo lúteo acessório e aumentar as concentrações plasmáticas de progesterona apresentaram taxas de concepção superiores àquela do grupo controle.

Diante dos resultados até aqui expostos, fica evidente que é possível aumentar a taxa de concepção e de prenhez em receptoras de embriões com o emprego de fármacos para a sincronização da ovulação que também elevem a concentração plasmática de progesterona.

Referências Bibliográficas

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1Prof. Dr. Pietro Sampaio Baruselli é professor do Departamento de Reprodução Animal, FMVZ – USP
2Márcio de Oliveira Marques é médico veterinário e mestrando do Departamento de Reprodução Animal, FMVZ – USP

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