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Avaliação genética para resistência ao carrapato Boophilus microplus

Para que a seleção para resistência ao carrapato possa ser realizada é necessário intenso trabalho de avaliação dos rebanhos e é imprescindível que as metodologias empregadas a campo não exijam tempo e mão de obra excessivos na sua execução, e sejam eficientes, para que se possa obter resultados aplicáveis.

Por Fernanda Varnieri Brito, Vânia Cardoso, Roberto Carvalheiro, Luiz Alberto Fries, Carlos Dario Ortiz Peña, Mario Luiz Piccoli, Vanerlei M. Roso, Flávio Schenkel e Jorge Luiz Paiva Severo¹


Considera-se que o carrapato Boophilus microplus seja um dos parasitos que causam maior prejuízo à pecuária nas regiões intertropicais. Além dos prejuízos diretos e do surgimento de cepas resistentes a praticamente todas as classes de compostos químicos, em decorrência da pressão de controle e do uso inadequado dos carrapaticidas, torna-se cada vez maior a exigência pelo mercado de carne de qualidade e alimentos livres de resíduos químicos, que possam afetar o meio ambiente, a saúde e o bem estar das pessoas.

Alcançar a alta eficiência de produção necessária envolverá a melhora genética dos principais conjuntos de características que afetam a produção, inclusive da ´adaptação´, através de seus efeitos sobre o bem estar físico do animal. Neste contexto, a seleção de animais geneticamente resistentes ao carrapato, particularmente, pode ser uma das ferramentas mais eficientes, reduzindo o controle químico e aumentando a produtividade de bovinos de corte.

Para que a seleção para resistência ao carrapato possa ser realizada é necessário intenso trabalho de avaliação dos rebanhos e é imprescindível que as metodologias empregadas a campo não exijam tempo e mão de obra excessivos na sua execução, e sejam eficientes, para que se possa obter resultados aplicáveis.

Simplificando a metodologia para avaliação das infestações

A metodologia tradicional adotada mundialmente para medir infestações, em pesquisas quanto à eficiência de produtos químicos ou que visam estimar herdabilidade para a característica resistência ao carrapato, consiste na contagem de fêmeas do B. microplus, entre 4,5 e 8,0 mm de diâmetro, em um lado todo dos bovinos.

Em estudo com 911 animais ½ Angus ½ Nelore, em sistema intensivo de pastejo, na fazenda Córrego Azul (Grupo Höfig Jr.), em Brasilândia, MS, contagens em regiões específicas/parciais de um lado do corpo (anterior, mediana e posterior) e no entrepernas (região compreendida entre as faces internas dos membros posteriores do animal), bem como avaliações visuais do grau de infestação foram testadas e comparadas à metodologia tradicional, com relação às suas capacidades de discriminar diferenças em resistência genética ao carrapato B. microplus.

A grande variação genética aditiva indicada pelas estimativas de herdabilidade observadas para a resistência medida por contagem total em um lado dos animais, e nas regiões posterior e entrepernas (0,47, 0,46 e 0,32, respectivamente), sugere facilidade na resposta à seleção individual, baseada nessas características. As medidas de resistência nas regiões mediana, posterior e entrepernas foram as que apresentaram as maiores correlações genéticas com a resistência avaliada pela contagem total (0,82, 0,77 e 0,66, respectivamente) e, portanto, seleção com base em qualquer destas partes deve levar a uma grande e favorável resposta correlacionada com o número total de carrapatos sobre o animal.

Neste mesmo estudo, quando os valores genéticos para a resistência ao carrapato obtidos de acordo com os vários métodos de contagem estudados foram classificados em ordem crescente e comparados, observou-se que 83,33% de 25% dos touros que seriam selecionados com base na contagem em todo o lado do animal também o seriam se fossem avaliados por contagens na região posterior ou entrepernas (Cardoso, 2000).

Apesar de a metodologia tradicional, provavelmente, ser a medida mais eficaz, as altas correlações observadas para as contagens na região posterior ou na de entrepernas com a contagem em um lado todo, suas herdabilidades moderadas a altas, e a facilidade de execução devem permitir benefícios adicionais para grandes rebanhos. O entrepernas constitui um local de difícil autolimpeza, onde os carrapatos encontram um ambiente mais favorável, e por compreender uma região pequena, localizada entre os membros posteriores do animal, com acesso imediato, a contagem no entrepernas poderia ser feita sempre e ao mesmo tempo que medidas do perímetro escrotal fossem realizadas.

Cuidados na coleta de dados

Algumas condições importantes que devem ser observadas/atendidas para que se possa medir o grau de infestação pelo carrapato B. microplus em um rebanho, com a finalidade de avaliação genética para a resistência ao carrapato são:

– determinação correta do momento da mensuração: Deve-se garantir que haja infestação suficiente para permitir a observação de variabilidade em resistência genética ao carrapato. Estudos sugerem um número médio de, pelo menos, 20 carrapatos em todo o corpo para animais cruzados e de, pelo menos, 10 para animais zebuínos (Nicol, 1987). Para isso, é necessário que os animais não recebam anti-parasitários durante um período de, aproximadamente, trinta a quarenta dias antes da avaliação.

– formação de grupos de contemporâneos (animais com mesmo histórico/oportunidades) que permitam uma justa comparação entre os animais.

– registro de dados como a data da avaliação e o pasto/potreiro onde o animal/grupo permaneceu nos últimos trinta a quarenta dias, já que a época do ano, o histórico de culturas do potreiro e o tipo de pasto/forragem constituem importantes fatores ambientais que influenciam o grau de infestação (Andrade, 1996; Cardoso, 2000).

– utilização de um mesmo critério na definição das áreas/regiões do corpo examinadas para, pelo menos, todos os animais de um mesmo grupo de contemporâneos.

– realização das contagens por uma mesma pessoa para, pelo menos, cada grupo de manejo inteiro.

Trabalhando com dados de contagens de carrapatos

Observa-se que existe uma grande correlação entre as médias e os desvios-padrão do número de carrapatos dentro dos grupos de contemporâneos avaliados. Quando métodos de análise que pressupõem normalidade dos dados, como para estimar componentes de variância, são utilizados, é importante que se realize a transformação dos dados para que a variância das respostas se torne independente de seus valores médios (Draper and Smith, 1998). No entanto, para predições dos valores genéticos para resistência ao carrapato, não é necessário transformação, já que normalidade não é requerida (McCulloch and Searle, 2001).

Herdabilidades nos sentidos amplo (H²) e restrito (h²) obtidas para o número de carrapatos na região do entrepernas sem nenhuma transformação (0,19 e 0,16, respectivamente) para um conjunto de 2821 animais de composições genéticas entre o Hereford e o Nelore foram subestimadas em relação às obtidas para os mesmos dados submetidos à tranformação logarítmica na base 10 (0,27 e 0,20, respectivamente) (Cardoso et al., 2006).

Mesmo assim, é possível observar a existência de variabilidade genética aditiva e diferentes graus de resistência entre animais de mesma composição genética (h²) e entre diferentes composições genéticas (H²) por meio da análise das contagens não transformadas. O mesmo estudo ressalta ainda a importância da realização de um bom desafio/exposição à infestação e, conseqüentemente, a observação de um número mínimo de carrapatos para detecção de variabilidade genética.

Análises realizadas utilizando-se apenas os grupos de contemporâneos com médias do número de carrapatos iguais ou superiores a 5,00 (n=2164 animais) revelaram estimativas de herdabilidade nos sentidos amplo e restrito das contagens transformadas 26% (H²=0,34) e 25% (h²=0,25) superiores àquelas obtidas para todo o conjunto de dados.

Resultados práticos

O uso da contagem no entrepernas, região de acesso imediato, como um método simples, de rápida realização e eficaz para a avaliação do grau de infestação, possibilitou o início, há quatro anos, de trabalhos de campo em populações comerciais de Hereford e Braford, as quais atingiram hoje um volume de dados de 6315 animais avaliados, com DEPhs e DEPs para resistência ao carrapato.

Grupos de manejo específicos para a avaliação da resistência ao carrapato são formados e as avaliações são realizadas sempre no período pós-desmama, sendo que o momento exato para a realização das contagens é determinado visualmente, pelo grau de infestação que acarretaria em controle químico.

Os DEPhs e as DEPs para resistência a carrapato visam identificar animais menos susceptíveis ao carrapato ou mais adaptados às condições ambientais em que são criados. Seus valores são expressos em número de carrapatos em uma pequena região do corpo, o entrepernas, sendo que o DEPh para a resistência ao carrapato é obtido em relação a um alvo igual a 10, o qual representa o objetivo buscado por esta seleção.

Os valores de DEPh e DEP entre as populações Hereford e Braford avaliadas hoje variam de 8,93 a 12,21 e de -2,27 a 1,11, respectivamente. Um DEPh de 8,93 para um touro significa que seus filhos deverão apresentar em média -1,07 carrapatos em relação ao alvo da seleção. Uma DEP de -2,27 para um touro significa que seus filhos deverão apresentar em média -2,27 carrapatos em relação ao número médio observado na população, na região do corpo avaliada. Por resposta correlacionada, a seleção com base nos DEPhs ou nas DEPs para a avaliação no entrepernas afetarão o número total de carrapatos no corpo inteiro do animal. DEPhs mais próximos ou inferiores ao alvo e DEPs menores ou mais negativas são mais desejáveis.

Referências bibliográficas

Andrade, A. B. F. Aspectos genéticos e ambientais da resistência a Boophilus microplus de bovinos da raça Gir, da Estação Experimental da EPAMIG, Uberaba, MG, Brasil. Jaboticabal, SP, 1996, 79p. Dissertação (Mestrado em Zootecnia) Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias, UNESP.

Cardoso, V. Avaliação de diferentes métodos de determinação da resistência genética ao carrapato Boophilus microplus, em bovinos de corte. Jaboticabal, SP, 2000, 108p. Dissertação (Mestrado em Zootecnia) Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias, UNESP.

Cardoso, V.; Fries, L.A., Roso,V.M., Brito, F.V. Estimates of heritability for resistance to Boophilus microplus tick evaluated by an alternative method in a commercial polled Hereford x Nelore population in Brazil. Proceedings of 8th World Congress on Genetics Applied to Livestock Production, August 13 to 18, 2006, Belo Horizonte, MG, Brazil.

Nicol, D. Tick Resistance Ratings. In.: Hammond, K., Scarth, R. D. Selecting Beef Cattle for Maximum Productivity. A Handbook for National Breeder´s School, ABGU, Armidale, Australia, 1987, 183p.

Sumário de Avaliação de Reprodutores 2006. Conexão Delta G.

______________________________
¹Equipe GenSys

0 Comments

  1. Cecília José Veríssimo disse:

    Parabenizo à equipe GenSys pelo trabalho realizado. Espero, para o bem deste país, que este trabalho de seleção de animais resistentes ao carrapato se amplie a todo o Brasil, pois bovino resistente é a forma mais eficaz (controle efetivo da população de carrapatos), biológica (não há necessidade de aplicação de produtos químicos) e econômica (menor gasto com carrapaticida, mão-de-obra, mortalidade, ganho de peso, produção leiteira) de controle do carrapato-do-boi.

  2. Germano Jose Martins Assunçao disse:

    Em relação a resistência do carrapato foi um esclarecimento mais técnico e científico, acretido que poucas pessoas no meio rural vão entender pelo meio que foi explicado para o grau de estudo na área rural. Mas foi muito bom, pois sabemos que tem pessoas muito interresadas no assunto. O dia que conseguirmos uma vacina contra este individuo seremos mais felizes e o nosso custo vai cair bem.

    Obrigado, Germano