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Avaliações genéticas multiraciais

Populações compostas por animais de diferentes raças e cruzamentos estão se tornando cada vez mais comuns. A possibilidade de fazer uso efetivo da variabilidade genética da população como um todo é uma das principais justificativas para a realização de avaliações genéticas multiraciais.

Por Fernanda Varnieri Brito, Vânia Cardoso, Roberto Carvalheiro, Luiz Alberto Fries, Carlos Dario Ortiz Peña, Mario Luiz Piccoli, Vanerlei M. Roso, Flávio Schenkel e Jorge Luiz Paiva Severo1

Populações compostas por animais de diferentes raças e cruzamentos (populações multiraciais) fazendo uso dos efeitos genéticos aditivos e não-aditivos entre raças estão se tornando cada vez mais comuns.

No Brasil, alguns programas de melhoramento genético selecionam os animais com base em avaliações genéticas envolvendo conjuntamente animais puros e cruzados desde os anos 80. Nestas avaliações, procedimentos baseados na metodologia dos modelos mistos, empregando o modelo animal, são utilizados.

As estimativas de valor genético (DEPs) e dos índices calculados com base nas DEPs permitem comparar os animais independentemente da composição racial e das condições ambientais (local) onde eles foram criados/testados.

A possibilidade de fazer uso efetivo da variabilidade genética da população como um todo é uma das principais justificativas para a realização de avaliações genéticas multiraciais.

Modelo genético

O modelo genético que considera os efeitos aditivos de raça e os heteróticos associados à heterozigose entre raças (modelo aditivo-dominante), ainda é o modelo-padrão nas avaliações genéticas multiraciais. A justificativa para o uso deste modelo é baseada na pressuposição de que a heterose ocorre principalmente devido aos efeitos de dominância dos genes, em concordância com os resultados obtidos por Gregory et al. (1997) em condições experimentais nos Estados Unidos.

Estes autores sugeriram que a retenção de heterose é linearmente proporcional à heterozigose em características de desempenho de gado de corte. Neste caso a heterose é modelada como sendo proporcional à heterozigose.

O modelo aditivo-dominante não considera os desvios da associação linear da heterose com a heterozigose, que decorrem das perdas por recombinação (perdas epistáticas). As perdas epistáticas são atribuídas às perdas das combinações favoráveis presentes nos gametas das raças puras, que foram construídas através da seleção dentro de raça ao longo do tempo.

Nos cruzamentos, a expressão das perdas epistáticas é máxima na geração F2 (progênie gerada no acasalamento de touros F1 com vacas F1) e mínima quando um dos pais é puro.

Recentes implementações

Embora em alguns casos o efeito devido às perdas epistáticas possa ser negligenciado sem causar grandes prejuízos às avaliações, resultados de pesquisas realizadas na África (Demeke et al. 2003), Austrália (Arthur et al., 1999; Fries et al., 2000), Brasil (Cardoso, 2004; Carvalheiro et al., 2006; Pimentel et al., 2006; Reyes et al., 2006) e Canadá (Roso et al., 2005a) sugerem que a inclusão dos efeitos epistáticos no modelo utilizado nas avaliações genéticas pode aumentar significativamente a acurácia das predições.

Nos cruzamentos entre zebuínos e taurinos, os estudos realizados no Brasil apontam ainda para a necessidade de considerar os efeitos de complementariedade e interações do genótípo com o ambiente (latitude). O êxito destas implementações, entretanto, depende do uso de métodos estatísticos adequados à estrutura dos dados.

Um problema estatístico importante a ser contornado é a multicolinearidade causada pela dependência linear entre as variáveis preditoras dos efeitos genotípicos. Na presença de multicolinearidade, é difícil separar o efeito de cada variável e as estimativas obtidas pelo método tradicionalmente utilizado nas análises, Método dos Quadrados Mínimos (MQM), são muito sensíveis, instáveis, às mudanças no arquivo de dados, inclusão de novos dados, ou à adição ou deleção de variáveis no modelo.

Para minimizar as conseqüências negativas da multicolinearidade, alguns estudos têm sugerido o uso das regressões de cumeeira (“ridge regression”) como alternativa ao MQM (Fries et al., 2000; Cardoso, 2004; Roso et al., 2005b; Carvalheiro et al., 2006; Pimentel et al., 2006). Nestes estudos as estimativas geradas pelas regressões de cumeeira se mostraram mais estáveis, menores erros-padrão, e puderam ser usadas na predição dos fenótipos com grande vantagem sobre o MQM.

Testes de aplicação das regressões de cumeeira em rotinas de avaliações genéticas multiraciais de larga escala (Roso et al., 2005b) permitiram concluir que, além de aumentar a probabilidade de ranquear adequadamente os animais nas comparações entre raças, as regressões de cumeeira geraram DEPs mais consistentes em sucessivas avaliações genéticas.

Aplicação de novos modelos

Em 2006 as empresas Conexão Delta G e a Natura adotaram novos modelos de análise em suas avaliações genéticas rotineiras. Uma das inovações foi a inclusão dos efeitos de complementariedade, perdas epistáticas e interações do genótipo com o ambiente no modelo aditivo-dominante utilizado até então.

Este aperfeiçoamento contribuiu para aumentar a precisão das avaliações genéticas e possibilitou determinar com maior segurança a composição genética mais adequada às diferentes regiões onde se localizam os rebanhos participantes dos dois programas.

Os resultados das avaliações foram publicados em primeira mão nos sumários de touros Conexão Delta G e Natura 2006. Entre produtos, touros e vacas dos dois programas, aproximadamente 700.000 animais participaram das análises para várias características de interesse econômico.

Referências bibliográficas

Arthur, P. F., Hearshaw H. and Stephenson, P. D. 1999. Direct and maternal additive and heterosis effect from crossing Bos indicus and Bos taurus cattle: cow and calf performance in two environments. Livest. Prod. Sci. 57: 231-241.

Cardoso, V. 2004. Direcionando acasalamentos para maximizar a média do valor genotípico de uma futura safra. Ph.D. Thesis, Universidade Estadual Paulista, Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias, Campus de Jaboticabal, Brasil, 101p.

Carvalheiro, R.; Pimentel, E. C. G., Cardoso, V.; Queiroz, S. A.; Fries, L. A. Genetic effects on preweaning weight gain of Nelore-Hereford calves according to different models and estimation methods. J. Anim. Sci. 84:2925-2933. 2006.

Demeke, S.; Neser, F.W.C.; Schoeman, S.J. Early growth performance of Bos taurus x Bos indicus cattle crosses in Ethiopia: estimation of individual crossbreeding effects. J. Anim. Breed. Genet., v.120, p.245-257. 2003.

Fries, L. A., Johnston, D. J., Hearnshaw, H. and Graser, H. U. 2000. Evidence of epistatic effects on weaning weight in crossbreed beef cattle. Asian-Aust. J. Anim. Sci. 13(Suppl. B): 242.

Gregory, K. E., Cundiff, L. V. and Koch, R. M. 1997. Composite breeds to use heterosis and breed differences to improve efficiency of beef production. Roman L. Hruska U. S. MARC, Clay Center, NE.

Pimentel, Eduardo C. G.; Queiroz, S. A. ; Carvalheiro, R. ; Fries, L. A.. Estimativas de Efeitos Genéticos em Animais Cruzados por Diferentes Modelos e Métodos de Estimação. Revista Brasileira de Zootecnia, Viçosa, v. 35, n. 3, p. 1020-1027, 2006.

Reyes, A.; Elzo, M. A.; Fries, L. A.; Roso, V. M; Carvalheiro, R. 2006. Non-genetic, Additive and non-additive genetic effects for animal model analyses of weaning weights in A Nellore x Hereford multibreed population in Brazil. Proc. 8th World Cong. Genet. Appl. Livest. Prod., Belo Horizonte, Brazil. Communication No 03-77.

Roso, V. M.; Schenkel, F. S.; Miller, S. P.; Wilton, J. W. Additive, dominance, and epistatic loss effects on preweaning gain of crobred beef cattle from different Bos taurus breeds. J. Anim. Sci. 83:1780-1787. 2005a.

Roso, V. M.; Schenkel, F. S.; Miller, S. P.; Schaeffer, L. R. Estimation of genetic effects in the presence of multicollinearity in multibreed beef cattle evaluation. J. Anim. Sci. 83:1788-1800. 2005b.

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1Equipe GenSys.

0 Comments

  1. Silvio Renato Oliveira Menegassi disse:

    A heterose nem sempre é ganho já sabemos quando se faz cruzamentos. A heteroze decorre da combinação de genes presentes no mesmo local do cromossomo. Já a epistasia é um fenômeno de combinação de genes em locus distintos, a que se dá o nome de combinação epistástica, em que um ou outro gene será sobredominante, ou seja, uma verdadeira roleta genética, já dito e aceito pelo próprio Fries. Portanto a loteria de probabilidades dos cruzamentos é imponderável. A utilisação de multiraças portanto deve ter um cuidado muito maior do que o já não cuidado que hoje existe dos simples cruzamentos efetuados erroneamente pelos produtores rurais. Muito cuidado e assistência técnica total deve ser o mínimo exigido para essa loteria que são os cruzamentos.