Por Moacyr B. Dias-Filho 1
Os sistemas silvipastoris são constantemente apontados como a solução para muitos dos problemas inerentes a pastagens no Brasil (principalmente os de origem ambiental). No entanto, na prática, a adoção desses sistemas ainda é relativamente restrita.
Essa discrepância entre as evidências técnicas e a realidade prática sugere a existência de barreiras que estariam dificultando a adoção mais ampla desses sistemas. Analisando as particularidades de diversas regiões pecuárias do País, seria possível classificar essas barreiras em econômicas, operacionais e culturais.
Barreiras econômicas
Estudo recente do Banco Mundial (Pagiola et al., 2004) mostra que uma das principais barreiras para a adoção de sistemas silvipastoris seria a sua baixa lucratividade inicial. A implantação desses sistemas exige maiores investimentos de tempo e dinheiro, os quais diminuiriam a velocidade de obtenção dos lucros.
Por essa razão, nos primeiros anos após o estabelecimento de sistemas silvipastoris, a renda da propriedade rural pode ser menor do que a do sistema tradicional. Isso ocorreria devido aos investimentos iniciais e ao tempo demandado para que as árvores cresçam o suficiente para gerar benefícios financeiros.
A conseqüência desse cenário é a baixa taxa de retorno econômico que comumente caracteriza os sistemas silvipastoris nos primeiros anos após a implantação. Por outro lado, os altos custos iniciais de investimento para implantação desses sistemas seriam também uma barreira para a sua adoção por produtores sem acesso a crédito.
Barreiras operacionais
Quando comparado ao sistema tradicional, a implantação e a manutenção de sistemas silvipastoris requerem mão-de-obra mais capacitada e infra-estrutura mais elaborada (por exemplo, a produção e plantio de mudas, poda das árvores etc.).
Na fase de estabelecimento, as dificuldades operacionais envolvem proteger as árvores contra o excesso de radiação solar e vento, a baixa umidade do ar, o pisoteio e a herbivoria (gado, animais silvestres e insetos-praga), bem como a competição pelas plantas daninhas e forrageiras. Tais práticas de manejo exigiriam maiores investimentos em tempo, mão-de-obra e infra-estrutura, os quais podem desestimular sua adoção ou prejudicar a correta implantação.
Barreiras culturais
O desconhecimento, por parte de muitos produtores, dos benefícios que as diversas espécies arbóreas poderiam, potencialmente, oferecer à propriedade rural, constitui outro obstáculo para a adoção de sistemas silvipastoris.
Outro aspecto restritivo seria a necessidade do domínio de conhecimentos para desenvolver práticas de manejo bem diferentes daquelas tradicionalmente empregadas em sistemas de pastagens convencionais.
Por outro lado, ainda existe a crença, cientificamente infundada, por parte de alguns produtores, que o provimento de sombra aos animais na pastagem, poderia diminuir a produção de carne ou leite. A justificativa para isso seria que o acesso voluntário à sombra reduziria o tempo de pastejo (i.e., aumentaria o tempo dedicado ao ócio) e, conseqüentemente, o consumo de forragem.
Suplantando as barreiras
Dentro da perspectiva do produtor rural, benefícios constantemente atribuídos aos sistemas silvipastoris como aumento da biodiversidade, conservação ambiental e seqüestro de carbono teriam importância apenas marginal. Isso significa dizer que tais benefícios geralmente não seriam considerados quando da decisão do uso da terra.
Tal perspectiva deve ser levada em conta por todos aqueles que promovem a adoção de sistemas silvipastoris. Nesse sentido, a criação de políticas públicas de linhas de crédito seria um importante estímulo. Da mesma forma, o fomento de pesquisas científicas e de difusão de tecnologia seriam essenciais para desmistificar percepções equivocadas e incentivar a adoção desses sistemas.
Outra forma realista de estímulo à adoção de sistemas silvipastoris seria o desenvolvimento de políticas pelas quais os produtores fossem pagos pelos serviços ambientais que gerassem com o uso de práticas silvipastoris. Tal incentivo aliviaria o ônus financeiro assumido pelo produtor e proveria à sociedade os benefícios ambientais advindos dessas práticas.
Análises simplistas que somente exaltam as vantagens dos sistemas silvipastoris, ou que vêem na seleção de espécies (forrageiras e arbóreas) os principais problemas a serem superados, não servem à causa de promover o uso dessa técnica.
O reconhecimento das verdadeiras dificuldades para a adoção desses sistemas e a busca responsável de soluções realistas para suplantar essas barreiras, seriam certamente estratégias muito mais frutíferas. Enquanto não houver essa conscientização, principalmente por parte de técnicos e pesquisadores, os sistemas silvipastoris continuarão a ser uma alternativa de manejo exaltada por muitos, porém, adotada por poucos.
Literatura citada
Pagiola, S., Agostini, P., Gobbi, J., de Haan, C., Ibrahim, M., Murgueitio, E., Ramírez, E., Rosales, M., Ruíz, J. P. Paying for biodiversity conservation services. In: Environment Department Papers. Washington: World Bank, 2004. 37p. (World Bank. Environmental and Economic Series, 96).
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1 Moacyr B. Dias-Filho, Engenheiro Agrônomo, M.Sc. em Pastagens pela ESALQ/USP e Ph.D. em Ecofisiologia Vegetal pela Cornell University e pesquisador da Embrapa Amazônia Oriental, Belém, PA.