Por Marcia Dutra de Barcellos1
Na Austrália, os Centros Cooperativos de Pesquisa (CRCs) foram criados com a finalidade de unirem pesquisadores e potenciais usuários das pesquisas geradas. O programa tem como ênfase arranjos colaborativos que possam maximizar os resultados das pesquisas através de um processo de utilização, comercialização e transferência de tecnologia. Os CRCs também possuem um elevado componente educacional, estimulando alunos de graduação e pós-graduação a desenvolverem habilidades de interesse para a indústria da Austrália.
Existem aqui diversos CRCs, nas mais variadas áreas, tais como Tecnologia de Informação, Mineração e Energia, Meio Ambiente, Ciências Médicas e Agricultura.
Em Dezembro de 2004, o Mistério da Educação, Ciência e Treinamento da Austrália anunciou a renovação do CRC de carne bovina (CRC for Beef Genetic Technologies), através do financiamento de $30 milhões de dólares australianos (em torno de R$ 51 milhões) nos próximos 7 anos. Os fundos previstos pelo governo servirão para alavancar um orçamento total de $122 milhões de dólares australianos do novo CRC Beef Genetics Technologies, no período compreendido entre 2005 a 2012.
O Beef CRC foi desenvolvido através de uma parceria que envolve membros da indústria da carne bovina (Cattle Council of Austrália, Meat and Livestock Australia, Australian Lot Feeders´ Association, produtores individuais e corporativos de carne bovina) e instituições nacionais e internacionais de pesquisa científica.
O programa global envolve cerca de 19 organizações parceiras da Austrália, Nova Zelândia, Coréia e Estados Unidos, e parceiros associados da Irlanda do Norte, República da Irlanda, França e África do Sul.
O lançamento do novo Beef CRC ocorreu no dia 13 de Dezembro de 2005, na Universidade de New England, em Armidale, New South Wales Austrália, com a presença maciça dos dirigentes da organização e membros da indústria da carne bovina Australiana.
Um projeto ousado, mas que já apresenta sinais de que seus objetivos serão cumpridos, haja vista o comprometimento e seriedade com que o assunto é encarado no país. A indústria da carne na Austrália está com o seu planejamento estratégico para os próximos anos já em andamento, e entre as vantagens competitivas que apresenta, encontra-se a união dos diferentes agentes da cadeia em prol de uma idéia comum.
O trabalho do Beef CRC será baseado em quatro questões prioritárias para a indústria da carne: (1) Produção de carne de qualidade; (2) Aumento da eficiência alimentar; (3) Resistência à doenças e (4) Melhora da performance reprodutiva.
Através das descobertas e pesquisas sobre expressão genética, e adoção rápida de tecnologias pela indústria da carne bovina, objetiva-se melhorar a rentabilidade, produtividade, bem-estar animal e utilização responsável dos recursos do agronegócio da carne bovina na Austrália.
Os resultados obtidos permitirão que a Austrália possa produzir carne bovina com consistência de qualidade, atendendo as especificações dos seus consumidores domésticos e do mercado externo. Atualmente, a Austrália exporta carne para 110 países, entre os quais estão alguns dos países mais exigentes do mundo em termos de segurança alimentar e qualidade, como o Japão, por exemplo.
A carne bovina para exportação é o produto agrícola mais valorizado na agricultura da Austrália. Com apenas 2,5% da população bovina mundial, a Austrália é responsável por 23% do comércio mundial de carne.
O novo Beef CRC prevê um aumento de 1,5% ao ano na receita bruta da indústria da carne australiana. Os benefícios totais esperados das pesquisas do CRC são estimados em mais de $2 bilhões de dólares australianos, nos próximos 25 anos.
Assim, o novo Beef CRC possui quatro programas científicos, descritos sucintamente a seguir, que são divididos de acordo com os resultados esperados para a indústria para o ano de 2012:
Programa 1: Carne Bovina de alta qualidade para Consumidores Globais
-Espera-se que em 2012 10% dos reprodutores terão avaliação genética através de testes múltiplos de DNA, o que causará um incremento no rendimento da carcaças, marmoreio e maciez da carne bovina;
– Em 2012, espera-se que haja um aumento de 20% na quantidade de animais que atingem as especificações de mercado, através da melhoria concomitante dos rendimentos. Melhoras operacionais, ambientais e na eficiência produtiva na cadeia de suprimentos serão grandes responsáveis por estes resultados;
– Em 2012, modelos de predição da palatabilidade, customizados para mercados internacionais, serão utilizados em pelo menos dois parceiros chave da Austrália;
Programa 2: Eficiência Alimentar, Produtividade Materna e Uso Responsável dos Recursos
– Em 2012, os custos de alimentação do rebanho nacional serão reduzidos na ordem de $ 15.5 milhões de dólares australianos por ano, sem impacto no ganho de peso, através do ganho genético na eficiência alimentar obtido através do uso de sêmen e inseminação artificial;
– Aumento da eficiência no rebanho de cria (kg de bezerro/ energia por unidade de vaca e bezerro em MJ);
– Previsão para 2012 de redução de 20% na emissão de metano em gado de corte.
Programa 3: Adaptação e Bem-Estar Animal
-Em 2012, os efeitos combinados do controle de custos para redução de parasitos, e melhorias de produtividade através do uso de animais adaptados e aumento do bem-estar animal vão aumentar a recita bruta anual da indústria da carne em $43 milhões de dólares australianos.
Programa 4: Eficiência Reprodutiva da Fêmea
– Aumento de $ 46,5 milhões de dólares na indústria da carne bovina Australiana graças ao aumento da performance reprodutiva do rebanho de cria devido a redução da idade de entoure (e inseminação).
Os programas propostos pelo Beef CRC da Austrália, executados em parcerias entre as empresas, governos e universidades de diversos países, nos dão um exemplo de organização e foco na cadeia produtiva da carne. Os consumidores, agradecem.
Vale a pena também dar uma boa navegada pela Biblioteca Virtual (www.livestocklibrary.com.au), gratuita, onde informação acadêmica de alta qualidade é divulgada, bastando apenas um pequeno e rápido cadastro no site.
Maiores informações sobre o Beef CRC também podem ser obtidas através do website www.beef.crc.org.au.
_________________________________
1Marcia Dutra de Barcellos, Médica Veterinária, Mestre e Doutoranda em Agronegócios, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Centro de Estudos e Pesquisas em Agronegócios, atualmente na University of New England, Meat Science Department – Armidale, Australia
0 Comments
Márcia
Realmente os australianos estão investindo pesado, já há algum tempo, no que se refere ao atendimento das exigências dos importadores de carne, especialmente o Japão. Praticamente toda a pesquisa feita em gado de corte atualmente na Austrália é voltada para o que o Japão exige e, conseqüentemente, aumentar as exportações para aquele país e a receita gerada pela exportação.
Entretanto, me admira os australianos estimarem que já em 2012 terão tantas vantagens advindas do melhoramento genético e avaliação de DNA dos reprodutores, visto que, para isso é necessário contar maciçamente com a inseminação artificial, tecnologia que os australianos utilizam muito pouco. Na Austrália não há sequer dados sobre que percentagem do rebanho de corte é inseminado, devido principalmente às sérias limitações climáticas desse país.
Queria deixar apenas esse comentário.
Parabéns e um abraço do teu amigo Bernardo
Querido amigo Bernardo e leitores do BeefPoint,
Em primeiro lugar gostaria de agradecer teu contato, é muito bom poder trocar idéias e aprender mais com isso.
A resposta demorou, pois somente hoje obtive em mãos o documento que explica a metodologia usada pelo CRC para fazer as previsões econômicas do projeto.
Na verdade, o projeto CRC for Beef Genetic Technologies conta com investimentos já realizados em Pesquisa, Desenvolvimento e Extensão, além da tecnologia genética utilizada no passado. Assim, segundo a proposta, “o Beef CRC não seria implantado no vácuo”, i.e, tem um passado importante.
Em relação a metodologia usada, o grupo de pesquisa optou por uma abordagem “top-down”, onde taxas médias de melhoria de produtividade são analisadas e o papel da mudança tecnológica gerada quando aumenta-se a produtividade é identificado. Posteriormente, a partir da opinião de especialistas, procura-se estabelecer qual seria o potencial de aumento da produtividade em função do CRC e os benefícios esperados.
Eles utilizaram um programa para a análise de custo-benefício que se chama DREAM (Wood et al., 2001), bastante respeitado pelos especialistas na área.
Assim, a Inseminação Artificial não é a base do programa, mas sim uma das ferramentas já utilizadas e ponderadas pelo sistema.
Encaminharei o artigo original para ti e para a equipe BeefPoint.
Se tiveres outras dúvidas, por favor me avisa, que podemos discutir e ou encaminhá-las para os pesquisadores aqui do CRC.
Um grande abraço e obrigada
Márcia