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Beef Quality Conference, Edimburgo, Escócia

Por Leonardo Prandini1

Foi sediada em junho em Edimburgo (Escócia) a primeira conferência de qualidade da carne bovina, promovida pelo IMS (International Meat Secretariat) em parceria com o QMS (Quality Meat Scotland). Participaram representantes de 23 países e profissionais de toda a cadeia produtiva. Foram apresentadas as referências de cada país sobre qualidade da carne e o desenvolvimento de padrões e certificações como instrumento de agregação de valor ao produto.

A rede de supermercados Tesco International foi representada por Andrew Smith, que apresentou o atual perfil do fornecimento e venda de carne da empresa para Ásia e Europa continental – totalizando 641 lojas, a terceira maior rede varejista do planeta.

Foi comentado que, ao importar carne de outros continentes, a rede visa assegurar a disponibilidade do produto uma vez que a produção na Ásia e Europa é insuficiente para abastecer a demanda. A rede, entretanto concentra esforços em exigir que toda a carne comercializada pelo grupo seja produzida compulsoriamente aos padrões da Grã-bretanha, país natal da empresa. Isso envolve a coordenação da cadeia de suprimento, certificação de propriedades e frigoríficos (certificados Europegap e British Retail Consortium), e o estabelecimento de métodos de controle de classificação de carcaça e rastreabilidade consistentes. Os requisitos baseam-se na crescente demanda por carne vermelha na Europa e Ásia em termos de volume e especificações de qualidade. O objetivo e desenvolver processos de controle de pontos críticos para continuamente elevar a qualidade do produto, desde a fazenda até a prateleira.

Charles Ling, da Angliss International, discursou sobre o mercado chinês de carne bovina. A capacidade limitada da indústria local não supre a crescente demanda por carne bovina, que entre toda a gama de carnes consumida no país, passou de 2% em 1980 para 9% em 2002. A indústria local evolui rapidamente, entretanto expressou-se a dependência do país nas importações a longo-prazo, com grandes oportunidades para carne de alta qualidade nos setores de varejo e ´foodservice´.

O secretario de serviço de marketing agrícola do USDA, Barry Carpenter, apresentou o sistema de classificação de qualidade adotado nos EUA, que se baseia na perspectiva do consumidor norte-americano – o ´marbling´ da carne. O programa estabeleceu standards de classificação de carcaça e certificação através de métodos que agregam valor econômico ao produto.

Nos frigoríficos, são empregados sistemas eletrônicos para avaliação da carcaça e de cortes, analisando os percentuais de gordura entrelaçados na carne e classificando-os em uma escala. O produto obtém certificação de acordo com o nível de qualidade conferido, estabelecendo padrões para pagamento de prêmio e precificação justos para pecuarista, frigorífico e consumidor. O uso da classificação é voluntário e pago.

Segundo o USDA, as oportunidades estão em agregar valor a cortes de baixo valor, realçar o uso de cortes macios e estimular o consumo de carne de forma inovadora.

Charlotte Malting, do QMS, discutiu que a qualidade da carne produzida é sempre muito variável. Influente na palatabilidade, a textura do produto oscila de acordo com fatores de origem animal (raça, sexo, maturação, stress, etc) e métodos de processamento (pH, temperatura, estimulo elétrico, suspensão da carcaça, etc), o que afeta também a suculência e a maciez da carne.

Níveis de variabilidade são reduzidos na produção animal e no processamento através de métodos de ´melhores práticas´ adotados na indústria escocesa, estabelecidos como requisitos básicos para o selo ´Scotch Beef´.

Também representando os Europeus, Isabelle Peutz – responsável pela política de qualidade de produtos agrícolas da União Européia – falou sobre a regulamentação de itens que controlam a qualidade e retém o valor de produtos europeus. Uma ferramenta usada pela agroindústria européia e o PDO (protected denomination of origin) e o PGI (protected geographical indication).

Estes certificados funcionam como uma patente que assegura a exclusividade de produção e faz referência a região geográfica onde é produzido. O objetivo é agregar valor e competir, com distinção, com produtos importados. O ´Scotch Beef´ é um PDO, em que o pecuarista recebe um prêmio pelo gado padronizado (de 5 a 10% a mais que o preço normal) e o produto e posicionado na mais alta faixa de preço do mercado – até três vezes mais que o produto brasileiro em um supermercado convencional.

O INAC, do Uruguai, participou com uma excelente apresentação do seu programa de qualidade e certificação de carne bovina. A campanha ´Uruguay Certified Natural Beef´ baseia-se na garantia de origem do produto estabelecendo padrões através da integração de produtores, frigoríficos e varejistas.

O programa assegura a consistência da marca e do produto através do uso de um sistema de rastreabilidade confiável, comunicação de atributos (animais criados a pasto, livre de hormônios, antibióticos ou ração de proteína animal), assegurados por um selo exclusivo de origem e garantia atribuído pelo programa de verificação de processos do USDA.

Da Austrália participou Terry Nollan, descrevendo o que esta por trás do ´Meat Standards Australia´ (MSA). O programa visa, através da graduação da qualidade de cortes, definir padrões de qualidade internacionalmente e estimular o consumo de carne bovina.
Iniciado em 1997, o MSA desenvolve e estimula ´melhores práticas´ para a produção de carne e promoção através de certificação. Promove também a elevação de standards de qualidade através de continua pesquisa e desenvolvimento (P&D), treinamento e aplicação de tecnologia. O princípio é adicionar valor ao produto. O programa usa a inovação e o marketing como essência para atrair novos consumidores para a carne bovina. O MSA é baseado na definição de sistemas, é voluntário, é forte em integridade e flexível, adaptando-se as tendências do consumo orientados pelo P&D.

E como é garantida a qualidade da carne no prato do consumidor? Através do controle de fatores determinantes da palatabilidade e de CCP (controle de pontos críticos) aplicados a toda a cadeia. Isto inclui atenção com a idade do gado para abate, o percentual de sangue Bos Indicus, o pH e temperatura no abate, o corte, suspensão da carcaça, maturação e métodos de preparo.

Não se pode controlar todos estes fatores, entretanto os frigoríficos podem influenciar processos críticos como o manejo pré-abate – o que inclui evitar que o animal caminhe grandes distâncias e sofra stress no transporte – para equilibrar o pH dos músculos; e pós abate como o uso de estímulos elétricos, a refrigeração gradual, e suspensão da carcaça pela anca.

Este foi um evento inovador que discutiu os padrões de qualidade internacionalmente e os meios para alcançá-los. Mesmo sendo uma commodity, a competitividade da carne bovina tende a ser alcançada por aqueles que atingirem os padrões de qualidade estabelecidos nos mercados consumidores mais exigentes (EU, Japão e EUA).

Isso hoje é um meio de estabelecer vantagem competitiva, possivelmente tornando-se um pré-requisito em longo prazo no acirrado comércio internacional de produtos agrícolas.

Pode-se observar, entretanto, que o sistema de rastreabilidade e classificação de carcaça são fundamentais para desenvolver a integridade do produto bovino, o que é explorado pelos concorrentes como o ponto mais vulnerável da carne brasileira.

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1Leonardo Prandini é administrador de empresas e atualmente cursa mestrado em Agribusiness Management no Scotland Agricultural College, em Aberdeen, Escócia

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