Fornecimento e consumo de misturas minerais em pastagens: parte 2
14 de março de 2005
SIC ensina como comprar carne corretamente
16 de março de 2005

BQA – qualidade total na produção de carne

Desde seu surgimento há cerca de vinte anos atrás, o Beef Quality Assurance (BQA) tem sido uma ferramenta importante para a melhoria da qualidade e da segurança da carne bovina produzida nos EUA. Como o próprio nome diz, esse programa consiste de uma série de medidas que visam “assegurar a qualidade da carne”. Ao implementar essas medidas, todos os envolvidos na cadeia da carne assumem responsabilidade na produção de um produto diferenciado, através de um manejo adequado. Desde sua criação, o BQA tem se espalhado por quase todo os EUA. Os Estados participantes têm seu próprio programa regional, adaptando-o para suas condições, dependentes de diferentes sistemas de produção e comercialização.

O que é o BQA?

O BQA é um conjunto de normas desenvolvidas pelo NCBA – National Cattlemen’s Beef Association (Associação de produtores de gado de corte dos EUA) – em conjunto com diversas universidades americanas, com o intuito de combater os principais problemas da indústria da carne americana. Essas normas estão baseadas em problemas de alto impacto econômico, como por exemplo, a grande quantidade de lesões nos cortes de maior valor decorrentes de injeções por via intramuscular na parte posterior do animal.

Outros problemas com impacto econômico também enfocados pelo programa incluem o excesso de gordura das carcaças, o tamanho inconsistente dos cortes de carne, a desuniformidade do gado abatido e a contaminação por patógenos.

As normas do BQA (as chamadas “Beef Quality Assurance National Guidelines“) são repassadas a todos os envolvidos na cadeia da carne – desde os pequenos produtores, maiores confinamentos, até aos frigoríficos – através de treinamentos oferecidos pelo NCBA, veterinários credenciados pelo BQA e por extensionistas de universidades ligadas ao BQA.

O BQA possibilitou a união de esforços entre cientistas, produtores de ração, empresas de sanidade animal, frigoríficos e governo no uso das mais recentes descobertas científicas e avanços tecnológicos disponíveis para atender as expectativas dos consumidores em termos de qualidade e segurança da carne.

Como funciona?

Assim como todos os programas baseados nos programas HACCP, o BQA requer um acompanhamento detalhado do sistema de produção. Na atividade pecuária, alguns pontos de controle foram identificados (por exemplo, a compra de ingredientes, as vacinações, e o transporte do gado) e neles foram implementadas as normas do BQA.

Por exemplo, quando um confinamento dentro das normas do BQA recebe uma carga de grãos, todos os cuidados possíveis são tomados para a prevenção de problemas relacionados com “mofo”, micotoxinas, ou resíduos químicos. Alimentos suspeitos deverão ser analisados antes de fornecidos aos animais. Esse confinamento também não poderá utilizar qualquer fonte de proteína proveniente de ruminantes e deverá utilizar somente produtos aprovados pelo FDA nas dietas dos animais. Para propriedades com animais em sistemas de pastejo, um exemplo de norma do BQA é a exigência de um registro de informações sobre o uso de qualquer pesticida ou herbicida usado nas pastagens, e que possam potencialmente deixar resíduos na carne.

Nas normas do BQA, medicamentos injetáveis devem ser administrados apenas na região do pescoço. Esses tipos de produtos causam lesões nos tecidos quando administrados por via intramuscular. É também recomendado que não mais que 10 ml de qualquer produto deva ser administrado no mesmo lugar de injeção. Outras normas do BQA sugerem que todos os animais deveram ser manejados e transportados de uma maneira que se minimize qualquer forma de estresse, lesões, ou hematomas. Todas as instalações devem ser constantemente fiscalizadas e devem garantir o bem estar animal. Para a validação dessas e de todas as normas implementadas, o BQA sugere o estabelecimento de sistemas de controle de informações na propriedade.

Avaliação dos resultados

Os resultados da implantação do BQA têm sido avaliados há vários anos através de diversas “auditorias” (os NBQA – “National Beef Quality Audits“) coordenadas por pesquisadores renomados, provenientes de instituições de respaldo na área de ciências da carne, como a Texas A&M University e a Colorado State University. Nos anos em que os NBQA são realizados, são também realizados workshops onde os dados obtidos são apresentados, discutidos e, baseando-se nos mesmos, são definidos pontos a receberem um maior enfoque pelo BQA.

O primeiro NBQA, realizado em 1991, mostrou que a indústria da carne ainda tinha um longo caminho a percorrer. Animais abatidos ainda apresentavam excesso de gordura, eram enviados para abate em grupos muito heterogêneos e a carne produzida ainda estava muito “dura” para ser competitiva. Resultados iniciais mostraram que lesões decorrentes de injeções em locais inadequados, por exemplo, estavam causando perdas de aproximadamente 188 milhões de dólares por ano. Os NBQA seguintes mostraram avanços supreendentes, comprovando que a concomitante expansão do BQA ajudou na redução de diversos problemas anteriormente observados. Os NBQA mais recentes, por exemplo, mostram que os resíduos químicos quase que desapareceram completamente da carne de bovinos confinados.

Os produtores também estão ganhando com essa melhoria na qualidade do produto final. Entre os NBQA realizados nos anos de 1991 e 1995, o confinador reduziu sua perda por animal de US$ 280,00 para US$ 276,59.

Metas

O BQA tem trazido resultados positivos para o produtor de carne americano, porém ainda há potencial para mais. Ainda hoje muita ênfase tem sido dada à implementação do BQA em propriedades que ainda não aderiram ao programa ou mesmo à atualização de normas e informações nas propriedades que já o utilizam. É que hoje, mais do que antes, têm se dado maior ênfase à confiança do consumidor na carne consumida.

Para os americanos nesse período de “medo da vaca louca”, a confiança na segurança da carne afeta a decisão de compra. Os princípios do BQA têm sido reforçados em frequentes treinamentos, visando melhorar mais e mais o produto final, garantindo a confiabilidade do consumidor e garantindo também a expansão do mercado interno e até dos mercados de exportação.

O NBQA de 2000 estabeleceu para 2005 as seguintes metas (para animais terminados em confinamento):
– Eliminar os “USDA Standards” (gado de classificação inferior no sistema americano);
– Eliminar os “Yield Grades” 4 e 5 (gado de classificação inferior no sistema americano);
– Eliminar lesões decorrente de injeções IM em cortes de músculos inteiros, incluindo músculos do pescoço;
– Eliminar problemas no couro decorrentes de marcação a ferro;
– Reduzir animais com chifre para menos de 5% do rebanho de animais confinados;
– Desenvolver um sistema de identificação animal eletrônico padronizado;
– Desenvolver um sistema de informações que permita aos produtores conduzir um controle de qualidade próprio;
– Assegurar que 100% do gado de centrais estejam acompanhados de informações sobre sua genética (DEPs, etc.) para características de carcaça;
– Assegurar que 100% dos pecuaristas façam o treinamento do BQA;
– Eliminar problemas críticos de hematomas;
– Melhorar o transporte de gado;
– Melhorar continuamente a qualidade da carne bovina;

Um BQA brasileiro?

Um programa de qualidade como o BQA pode servir como exemplo de algo a ser desenvolvido para a realidade brasileira. Se a carne brasileira for produzida seguindo normas similares às do BQA, assegurando melhor qualidade do produto final brasileiro, o mercado consumidor poderá potencialmente se expandir. O desenvolvimento de um “BQA Brasil” pode potencialmente aumentar o nível de confiança do mercado internacional no nosso produto. A garantia de uma carne brasileira produzida dentro de um rígido sistema de qualidade irá assegurar o fornecimento de um produto diferenciado. Dessa forma, o Brasil poderá assegurar a produção de um produto padronizado, de qualidade diferenciada, e conquistar um espaço definido no mercado internacional.

Bibliografia consultada

Dexter, D. R., G. L. Cowman, J. B. Morgan, R. P. Clayton, J. D. Tatum, J. N. Sofos, G. R. Schmidt, R. D. Glock, and G. C. Smith. 1994. Incidence of injection-site lesions in beef top sirloin butts. J. Anim. Sci. 72:824-827.

Improving the Quality, Consistency, Competitiveness and Market-Share of Fed-Beef. The Final Report of the Third Blueprint for Total Quality Management in the Fed-Beef (Slaughter Steer/Heifer) Industry National Beef Quality Audit – 2000. Texas A&M University, Colorado State University, Oklahoma State University, West Texas A&M University

Roeber, D.L., P.D. Mies, C.D. Smith, K.E. Belk, T.G. Field, J.D. Tatum, J.A. Scanga, and G.C. Smith. 2001. National market cow and bull beef quality audit – 1999: A survey of producer-related defects in market cows and bulls. J. Anim. Sci. 79:658-665

Smith, G. C., J. W. Savell, H. G. Dolezal, T. G. Field, D. R. Gill, D. B. Griffin, D. S. Hale, J. B. Morgan, S. L. Northcutt, and J. D. Tatum. 1995. Improving the quality, consistency, competitiveness and market-share of beef. The Final Report of the National Beef Quality Audit – 1995. National Cattlemen’s Association, Englewood, CO.

Taylor, R. E. and T. G. Field. 1999. 3rd Ed. Herd Health. In: Beef Production and the Beef Industry. pp. 415-498. Prentice-Hall, Inc., Upper Saddle River, New Jersey

0 Comments

  1. Bruno Candia Nunes da Cunha disse:

    Grande Dr. Judson!

    Meus parabens pelo artigo, gostei muito.

    Abraco,

    Bruno C. N. Cunha

  2. Vanusa Quissada Gimenez disse:

    Parabéns pelo artigo Judson. Gostei muito.

    Vanusa Quissada Gimenez
    Controle de Qualidade
    Frigorífico Margen Ltda

  3. Luiz Henrique Gomes da Silva de Rezende disse:

    Msc Judson Vasconcelos, meus parabéns pelo artigo e sucesso na sua vida profissional.