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Brasil, Argentina e aftosa

Por Otávio Lemos de Melo Celidonio e Paulo José Araripe Costa1

A pouco tempo a febre aftosa nos surpreendeu novamente. Desta vez a surpresa não foi tão desagradável para nós brasileiros, pois o foco detectado veio dos “nuestros hermanos” da Argentina. Afinal comércio é comércio, e as vezes o azar dos outros é que nos alimenta, principalmente na agropecuária, onde furacões e secas mudam de um dia para outro a oferta de produtos, e logo os preços do mercado.

Particularmente achamos péssimo ter ocorrido esse foco na Argentina. Primeiro porque nossa situação financeira não deve mudar muito em função do ocorrido, mas principalmente, porque a desgraça deles diminui o sentimento de culpa do nosso governo. Quando a situação ficou generalizada ao continente, o nosso status mudou do de um país incompetente para o de um país que sofreu com uma fatalidade. Porém, cá entre nós, sabemos que descaso é a palavra que resume o fato.

A postura das autoridades sanitárias argentinas foi no mínimo interessante, pois aprovou o abate e o consumo dos animais com febre aftosa. Essa atitude foi corajosa, não porque existam problemas de transmissão para o homem, o que realmente é muito raro e quando ocorre se dá pelo contato direto com animais infectados, mas porque é uma afronta às regras de comércio internacional estipulada pelos países ricos, fazendo com que a população desses países saibam que o embargo tem um apelo comercial forte.

Não estou dizendo aqui que não devemos mais vacinar o nosso gado, seria uma heresia dizer isso, pois apesar da febre aftosa raramente matar animais adultos (menos de 3% morrem), nos animais jovens a situação não é a mesma, já que cerca de 50% dos infectados morrem. Além disso, a produção de leite cai cerca de 40%, o peso dos animais adultos cai cerca de 11% e o dos animais jovens cerca de 20%.

Ou seja, se a vacina permite um controle de mais de 99% dos casos da doença, e um animal é vacinado pelo menos 3 vezes durante sua vida, cada vacinação teria que custar mais de 0,5 arroba por animal para não compensar vacinar, isso sem levar em consideração os custos para se tratar um animal doente e a queda no preço nominal da arroba.

E o problema não pára por aí, pois outro fato importante é a velocidade com que a febre aftosa se alastra. A doença é transmitida pelo contato com animais doentes ou pelo ar; há trabalhos que mostram que o vírus da febre aftosa pode se deslocar por mais de 60 quilômetros e que, para infectar uma vaca adulta, são necessários apenas 10 desses organismos.

Além disso, quando a imunização do rebanho não é feita, a taxa de infecção deste é próxima a 100%, isso porque a principal fase de produção e disseminação do vírus é nas primeiras 72 horas após a infecção, fase em que o animal ainda não apresenta os sinais clínicos da doença.

Há ainda um detalhe que deve ser frisado, o Brasil nunca será um país livre da aftosa sem vacinação, isso porque essa doença atinge um largo espectro de animais, a exemplo de todos os biungulados (como bovinos, ovinos, suínos e até alguns silvestres como veados) que são atingidos pela febre aftosa, e muitos outros animais como pássaros e ratos, que podem ser vetores da enfermidade. Some-se a isso o fato do vírus ter um índice de sobrevivência alta (1 a 20 semanas) em ambientes naturais como pastagens.

Mas vamos lá, como nada vem de graça (aliás já perdemos mais de 150 milhões de dólares com essa brincadeira) e nem sendo por motivos comerciais, econômicos ou zootécnicos que os pecuaristas se atentam para o controle da febre aftosa, o governo tem a obrigação de, não só fazer campanhas para incentivar a vacinação, mas também de criar um sistema de fiscalização eficiente para, pelo menos, garantir a segurança do “gordo dinheiro” que vem dos impostos de exportação de carne.

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1Otávio Lemos de Melo Celidonio e Paulo José Araripe Costa, Projepec – Projetos & Consultoria Agropecuária

0 Comments

  1. Francisco Pereira Neto disse:

    Olá pessoal, um grande abraço aos leitores deste site.

    Sou formado pela FMVZ – UNESP de Botucatu há mais de 25 anos e trabalho com Defesa Sanitária Animal há 15, na Coordenadoria de Defesa Agropecuária (CDA) da SAA do Estado de São Paulo.

    Meu mestre em Enfermidades Infecciosa, já falecido, Dr. Walter Maurício Corrêa, seguramente a maior competência na área que já existiu nesse país, cita em seu último livro vetores sim. Como pesquisador ele deve citar esses dados. Desconheço nesses anos, todos de quase 26 anos de formado e mais a experiência em defesa sanitária animal, ter visto relatado, lido e comprovado a ocorrência de surto de F. Aftosa provocado por vetores.

    Epidemiologicamente, os outros fatores são muito, mas muito mais importantes do que aqueles, como se fosse uma distância da Terra ao Sol. Como ficam os EUA e Canadá, que há mais de décadas erradicaram a doença, com relação às aves migratórias que voam do hemisfério norte para o sul, com rotas migratórias já estudadas e definidas para a América do Sul, principalmente Brasil e Argentina? Eles estariam com certeza no “mato sem cachorro”. Não vamos colocar mais lenha na fogueira do que já tem. Não vamos dar uma de Roberto Requião!

  2. Carlos Hermida disse:

    La Argentina procedió al uso del rifle sanitario y enterramiento en el propio campo.

    Se sacrificaron 4098 vacunos, 235 caprinos y 5 cerdos que eran el 100 % de los animales susceptibles presentes.