O Brasil pode perder US$ 1,3 bilhão em exportações de carne bovina e outros produtos da cadeia pecuária apenas no segundo semestre de 2025 caso a sobretaxa de 50% dos Estados Unidos seja confirmada a partir de agosto, estima a Associação Brasileira de Frigoríficos (Abrafrigo). Ao longo de 2026 e dos anos seguintes, as perdas podem ser de, ao menos, US$ 3 bilhões anualmente.
As projeções têm como base o desempenho das exportações de carnes e subprodutos bovinos do Brasil aos EUA no primeiro semestre, que somaram US$ 1,287 bilhão. Nos cálculos da entidade, a taxação anunciada por Donald Trump pode gerar saltos de 111% a 384% no valor dos impostos pagos por tonelada desses itens, o que inviabilizaria as vendas aos americanos e resultaria em prejuízo à balança comercial brasileira.
Os cálculos da Abrafrigo consideram embarques de cortes de carne bovina desossados congelados (149,4 mil toneladas e US$ 737,8 milhões), sebo bovino (230,2 mil toneladas US$ 248,7 milhões), preparações alimentícias e corned beef ou carne enlatada (23,4 mil toneladas US$ 239,1 milhões), carnes bovinas desossadas frescas ou refrigeradas (7 mil toneladas e US$ 53 milhões), carnes bovinas salgadas, secas ou defumadas (1,2 mil toneladas e US$ 7,7 milhões), tripas e rabos. A receita total foi quase o dobro da obtida no mesmo período de 2024 e o volume embarcado cresceu 85,4%.
A avaliação de Paulo Mustefaga, presidente da Abrafrigo, é que a taxação americana afetará essa cesta de produtos, e não só a carne bovina em si. Há uma preocupação especial com o sebo bovino, cujos embarques para os EUA representam quase 100% do mercado atual.
Para calcular o impacto total, a entidade considerou o preço médio de exportações desses itens, volumes e receitas obtidos nos últimos seis meses, e simulou a aplicação das tarifas de 50% no restante de 2025 e nos anos seguintes.
No caso das carnes desossadas, frescas, refrigeradas ou congeladas, a Abrafrigo relatou que o Brasil participa de uma cota de 65,8 mil toneladas distribuídas entre vários países. Só no primeiro semestre de 2025, no entanto, os frigoríficos brasileiros enviaram volume equivalente a 2,5 vezes o total da cota, com quase 150 mil toneladas, o que mostra que a maior parte paga tarifa extra-cota. No caso da carne em conserva e do sebo não há cota tarifária.
A carne desossada congelada exportada aos EUA paga atualmente uma tarifa extra-cota de US$ 1,78 mil por tonelada, o que representa 36% dos preços médios FOB. Com a tarifa adicional de 50%, o montante passaria para US$ 3,75 mil de imposto de importação por tonelada, alta de 111%. A tarifa final seria equivalente a 76% do preço da carga, o que inviabilizaria o comércio.
No caso do sebo bovino fundido, a tarifa passaria de US$ 151 por tonelada para US$ 583, alta de 286%. O valor representaria 54% dos preços médios. Em relação às preparações alimentícias e conservas bovinas, a tarifa sairia de US$ 1 mil por tonelada para US$ 5,1 mil por tonelada, alta de 384%, equivalente a 50,4% dos preços médios.
Segundo Mustefaga, as novas tarifas, com peso ainda maior sobre os preços finais dos produtos, impedem a comercialização. Com isso, a expectativa de exportar mais US$ 1,3 bilhão nos seis meses finais de 2025 pode não se concretizar. Se o ritmo das exportações fosse mantido em 2026, a projeção do setor seria vender ao menos US$ 3 bilhões aos EUA, considerando os mesmos patamares de preços.
“Quem paga essa tarifa é o importador. Ele não consegue colocar a carne congelada brasileira com 76% do seu valor em impostos, que teriam que ser repassados aos consumidores”, disse Mustefaga. Com isso, alguns importadores americanos já pediram para os frigoríficos suspenderem a produção. Quase 60 estabelecimentos são habilitados a exportar carne bovina e derivados aos EUA hoje.
No acumulado deste ano, os EUA representam quase 15% das receitas obtidas pelo Brasil com as exportações de carnes desossadas congeladas, resfriadas ou enlatadas. Em relação ao sebo, os americanos representaram 99,6% do faturamento obtido na exportação.
“A carne industrializada e o sebo bovino são muito representativos. A carne enlatada tem poucos mercados alternativos, e os EUA são muito importantes”, disse Mustefaga. Segundo ele, o preço pago pelo produto é um diferencial. “Eles pagam mais de US$ 10 mil por tonelada, cerca de 40% a mais que outros destinos”.
Na visão do dirigente, a inviabilização das vendas aos EUA pode afetar outros mercados onde os americanos têm influência, como o México e o Canadá. “Os prejuízos podem ser ainda maiores”, disse. Ele participou da reunião com o governo e demais cadeias exportadoras na terça-feira. E disse que confia na capacidade do vice-presidente, Geraldo Alckmin, de liderar o processo e conseguir reverter a tarifa.
Fonte: Globo Rural.