Trump elogia McDonald’s numa altura em que disparam os preços da carne nos Estados Unidos
18 de novembro de 2025

Caos na Indústria da Carne dos EUA: Por que o Mercado Está Travado e por que Política Não Resolve

A indústria da carne bovina nos Estados Unidos vive um momento descrito pelos próprios especialistas como “caótico”. Falta de oferta, demanda forte e — para piorar — interferência política têm pressionado todos os elos da cadeia, dos pecuaristas aos frigoríficos. Ainda que o cenário seja americano, a lógica econômica é universal e oferece lições importantes para quem vive da pecuária no Brasil.

O economista Derrell Peel, da Universidade de Oklahoma, resume a situação sem rodeios: “não existe caneta de político capaz de acelerar o ciclo pecuário”. A cadeia da carne tem limites biológicos, produtivos e temporais que não mudam com decretos, investigações ou discursos.

Interferência política e a busca por culpados

A crise recente se intensificou quando o então presidente Donald Trump pediu uma investigação urgente sobre suposta manipulação de preços por parte dos frigoríficos.

Peel explica, porém, que a estrutura atual da indústria é fruto de mais de um século de economia de escala, eficiência produtiva e altos investimentos. Por isso, falar em “culpa dos frigoríficos” virou quase um hábito cultural — muito mais emocional do que técnico.

Segundo ele, um setor concentrado não é automaticamente um setor que explora o produtor. As grandes plantas geram eficiência, reduzem custos e, no fim, seguram preços para o consumidor e ampliam o valor da arroba. Um mercado fragmentado seria menos eficiente e resultaria em carne mais cara e boi mais barato.

O famoso ‘bungee cord’: preços se conectam, mas não ao mesmo tempo

Peel usa uma metáfora perfeita para explicar o descompasso entre preços no varejo, no frigorífico e na fazenda: “As relações entre os preços são como um elástico de bungee jump, não como uma corrente.”

Isso significa:

  • os preços estão ligados,
  • mas reagem com atrasos, distorções e movimentos independentes.

Não existe “margem fixa” entre boi, carne industrializada e carne no supermercado. Cada elo reage a um momento diferente do ciclo pecuário.

Frigoríficos: os vilões que também estão no prejuízo

Um ponto que surpreende é que, nos EUA, os frigoríficos estão há quase dois anos operando no vermelho, exatamente por causa da falta de bois.

Segundo o levantamento do Meat Institute:

  • margens ficaram negativas desde setembro de 2024;
  • na primeira semana de outubro de 2025, o prejuízo médio estava em –US$ 126,50 por cabeça, praticamente igual ao do ano anterior.

É um choque para quem imagina que o frigorífico “sempre ganha” — mas ajuda a mostrar a complexidade da cadeia.

Peel ironiza a narrativa política: “Se os frigoríficos realmente tivessem grande poder de mercado, não estariam pagando preços recordes pelo gado enquanto perdem dinheiro ao mesmo tempo.”

O problema real: não tem boi

A raiz de tudo é simples: anos de seca e altos custos reduziram drasticamente o rebanho americano. E quando o estoque de matrizes cai, nada resolve rápido.

Peel é categórico:

  • 2025 pode ser o fundo do poço do ciclo;
  • 2026 e 2027 terão crescimento quase nulo;
  • a produção só deve reagir de verdade a partir de 2028/2029.

A mensagem é clara: não há solução de curto prazo.

Por que mexer na indústria agora seria perigoso

Segundo Peel, ataques políticos aos frigoríficos podem desorganizar o setor justamente no momento em que os produtores vivem um dos melhores cenários de preços da história.

“Derrubar a indústria de abate agora seria jogar contra os próprios produtores.”

Além disso:

  • destruir capacidade industrial derruba o preço do boi,
  • mas aumenta o preço da carne para o consumidor,
  • e não resolve a falta de oferta.

Paciência, não política

A conclusão do especialista é direta: o único caminho para equilibrar preços é reconstruir o rebanho, um processo de anos, não meses.

Ele resume de forma dura, porém verdadeira: “Não existe nada que alguém possa fazer para derrubar o preço da carne agora. Só reconstruir o rebanho — e isso leva tempo.”

E finaliza: “Quando a política passa por cima da economia, todos os fundamentos deixam de fazer sentido. Aí… todas as apostas estão canceladas.”

Por que isso importa para o Brasil?

Mesmo que o cenário discutido seja norte-americano, as lições se aplicam diretamente à pecuária brasileira:

  1. O ciclo pecuário é lento.
    Tentativas de interferir artificialmente no mercado sempre dão errado.
  2. Culpar frigoríficos não resolve o problema da oferta.
    É preciso olhar para produtividade, manejo, genética e retenção de fêmeas.
  3. Mercados eficientes dependem de escala.
    Romper modelos eficientes por pressão política pode destruir valor para o produtor.
  4. Oferta é destino.
    Quando o rebanho encolhe, o preço da carne sobe — sempre.

Fonte: Drovers, traduzida e adaptada pela Equipe BeefPoint.

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