Leia a carta de Otávio Hermont Cançado, diretor executivo e presidente interino da ABIEC, de despedida da instituição. Ontem, 04/outubro/2010 foi a posse do novo presidente, Antonio Camardelli.
Senhores Conselheiros,
A Assembléia-Geral e a reunião do Conselho da ABIEC, realizada no dia 24 de setembro passado, me instigaram a consultar o meu bom-senso. O setor se comunica mal, e essa condição é perturbante. O instinto natural de um profissional, cheio de energia, carregado de vontade de fazer e de realizar tantas coisas e de assumir tantos compromissos conflita com muitas das minhas decisões solitárias à frente daquela que um dia foi a mais importante e influente entidade de classe deste País.
Na verdade, ela ainda é! Talvez tivesse sido essencial falarmos mais ao invés de silenciarmos, a palavra talvez tivesse sido essencial para mudarmos o curso da história deste setor que eu aprendi a respeitar, a defender, a enaltecer e a viver intensamente. Regras poderiam ter sido mudadas, sistemas substituídos, costumes e atitudes reanimados e ajuda estendida em momentos decisivos para os seus representados.
Por mais irônico que possa parecer, eu já havia previsto este cenário de consolidação irreversível em diversas ocasiões. Me recordo, como se fosse hoje, as diversas reuniões que mantive com autoridades governamentais, bancos, órgãos internacionais, entre outros, sobre o futuro do setor. Era muito previsível, mas pouco provável que ocorresse de forma tão agressiva e rápida.
Vejam por esse lado: tudo que – de certa forma – ajudei a construir, hoje vejo por uma perspectiva diferenciada. Se o crescimento do setor foi “ditado pelo mercado” ou “influenciado” por um desejo anormal e repleto de interesses diversos, seja qual for, não me sinto confortável ou mesmo capaz de avaliar. No entanto, a única afirmação que posso estampar é a de que etapas foram percorridas e novos ciclos – melhores – hão de vir.
Mas, Senhores, por outro lado, se analisarmos no plano estritamente institucional, um conjunto de interesses coletivos emergiu na ABIEC, superando obstáculos internos e externos, como triunfo ao egocentrismo de poucos, dotando-a, portanto, de uma estrutura de qualidade e de representatividade comportamental muito distante de desigualdades, de discriminações ou de exclusões.
Ainda falando no plano estritamente institucional, acredito que a ABIEC deva se guiar e se pautar – cada vez mais – pela afirmação de valores que consolidem e contribuam para o seu constante amadurecimento.
Ao falar em amadurecimento, é inegável reconhecermos como esta entidade cresceu ao longo dos últimos anos, marcados pela crise financeira, mas sobretudo moral e de valores. A ABIEC e seus associados, a fim de instaurar determinados valores soube – a duras conseqüências – aplicar a necessária retidão sobre os interesses individuais frente à nova realidade coletiva, antes vulgarizada.
A ABIEC, recordemos, trata-se de uma ASSOCIAÇÃO de classe, que tem por objetivo precípuo reunir um grupo de empresas, neste caso, em busca de interesses comuns, sejam eles econômicos, sociais, científicos, políticos ou outros. A esse respeito, com toda a vênia, a meu ver, não há mais espaço na ABIEC – de hoje – para a utilização da via institucional para legitimar interesses particulares ou desvios pontuais de conduta. Isso é admirável e é esta acepção que, julgo eu, e permitam-me sugerir, deve sempre ser trilhada, perseguida pelos Senhores.
O mundo é regido por grandes instituições, das quais é de se esperar fidelidade, ética, honestidade, respeito, entre tantos outros valores fundamentais, caso contrário chegaríamos à absurda conclusão de que seria impossível um grupo de empresas reunirem-se para alcançar um fim comum. Não acredito ser viável ou admitirmos que uma associação como a ABIEC não observe esta finalidade conceitual básica. Estimular o fortalecimento setorial e social, favorecendo sua forma de organização e motivação dos entes associados é fundamental.
O desafio é grande, mas o estímulo foi dado. Não espero nada aquém da continuidade da aplicação desses valores na futura gestão. Afinal a ABIEC é um belo exemplo de uma grande instituição que não pode ceder, a qualquer tempo, ao egocentrismo econômico individual.
Quando aceitei o desafio de ocupar o cargo de Diretor-Executivo da ABIEC sabia dos riscos e das conseqüências que me aguardavam, mas também das gratificações profissionais com as vitórias conquistadas. As previsões foram confirmadas. Tive dissabores, mas também soube comemorar conquistas que, acima de tudo, muito contribuíram para meu crescimento profissional e pessoal.
Meu dever foi cumprido, ao menos é o sentimento que permeia minhas constantes avaliações. Vitórias e o cumprimento de metas em temas relevantes foram alcançados. Mercados foram reconquistados, mantidos, consolidados e outros tantos novos foram conquistados ao longo deste período.
Desnecessário seria dizer que a questão sócio-ambiental teve, por primeira vez, destaque no centro de importantes discussões do setor e, por conseqüência, foi tratada como tema de primeira ordem pela entidade, com profissionais capacitados para esta enorme e desafiante empreitada.
Não menos importante, por isso registro também, foi a reestruturação tributária do setor, com novas regras fiscais para o PIS/COFINS, a manutenção e a renovação do convênio com a Apex-Brasil, importante agência de fomento às exportações e antiga consorte da ABIEC, inclusive e principalmente nos momentos de grandes incertezas. Aliás, registre-se, a parceria se fortaleceu exatamente nestes momentos. À Apex, meu agradecimento especial.
Enfim, aprendi com o tempo, que um bom profissional é aquele que sabe a hora de entrar e a hora de sair. Acredito que, ao longo destes mais de dois anos, contribuí positivamente com a entidade – a qual encontrei financeiramente prejudicada – e mais ainda com o setor que sempre me identifiquei e, com todo prazer, dediquei muitas horas de meu tempo e da minha vida.
Esta carta tem por objetivo comunicar aos Senhores Conselheiros e aos Associados, que sempre confiaram no meu trabalho, de que percebi que a hora da partida chegou. Hoje me desligo, formalmente, da ABIEC.
Pretendo me dedicar a outros projetos e mais à família. Tomar esta decisão foi muito difícil, mas arriscar é preciso! Escolher, com audácia, que portas vamos fechar ou abrir é necessário! Tomar uma decisão sensata se faz essencial neste momento. E é o que agora faço.
Mais uma vez agradeço a todos pela confiança em mim depositada e reafirmo que estarei, como sempre estive, à disposição para ajudá-los no que for preciso. Por fim, permitam-me registrar os meus mais sinceros votos de sucesso ao novo Presidente do Conselho e à toda a sua equipe.
Que a nova gestão possa ter – como eu tive – apoio incondicional das empresas associadas, de modo que a ABIEC continue a bem representá-los e a bem desempenhar a sua principal tarefa, qual seja: defender os anseios deste importante setor da economia brasileira.
Respeitosamente,
Otávio Hermont Cançado
Presidente, interino, ABIEC
4 Comments
Prezado senhor Otávio Hermont Cançado,
Antes de tudo,desejo cumprimentá-lo pelas palavras e como as colocou.
A ABIEC é uma importantíssima ferramenta para o nosso setor,não apenas nas exportações,mas aqui internamente no país,não acredito que o nosso seguimento,nem tão pouco pessoas comprometidas com o nosso seguimento se curvem a caprichos egocentristas,assim como não acredito no poder absoluto.Pessoas e empresas vão e vêm.
Desejo dizer-lhe que discordar de uma situação,ou decisão,ou a falta da decisão,em fim…,não nos coloca em lados opostos,apenas percebemos que uma mesma situação pode ser vista de outras formas.As vezes que coloquei minhas criticas,muitas vezes “com o dedo em riste”,apenas desejava mas participação desta entidade,que a meu ver,o poder contido nesta associação,deveria te-la feito mais comprometida com fortalecimento e defesa do setor,sobre tudo com a atual situação do setor.
Em nenhum momento houve nada de pessoal,em alguns momentos também pude elogiar esta associação.
A ABIEC,neste primeiro momento,me parece aparelhada,o retorno da JBS aumenta esta minha impressão.
Desejo que os demais participantes desta associação fiquem muito atentos,esta empresa e seus donos não costumam aceitar contrapontos,ou vozes que destoem das deles.Esta associação com a importância que tem não pode servir aos interesses de uma só empresa,nem tão pouco as demais empresas e empresários podem aceitar ou deixar que isto ocorra.
O que posso dizer é estarei acompanhando atentamente os passos desta entidade daqui para frente.
Tenho impressão que muitas pessoas cochicham,mas eu quero levantar a voz,encaro a atual situação como sendo de alto risco para setor,não falo apenas a ABIEC,mas da ABRAFRIGO,SINDIFRIGO,sem falar do BNDEs,estou observando os próximos passos para o chamo de aparelhamento do setor,do mercado.
A ABIEC,a meu ver,deve fomentar a idéia de transformar empresas frigoríficas em INDÚSTRIAS DE ALIMENTOS,e commodities e MARCA.
É uma pena que isto não tenha ocorrido durante o seu tempo,acho muito mais difícil que isto ocorra agora,mas é irrelevante neste momento a participação desta entidade,a transformação acontecerá de toda e qualquer maneira.
No mais senhor,meus melhores e mais sinceros votos de sucesso,paz,amor,e edificação profissional e espiritual.Pessoa de seu nível,certamente encontrará ocupação a sua altura.
Saudações,
EVÁNDRO D. SÀMTOS.
Minha carta de despedida nunca foi tão atual. Notadamente no que diz respeito aos valores fundamentais e básicos da ética e da moral.
Pois é… posso estar enganando mas, fica difícil não acreditar que existe alguma conexão entre a Carta de despedida aos conselheiros da ABIEC e o post “Diretor do Ministério da Agricultura ganha indenização de frigoríficos” que inspirou o comentário de nosso amigo H F Tavares…
Principalmente após ler o último comentário (curto e direto) do Sr. Otávio Hermont Cançado…
Infelizmente, o sistema é predador… e possui integrantes vorazes, onde valores éticos e morais são fraquezas das “Virgens”… Sobreviver neste meio, sem perder a dignidade é coisa para poucos… Em geral só “As Profissionais” tem chances de sucesso…
E com certeza, ainda não sabemos grande parte da história… e só o que vem a público já é de arrepiar… Esperar pra ver e confirmar que nada vai acontecer… Novamente iremos testemunhar outra vitória “Das Profissionais”…
Assim é o nosso país,a nossa educação,os nossos ranços,as nossas vergonhas desavergonhadas.
E assim somos nós brasileiros (as profissionais,aceitamos de um tudo,e calados,como devem fazer as profissionais).
Tudo caminha na mais perfeita ordem corrupta,nada mais do que o normal para um país corrupto,de governantes corruptos,de um povo igualmente corrupto.
Vamos lá,mais vale quem rouba mais faz…NORMALLL!!!
Saudações inescrupulosas,
EVÁNDRO D. SÁMTOS.