A Confederação Nacional da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) poderá se afastar do programa de promoção das exportações da carne brasileira. A medida é um protesto contra a importação de carne argentina feita por alguns frigoríficos nacionais. De sexta-feira até ontem, o preço da arroba do boi já havia caído 6,5%. Estimativas da CNA apontam para a entrada 374 toneladas de carne argentina a partir da próxima semana.
O programa para promover a carne brasileira no exterior está sendo desenvolvido pela Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carne (Abiec) e pela Agência de Promoção de Exportações (Apex), com o apoio do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. O presidente da Comissão Nacional de Pecuária de Corte da CNA, Antenor Nogueira, disse que se as importações continuarem ocorrendo no setor, cujos abates estão estimados em 34 milhões de cabeças, nesta safra, há o risco de desestruturação completa.
Ele solicitou ontem uma audiência com o ministro da Agricultura, Pecuária e do Abastecimento, Marcus Vinicius Pratini de Moraes, para discutir o assunto. Na próxima semana, haverá uma reunião com todas as federações de agricultura e associações de criadores também para avaliar o problema.
“Só queremos provar que a carne brasileira é a melhor do mundo. Não podemos importar a argentina”, diz Nogueira. Segundo ele, o setor produtivo vai se retirar do programa de exportações de carne brasileira caso continue entrando carne da Argentina. Nogueira diz que pelo menos três grandes frigoríficos nacionais estariam dispostos a comprar a carne argentina.
De acordo com o analista José Vicente Ferraz, da FNP Consultoria, a carne argentina está sendo comercializada a US$ 8,60 a arroba, frente aos US$ 19 a arroba do produto nacional. “Mesmo com o frete, compensa a importação”, afirma. No entanto, Ferraz não acredita que a queda no preço registrada esta semana, seja decorrente da importação. Segundo ele, havia um descasamento entre o preço pago ao produtor e o pago pelo atacado e, por conta disso, o frigorífico precisou reduzir o valor recebido pelo pecuarista. “Além disso, há um menor consumo em virtude da diminuição do poder aquisitivo do brasileiro e também por estarmos na Semana Santa”.
O consultor diz que a carne argentina só começa a entrar no País na próxima semana. Porém, não acredita que seja um volume suficiente para derrubar o preço. No ano passado, o Brasil importou 38 mil toneladas de carne bovina (em equivalente carcaça), dos quais 80% foram provenientes da Argentina.
O analista da Safras & Mercado, Paulo Molinari, acredita que, entre abril e junho, a desvalorização do peso argentino irá afetar não só a pecuária como também a agricultura brasileira. “Mas ainda não é uma realidade”, afirma. Ele afirma que está difícil ocorrer negócios na Argentina porque ninguém sabe qual será a cotação do dólar.
A desvalorização da moeda argentina provocou uma explosão do preço interno do boi, dificultando os abates. Molinari argumenta ainda que o Brasil não é prioridade para a Argentina, que tradicionalmente exporta carne para o Chile, EUA e Europa.
“O mercado é livre. Se há oportunidade de trazermos carne mais barata, é lógico que a indústria vai comprar”, diz o secretário-executivo da Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carne (Abiec), Ênio Marques. Na avaliação de Marques, a carne argentina só está entrando mais barata no Brasil por conta da desvalorização do peso.
Ele não acredita que a situação continue por muito tempo, pois o preço aviltado vai prejudicar o pecuarista argentino. “Precisamos é exportar. Se ficar mais produto no mercado interno, pior para todo mundo”, conclui. Para Marques, uma solução para o problema do preço é tipificar a carcaça, pagando mais pela que tem melhor qualidade.
Goiás
Segundo Antenor Nogueira, em função dessas importações, nos últimos dias a carne caiu de R$ 46,00 a arroba para R$ 42,00, em São Paulo, e de R$ 42 para até R$ 38,00 em Goiás (preço médio da BMG ontem ficou em R$ 40,00). De acordo com ele, a atitude dos frigoríficos é mais inaceitável ainda porque o País se encontra em plena safra do boi, com oferta estável de animais para abate e preços relativamente baixos. “Isso prova que a indústria frigorífica nacional continua mergulhada no atraso do imediatismo, sem qualquer compromisso com a consolidação da pecuária brasileira de corte, ou com o futuro da própria cadeia produtiva”, afirma Nogueira, que conclama os pecuaristas para uma ampla mobilização em defesa da atividade.
Contra-Ataque
Ontem mesmo Nogueira conclamou as donas de casas brasileiras a não consumirem a carne de origem argentina, argumentando que no país vizinho o boi de corte recebe tratamento à base de hormônios, rejeitados por muitos países pelos males que podem causar à saúde humana. “Aqui mesmo a utilização desses medicamentos é proibida por lei, o que dá ao consumidor a certeza e a tranqüilidade de estar adquirindo um produto de qualidade e sem riscos potenciais para o seu bem estar”, diz o coordenador do fórum.
O presidente do Sindicato das Indústrias de Carnes de Goiás (Sindicarne), José Magno Pato, disse ontem que a importação de carne argentina é apenas uma questão de mercado, pois lá o produto está ao redor de dez dólares a arroba, contra quase 20 dólares no Brasil. Ele admite que o mercado interno do boi deve continuar instável enquanto perdurar o processo de desvalorização do peso argentino, que torna o produto daquele país cada vez mais competitivo em relação ao brasileiro.
Magno Pato diz que a situação de crise no setor era previsível, principalmente porque a Argentina, impedida de exportar carne durante algum tempo, devido ao surgimento de focos de aftosa em seu território, detém hoje grande estoque de bois prontos para abate. Ele advertiu ainda que a situação tende a piorar para a pecuária de corte brasileira, “pois a carne argentina vai competir com a nossa não só no mercado interno, mas também no mercado mundial, pois contam com oferta elevada e preços atrativos”, diz o dirigente do Sindicarne.
Fonte: Gazeta Mercantil (por Neila Baldi), O Popular/ GO (por Edimilson de Souza Lima) e Correio do Povo/ RS, adaptado por Equipe BeefPoint
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Se estamos importando um produto não compatível com as normas de controle de qualidade vigentes no Brasil, e realmente não temos veterinários ou outros profissionais aptos a fazer esta averiguação (veterinários da vigilância pública) ou o governo faz “vista grossa”, deixando que ocorra a importação, sendo esta, uma importante ferramenta para o controle do preço da carne. Controle do preço da carne logo na safra? Abaixar o preço da cesta básica para ganhar créditos (ganhar voto)? Qual a idéia real do governo, a gente não sabe. Sabemos que o governo pode começar a pensar em fornecer cestas básicas para os produtores, porque eles também já estão necessitando.