Análise Gráfica – contrato futuro boi gordo: 27-11-2006
27 de novembro de 2006
É hora de repartir o pão (e a carne)
29 de novembro de 2006

Conectabilidade nas avaliações genéticas

Freqüentemente, quando disponibilizamos aos criadores os resultados das avaliações genéticas, nos deparamos com questões do tipo: Será que as DEPs de todos os touros deste sumário são comparáveis. Será que posso comparar as DEPs dos produtos deste relatório e escolher os superiores? Estas questões podem ser respondidas se os dados utilizados nas avaliações forem previamente submetidos a uma análise para verificar o grau de conectabilidade entre os grupos contemporâneos.

Por Fernanda Varnieri Brito, Vânia Cardoso, Roberto Carvalheiro, Luiz Alberto Fries, Carlos Dario Ortiz Peña, Mario Luiz Piccoli, Vanerlei M. Roso, Flávio Schenkel e Jorge Luiz Paiva Severo¹

Freqüentemente, quando disponibilizamos aos criadores os resultados das avaliações genéticas, nos deparamos com questões do tipo: Será que as DEPs (Diferença Esperada na Progênie) de todos os touros deste sumário são comparáveis. Será que posso comparar as DEPs dos produtos deste relatório e escolher os superiores? Estas questões podem ser respondidas se os dados utilizados nas avaliações forem previamente submetidos a uma análise para verificar o grau de conectabilidade entre os grupos contemporâneos.

Por que é importante avaliar conectabilidade?

A metodologia geralmente utilizada nas avaliações genéticas dos programas de melhoramento genético atuais é baseada nos procedimentos BLUP. Dentre as principais qualidades desta metodologia está a possibilidade de comparar as DEPs de animais criados/testados em diferentes ambientes (grupos contemporâneos, GCs), tanto dentro quanto entre rebanhos.

A acurácia das comparações, entretanto, depende do grau de conectabilidade genética entre os GCs. Com poucas ligações genéticas entre GCs, a acurácia das comparações é menor e pode resultar em incorreto ranqueamento dos animais. A rigor, animais em diferentes GCs somente podem ser comparados se estes grupos forem conectados ou quando é possível assumir que não existe diferença genética entre a média dos GCs, mesmo que a acurácia dentro dos grupos seja alta.

Infelizmente a maioria dos “pacotes” disponíveis para avaliação genética não avisam quando existem GCs desconectados ou fracamente conectados. DEPs são geradas indistintamente para todos os animais (conectados ou não) impondo-se a restrição de que as DEPs dos animais pertencentes a grupos desconectados somem a zero dentro de grupo. Isto faz com que problemas sérios de conectabilidade passem despercebidos e induzam a comparações inadequadas entre os animais em muitos programas de melhoramento genético.

Animais de GCs desconectados têm suas DEPs sub ou superestimadas, dependendo deles estarem em GCs com média genética superior ou inferior, respectivamente. A falta de conectabilidade também se constitui num problema na estimação de componentes de variância resultando, por exemplo, em estimativas de herdabilidade e correlações genéticas errôneas.

Medidas de conectabilidade

Nas avaliações genéticas através do modelo animal, as conexões entre GCs ocorrem através do parentesco aditivo entre os animais, estabelecidas principalmente pelo uso comum de touros em diferentes rebanhos. Quando o modelo animal é utilizado, a medida mais apropriada de conectabilidade é o PEVD, definido como sendo a variância do erro de predição da diferença entre as estimativas de valor genético de animais testados em diferentes GCs (Kennedy e Trus, 1993). Esta estatística, entretanto, é computacionalmente muito exigente, não sendo viável a sua aplicação rotineira nas avaliações genéticas.

Assim, Kennedy e Trus (1993) propuseram o uso da variância das estimativas da diferença entre GCs (VED) que, nas suas simulações, mostrou-se altamente correlacionada com o PEVD. Mathur et al. (1999) também argumentaram que o VED poderia ser usado como medida do nível de conectabilidade entre GCs e propuseram o cálculo da correlação entre as estimativas dos efeitos dos GCs (CR), que seria menos dependente do tamanho e estrutura dos GCs. Embora os autores tenham usado um procedimento iterativo, o esforço computacional para calcular a CR é também elevado, limitando sua aplicação.

Fries (1998) propôs, como método para avaliar conectabilidade, o número de laços genéticos totais entre GCs (LGT) devido ao uso comum de touros e vacas. Este método foi comparado com os métodos VED e CR na predição do PEVD (Roso et al., 2004). O método LGT, além de ser computacionalmente menos exigente e discriminar os GCs completamente desconectados dos grupos conectados, foi superior aos métodos VED e CR na predição do PEVD. Por estas razões, os autores concluíram que o método LGT é uma boa alternativa para ser usado rotineiramente na avaliação do grau de conectabilidade entre GCs com o objetivo de aumentar a acurácia na comparação das DEPs de animais em diferentes unidades ambientais e, com isso, possibilitar o efetivo uso da variabilidade genética existente na população.

Programa para avaliar o grau de conectabilidade

O desenvolvimento de programas de computador para avaliar o grau de conectabilidade entre GCs em grandes conjuntos de dados não é trivial. Roso e Schenkel (2006), utilizando a linguagem FORTRAN 77, desenvolveram um eficiente programa, denominado AMC, que pode ser implementado em avaliações genéticas de larga escala. Neste programa, o grau de conectabilidade de cada GC com todos os outros GCs é medido através do método LGT.

Dependendo do modelo utilizado na avaliação genética, seja ele o modelo touro, o modelo touro e vaca ou o modelo animal, o grau de conectabilidade entre GCs pode ser medido através das conexões genéticas devidas a touros, touros e vacas ou todos os ancestrais em comum. As conexões genéticas são ponderadas pelo parentesco aditivo entre os animais. Com base na relação existente entre LGT e PEVD (Roso et al., 2004), os requerimentos mínimos para considerar um GC conectado são definidos no programa. Mais detalhes sobre o programa AMC podem ser obtidos em Roso e Schenkel (2006).

Recomendações para as avaliações genéticas

A seleção dos animais para a reprodução é um processo comparativo, onde somente aqueles com características desejáveis são mantidos. Problemas de conectabilidade entre GCs podem resultar em comparações inadequadas e, consequentemente, comprometer a escolha correta dos animais geneticamente superiores.

Para minimizar este risco, antes da avaliação genética, deve-se realizar uma análise de conectabilidade para cada característica. Os arquipélagos (principal e secundários) de GCs conectados e os GCs desconectados devem ser identificados e as avaliações genéticas conduzidas separadamente para cada arquipélago e para os GCs desconectados. Da mesma forma, os resultados devem ser apresentados/publicados separadamente para não induzir os usuários a fazerem comparações inadequadas. As análises genéticas que dão origem aos sumários de touros devem incluir somente os GCs conectados do arquipélago principal.

Recomendações práticas para aumentar a conectabilidade

– Na medida do possível, deve-se aumentar uso da iseminação artificial (IA) e monta controlada e reduzir uso de reprodutores múltiplos (RM). A IA tem um efeito importante na conectabilidade, pois permite a distribuição da progênie dos touros entre os rebanhos e, por extensão, entre os GCs. O uso planejado de touros com alto valor genético entre os rebanhos, além de promover o melhoramento genético na população como um todo, pode aumentar a conectabilidade entre os GCs. Alguns programas de melhoramento genético recomendam que pelo menos 10% dos produtos de cada safra sejam filhos de touros “amarradores”, com elevado número de filhos avaliados no Programa. Uma listagem dos touros “amarradores” com sêmen disponível pode ser elaborada anualmente e utilizada pelos técnicos e criadores participantes do Programa na determinação dos acasalamentos para aumentar a conectabilidade;

– Procurar trabalhar com maior número de animais por grupo de manejo, tendo o cuidado para garantir tratamento uniformidade a todos os animais do grupo;

– Formar os grupos de manejo por sexo;

– Formar os grupos de manejo contendo filhos de vários touros, nunca de um único touro;

– Não formar grupos de manejo somente com filhos de RM;

– No período pós-desmama, procurar não subdividir os grupos de manejo da desmama. Não reagrupar os animais no pós-desmama de acordo com suas DEPs, índices ou decas da desmama;

– Avaliar todos os animais do grupo de manejo no mesmo dia;

– Não utilizar somente RM sobre as novilhas;

– Procurar incluir filhos de vacas pouco conectadas nos grupos de manejo dos filhos de vacas bem conectadas;

– Não montar os grupos de manejo de acordo com as DEPs, índices ou decas das vacas ou dos touros;

– Usar um programa de computador para identificar os GCs conectados e os desconectados. Com base nestas informações, planejar o uso de touros “amarradores” para conectar os GCs desconectados nas safras seguintes.

Um exemplo ilustrando a importância de uma análise de conectabilidade

Para ilustrar a importância de se avaliar a conectabilidade, utilizamos como exemplo a base de dados do Sumário de Touros Aliança Nelore. O grau de conectabilidade entre os GCs foi verificado através do programa AMC. A característica considerada foi o ganho de peso do nascimento a desmama. O arquivo de dados continha 635.930 produtos, 31.219 GCs, 3.385 touros utilizados através de IA ou monta controlada e 323.603 vacas, distribuídos em 300 fazendas no Brasil e no Paraguai.

A Tabela 1 sumariza os principais resultados. São apresentados o número de GCs conectados e produtos no arquipélago principal e nos arquipélagos secundários e o número de GCs desconectados e produtos quando o LGT considerou as conexões genéticas devidas a touros, touros e vacas ou todos os ancestrais em comum. O número de touros que contém todos os filhos em GCs desconectados também é apresentado na Tabela 1.

Quando o LGT considerou apenas os laços genéticos devidos ao uso comum de touros, 73,33% dos produtos estavam nos GCs conectados do arquipélago principal. Este percentual aumentou para 95,08% e 95,94% quando o LGT considerou as conexões devidas a touros e vacas em comum e todos os ancestrais em comum, respectivamente. Portanto, as conexões genéticas mais importantes na determinação do grau de conectabilidade entre GCs foram estabelecidas principalmente pelo uso comum de touros e vacas. As vacas Nelore, por serem longevas e, consequentemente, produzirem muitos filhos ao longo dos anos, são particularmente importantes para conectar os GCs dentro de fazenda.

Um resultado que chama muito a atenção na Tabela 1 é o número de touros que contém todos os filhos em GCs desconectados. São 359 (10,60%), 235 (6,94%) e 187 (5,52%) touros quando o LGT considerou os laços genéticos devidos aos touros, touros e vacas e todos os ancestrais em comum, respectivamente. Se os procedimentos pré-análise genética do Sumário Aliança Nelore não incluíssem uma análise de conectabilidade, considerando os mesmos critérios mínimos para publicação (20 filhos e ter algum produto a partir de 1998), 45 touros (5,5%) completamente desconectados teriam sido publicados inadequadamente, junto com os 766 touros do Sumário 2006, induzindo os usuários a comparar touros que na realidade não são comparáveis.


a Somente GCs com LGT maiores do que 10 foram considerados conectados dentro de cada arquipélago.
b Touros que contém todos os filhos em GCs desconectados

Referências bibliográficas

Fries, L.A. 1998. Connectability in beef cattle genetic evaluation: the heuristic approach used in MILC.FOR. In: World Congress on Genetics Applied to Livestock Production, 6, Armidale, NSW, Australia. v.27, p.449-500.

Kennedy, B. W.; Trus, D. Considerations on genetic connectedness between management units under an animal model. Journal of Animal Science. v.71, p.2341-2352. 1993.

Mathur, P. K.; Sullivan, B. P.; Chesnais, J. P. Measuring connectedness: concept and application to a large industry program. In: World Congress on Genetics Applied to Livestock Production, 7, Montpelier, France. 2002. Communication No 20-13.

Roso, V. M., Schenkel, F. S. and Miller, S. P. 2004. Degree of connectedness among groups of centrally tested beef bulls. Canadian Journal of Animal Science. 84: 37-47.

Roso, V. M. and Schenkel F. S. AMC – A computer program to assess the degree of connectedness among contemporary groups. Proceedings of 8th World Congress on Genetics Applied to Livestock Production, August 13 to 18, 2006, Belo Horizonte, MG, Brazil. Communication No 27-26.

____________________________

¹Fernanda Varnieri Brito, Vânia Cardoso, Roberto Carvalheiro, Luiz Alberto Fries, Carlos Dario Ortiz Peña, Mario Luiz Piccoli, Vanerlei M. Roso, Flávio Schenkel e Jorge Luiz Paiva Severo, Equipe GenSys

0 Comments

  1. Carlos Magno Pereira disse:

    Excelente matéria! Estamos realmente necessitando de informações técnicas e estudos c/ excelentes resultados, voltado p/ o Melhoramento Genético da Raça Bovina; mais precisamente a Nelore.

    Sucessos!