Após o aperto nas margens, causado pela escassez de matéria-prima e pela falta de crédito, alguns frigoríficos que vinham se preparando para abrir capital, através da profissionalização, investimentos em governança e contratação de executivos, pisaram no freio e adiaram seus planos.
Após o aperto nas margens, causado pela escassez de matéria-prima e pela falta de crédito, alguns frigoríficos que vinham se preparando para abrir capital, através da profissionalização, investimentos em governança e contratação de executivos, pisaram no freio e adiaram seus planos. A mudança nas empresas visava obter recursos por meio de ofertas públicas de ações.
Na Bertin S.A, João Pinheiro Nogueira Batista, que estava havia apenas seis meses no cargo de diretor-presidente, saiu e deu lugar a Fernando Bertin, um dos fundadores do grupo. No frigorífico Mercosul, o executivo Augusto Cruz, que ocupava a presidência, deixou o posto. A Galeazzi & Associados, que preparava um plano para reestruturar o Quatro Marcos, também deixou a empresa, que pediu recuperação judicial no fim do ano passado e vinha numa agonia desde meados do ano passado, depois da tentativa frustrada de criar uma joint venture com o frigorífico Margen.
Nas que conseguiram abrir o capital em 2007, – JBS, Marfrig e Minerva – representantes das famílias permaneceram na presidência, apesar de um time grande de profissionais ter sido contratado. Na JBS, o executivo Sérgio Longo, que acaba de deixar a empresa, ocupava desde 2003 a diretoria financeira. Para analistas, mesmo com o comando familiar, essas empresas lograram ir ao mercado porque foram favorecidas pela liquidez naquele momento, mas também porque estavam melhor preparadas do ponto de vista de governança.
Um especialista do setor de carnes, que prefere não se identificar, afirma ter havido erros na profissionalização das empresas do setor. “O que assistimos foi a profissionalização para [as companhias] abrirem capital e levantarem recursos. O IPO não pode ser o objetivo. Tem de ser o meio para a empresa crescer”, alfineta. Outro equívoco, em sua opinião. “É um erro trocar o presidente de uma empresa para abrir capital. Para ser presidente tem de conhecer a parte operacional”, completa.
De acordo com Betânia Tanure, professora da Fundação Dom Cabral, “é comum, nos momentos de crise, as empresas que estão no meio de um processo de mudança ou de transformação terem seu nível de maturidade diminuído, voltando a ter comportamentos típicos da fase anterior”. esse retrocesso normalmente ocorre quando o processo de profissionalização não está sólido.
O fato é que a crise gera desconfiança. “O proprietário se pergunta: ´será que o executivo é mais capaz do que eu que estou no negócio há 50 anos?”, exemplifica Fabiana Fakhoury, da Alvarez & Marsal, consultoria especializada em fusões, aquisições e restruturação de empresas.
Logo depois de devolver o bastão aos donos da Bertin, João Nogueira Batista, disse, que a empresa “não estava pronta para o passo que deu há seis meses”, quando o contratou. Uma fonte próxima à Bertin garante que se houvesse atualmente um quadro favorável para aberturas de capital, a empresa estaria preparada, porque sua governança está consolidada e a contabilidade integrada.
A crise financeira internacional acabou contribuindo para o recuo da Bertin. Batista disse, à época de sua saída, que a decisão não tinha “diretamente a ver com a crise” , mas admitiu que com a alteração do cenário econômico a “abertura de capital não é tão premente”. Procurados novamente, a Bertin e Batista não se pronunciaram.
Foi também a crise que levou a Galeazzi a sair do Quatro Marcos, onde preparava, desde agosto de 2008, a reestruturação da empresa, que agora está em recuperação judicial e só tem duas unidades operando. Com oito plantas no país, o Quatro Marcos chegou a faturar R$ 944 milhões em 2007.
“As empresas do setor de carne bovina têm sofrido porque tiveram estrangulado o crédito que mais usavam, os ACCs [adiantamento de contratos de câmbio]”, observa Fabiana Fakhoury , da Alvarez e Marsal . Ela acrescenta que, além de as linhas de crédito para exportação terem secado, o mercado internacional de carnes diminuiu por causa da menor demanda e também pelas restrições que o produto do Brasil enfrenta na Europa, por exemplo.
Mercosul
O executivo Augusto Cruz, ex-Pão de Açúcar e ex-JBS, deixou a presidência do frigorífico Mercosul, que havia assumido em meados de 2007 com a tarefa de preparar a empresa para a abertura de capital. O controlador do Mercosul, Mauro Pilz, voltou interinamente ao comando, mas será substituído em março por Douglas de Oliveira, ex-CFO (principal executivo da área financeira) e CEO interino do Bertin, até meados do ano passado, antes da chegada do executivo João Nogueira Batista à empresa.
Mauro Pilz faz questão de afirmar que a saída de Cruz se deveu a “um encontro de interesses” entre as partes. E usa a palavra reorganização para a nova fase vivida pela empresa, que tem participação de 37,8% de um fundo administrado pelo americano AIG em seu capital.
Quando questionado se a crise financeira levou às mudanças, Pilz afirma, sem dar detalhes, que a reorganização decorre de uma “conjugação de motivos”. Mas reforça que a empresa “está fazendo o dever de casa” e segue com o plano de abrir capital. “Estamos reestruturando nossas estratégias nesta nova fase”, diz.
Douglas de Oliveira era o diretor-financeiro da Bertin em 2007, quando a empresa dava os primeiros passos rumo à profissionalização com o objetivo de abrir o capital. Naquele ano, frigoríficos como Minerva, JBS e Marfrig foram ao mercado e lançaram ações na bolsa, mas o Bertin não. Agora, ninguém mais sabe quando isso poderá acontecer.
No ano passado, segundo Pilz, o Mercosul faturou R$ 950 milhões, 35% mais do que em 2007, e a meta para este ano é alcançar R$ 1,4 bilhão, ou 40% a mais. Apesar da expectativa de maior faturamento, Mauro Pilz não esconde a preocupação com a demanda. Segundo ele, já se sente a redução do consumo de carne. “O mercado internacional vai precisar consumir mais”.
A matéria é de Alda do Amaral Rocha, publicada no jornal Valor Econômico, resumida e adaptada pela Equipe BeefPoint.
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Devia ser exatamente o contrario, numa crise o profissionalismo deve ajudar a procurar caminhos alternativos e se isto não está acontecendo a falha é nossa, porque fomos incapazes de convencer as empresas familiares a mudar o rumo e se abrir para um gestão realmente profissional.
O medo que as familias tem de perder o mando e comando pode ser superado quando reconhecemos os valores e aptidões enormes dos donos que construiram e fizeram as empresas que são hoje.
Este artigo de certa maneira é um atestado de incompertencia nossa. Que pena porque podia ser tão diferente.