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Desapropriada fazenda com 79% de vegetação nativa

"Floresta, a senhora fala, é o mato", corrige Divino Rodrigues, um dos sem-terra acampados nas bordas de uma floresta de 142 km². É uma das poucas áreas com essas dimensões de vegetação nativa do bioma Amazônia que restam no norte de Mato Grosso, onde a pecuária domina. Divino conta os dias para o fatiamento do "mato" da Fazenda Mandaguari em lotes da reforma agrária.

“Floresta, a senhora fala, é o mato”, corrige Divino Rodrigues, um dos sem-terra acampados nas bordas de uma floresta de 142 km². É uma das poucas áreas com essas dimensões de vegetação nativa do bioma Amazônia que restam no norte de Mato Grosso, onde a pecuária domina. Divino conta os dias para o fatiamento do “mato” da Fazenda Mandaguari em lotes da reforma agrária.

A Mandaguari segue o que diz a lei, que mandou preservar a vegetação nativa em 80% do território das propriedades rurais instaladas no bioma Amazônia. Mas seguir a regra ambiental estabelecida em 2001, raridade entre os produtores da região, pesou contra no laudo do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra).

O instituto classificou o imóvel de “grande propriedade improdutiva” porque não explorava mais que 20% das terras. “Era um direito adquirido”, alega o superintendente do Incra em Mato Grosso, William Sampaio. De acordo com ele, o proprietário teria de explorar metade das terras que não estava registrada como reserva legal na matrícula do imóvel, segundo a lei que vigorava na época do avanço da fronteira agrícola na região.

A Fazenda Mandaguari foi desapropriada por decreto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva em 2004, após vistoria relâmpago nas terras. Depois de anos de disputa na Justiça, os donos têm até os primeiros dias de janeiro para retirar quase 5 mil cabeças de gado do local e entregar as terras – pastos e florestas – ao futuro assentamento. Um experimento arriscado para a preservação do meio ambiente.

Laudos do Incra comprovam que a fazenda Mandaguari tem 79,48% da vegetação nativa ainda preservada. Em outubro de 2010, um auto de inspeção da Secretaria de Meio Ambiente de Mato Grosso constatou queimada de 25 hectares da floresta da fazenda, atribuído pelo documento aos sem-terra acampados no local. “A vizinha ali foi queimar o lixo e o fogo escapuliu”, contou o assentado Odair José de Oliveira, diante dos sinais ainda visíveis da queimada.

“Fiz de tudo o que estava ao meu alcance”, disse ao Estado um dos donos da fazenda, João Antônio Lian, um grande exportador de café. Ele negociou com o Incra e admite ter financiado o sindicato dos trabalhadores rurais na tentativa de suspender o acampamento. Lian e o sócio devem receber da União R$ 25 milhões pelas terras, segundo avaliação mais recente. Ele quase fez um acordo com o Incra, quando o preço chegou a R$ 30 milhões.

Madeira e serraria. “A madeira lá dentro vale mais que o preço da terra”, calcula Ricardo Ewald, dono da Serraria Jaraguá, instalada a apenas 9 quilômetros do acampamento dos sem-terra. A madeira se tornou escassa na região. Madeireiras, ao contrário, ainda abundam.

Os futuros assentados da Fazenda Mandaguari tratam os madeireiros como os inimigos do assentamento e da floresta, mas eles admitem que também têm planos de instalar uma serraria no lugar. Dirceu Tavares da Silva, líder do acampamento Unidos Venceremos, fala da serraria dos sem-terra como uma forma de escapar à pressão dos madeireiros que estão de olho nos troncos de mogno, angelim, cedro e ipê, entre outras madeiras nobres encontradas no “mato”, como todos ali chamam a floresta.

Na paisagem dominada por pastos da região, a floresta aparece como um gigantesco quintal do acampamento. “A gente não tem aprovado projeto de manejo para corte de madeira nos assentamentos porque é muito difícil controlar a pressão de fora”, observa o superintendente do Incra em Mato Grosso, dando conta da dificuldade de administrar a exploração de madeira ali.

Documento do Incra a que o Estado teve acesso prevê que a Fazenda Mandaguari tem capacidade de assentar 350 famílias. Cada uma teria direito a 10,57 hectares da área já desmatada e ocupada por pasto e mais 37,17 hectares da área de floresta, “a ser explorada através de plano de manejo”, quando há corte seletivo de árvores.

O formato é criticado pelos acampados, que ainda pensam no modelo tradicional de assentamentos de reforma agrária. “Para a nossa região aqui, a terra tem de ter no mínimo 50 hectares abertos para cada um, menos que isso não é viável”, calcula José Viana, um dos acampados. “Quatro alqueires é bom para plantar perto da cidade. Aqui não dá renda.”

Na expectativa de serem assentados em breve, os acampados cuidam de repetir como mantras que a floresta há de ser bem tratada por eles. “Como cuidamos dos nossos filhos”, disse o líder do acampamento. “Já trabalhei com mato, primeiro para derrubar, agora não pode arrancar um pau”, credencia-se Sebastião Teodoro da Silva, outro acampado.

A reportagem é de Marta Salomon, para o jornal O Estado de S.Paulo, resumida e adaptada pela Equipe CaféPoint.

0 Comments

  1. José Ricardo Skowronek Rezende disse:

    Pois é….dificil de acreditar….mas é verdade.

  2. JOSE FRANCISCO SOARES ROCHA disse:

    Esta é a falta de planejamento e critério deste governo. Realmente esta é uma das últimas áreas intocadas de floresta contínua nesta região,deveria ser preservada.
    Se um pecuarista fosse utiliza-la seria devastardor e bandido, como serve aos interesses politicos deste governo, tudo é permitido. Segundo relatos da região a area ja esta sendo saquea da há muito tempo pelos futuros invasores. O acerto ja esta definido com as madeireiras. Mais uma propriedade nas mãos de imcompetentes e fadada ao fracasso,como tantas outras. Dois pesos e duas medidas, perfil deste governo que esta findando.

  3. Marcos Francisco Peres disse:

    Tá na cara o que vai acontecer. Após alguns meses os assentados vendem toda a madeira da floresta por preços irrisórios para os madeireiros, a praga toma conta do que era pasto formado. Ai eles abandonam a terra e vão pra beira da estrada invadir outra fazenda.

  4. Cleziomar A. V. Egidio disse:

    “Se correr o bicho pega se ficar o bicho come”

    Realmente um absurdo a ineficiência governamental e a falta de sintonia entre as políticas públicas principalmente para o setor Agropecuário.

    Me leva a lembrar de um velho conhecido (Murphy) aqui do cotidiano da Informática “Se algo pode dar errado, dará” ou ainda “Se algo pode dar errado, dará errado da pior maneira, no pior momento e de modo a causar o maior estrago possível”.

    E o “maior estrago possível” ainda está por vir, caso não haja uma ação urgente para este tipo de situação.

    Isto só contribui ainda mais para aumentar a Insegurança Jurídica no Campo.

    Lastimável!

  5. SEMÍ S. DOS SANTOS disse:

    Mst vai ser sempre mst.hoje é essa fazenda amanhã será outra.governo tem que ser governo!não fica desfilando de trajes do mst.

  6. Rodrigo Franco Abate disse:

    Mais uma vez nota-se a irresponsabilidade de governantes, fucionários públicos, mst e demais envolvidos na questão da reforma agrária no Brasil.

  7. Julio Cezar Rebes de Azambuja Filho disse:

    As leis brasileiras (ambientais): é uma farra, são muito contraditórias, pouco funcionais e sem embasamento e critérios.
    E, diga-se de passagem: a velha e boa burocracia dificulta bastante o andamento dos processos e acaba acontecendo isso. As tais leis poderiam ser comparadas com um casamento de faxada onde o fundamento de cada decreto é muito bunito mas não funciona pois quem executa mesmo no final das contas é a situação que se encontra o caso.

  8. Marcio Lupatini Pereira disse:

    Sem comentários.