Por Carlos Viacava1
Quem analisa as conquistas da Pecuária brasileira em 2004, sobretudo os números registrados no comércio internacional de carne bovina, pode ter a falsa impressão de que o setor está numa de suas melhores fases. Ledo engano. Realmente, é fato que o setor encerra mais um ano de atividades consolidando sua abertura aos mercados externos. Depois de assumir a liderança do mercado em 2003, com U$ 1,5 bilhão de dólares, alcançamos em 2004 exportações de U$ 2,45 bilhões, o que representa uma fatia de mais de 20%, distribuídos entre 144 países.
Mesmo que alguns analistas desavisados atribuam essa conquista a casos fortuitos como o surgimento da BSE, mais conhecida como Mal da Vaca Louca, nos países do norte e Europa, Canadá e Estados Unidos, ou ao ressurgimento da aftosa no Uruguai e Argentina, vale lembrar que um dos principais motivos para o sucesso do produto brasileiro no exterior reside na melhoria da qualidade da carne brasileira. Decorrente, sobretudo, do trabalho do nosso pecuarista em busca do avanço genético e na adoção constante de novas tecnologias.
Intenso também o esforço do criador brasileiro na vacinação maciça contra a febre aftosa, que permitiu a aprovação de zonas livres, com aprovação dos organismos internacionais, que hoje acenam para um plano internacional de erradicação definido pelo Grupo Interamericano para Erradicação da Febre Aftosa nas Américas (GIEFA).
Em outras palavras, o produtor brasileiro está fazendo sua “lição de casa”. Investiu, empenhou-se, trabalhou e contribuiu para o desenvolvimento do setor e do País. A Associação de Criadores de Nelore do Brasil (ACNB) orgulha-se de ter participado desse trabalho, liderando o melhoramento genético da raça desde a década de 80 e contribuindo para a melhoria da qualidade da carne brasileira com seu programa específico conhecido como PQNN e com o lançamento da marca de carne Nelore Natural, responsável pelo abate de quase 1 milhão de cabeças em menos de 30 meses de atividade.
Até hoje, porém, todo esse esforço do produtor brasileiro foi acompanhado pela redução de sua rentabilidade, decorrente do aumento real de custos e da queda dos preços do boi gordo e do bezerro. Houve de fato um grande aumento da produtividade que permitiu a sobrevivência do setor.
Sem dúvida a política cambial adotada a partir de 1998, com a adoção do câmbio flexível, foi a maior responsável pelo salto da produção e das exportações do agronegócio, incluindo-se aí, a carne brasileira. Contudo, hoje o setor está sendo convocado novamente para o combate à inflação e para compensar a alta de preços dos serviços públicos e dos derivados do petróleo, vendo-se diante do retorno da super-valorização do real, que em passado recente levou à substituição do consumo do brócoli tupiniquim pelo brócoli francês.
Como se não bastasse, estamos ainda pressionados por novos aumentos da carga tributária através da medida provisória 232 e pela necessidade de atender às exigências do Sistema Brasileiro de Identificação e Certificação de Origem Bovina e Bubalina (SISBOV) que, nos casos de exportação, obriga à identificação individual dos animais, implicando em um custo adicional estimado em R$ 5,00 por cabeça.
É, de fato o setor está muito bem. Frigoríficos batendo recordes de exportação, o consumidor se abastecendo de uma carne cada vez melhor e mais barata, o País progredindo com recordes sucessivos na arrecadação de impostos, com baixas taxas de inflação e enormes superávits comerciais, enfim cada vez mais ovos de ouro produzidos pela extraordinária Pecuária Brasileira.
E o produtor como é que fica?
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1Carlos Viacava, economista e pecuarista, é presidente da ACNB – Associação dos Criadores de Nelore do Brasil
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Caro Viacava,
Como produtor posso responder à sua pergunta:
Vamos voltar às velhas práticas, com nenhum investimento em tecnologia, genética, práticas gerenciais e desenvolvimento humano, para não falar em questões ambientais.
A voracidade do estado e de alguns elos da cadeia pecuária, como frigoríficos, vai acabar inviabilizando um promissor segmento da economia brasileira.
O BNDES financia frigoríficos que constroem enormes projetos de confinamento cuja finalidade aparente é deprimir o preço da arroba.
Enquanto isso associações de criadores investem no marketing da carne em beneficio de toda a cadeia, creio que sem nenhum apoio oficial.
O desalento é grande e o desfecho previsível.
Quantos novos touros você acha que o produtor racional vai comprar este ano? Quantos pastos vão reformar? Será que o produtor racional vai gastar seu rico dinheirinho com certificação no SISBOV? Algum trator novo?
Por enquanto a resposta é NÃO!
Só a união dos produtores pecuaristas sob a liderança de espíritos esclarecidos pode nos salvar do fim inevitável de ver mais uma vez adiado o sucesso de tanto trabalho e dedicação.
É tempo de reflexão. É hora de pensar grande. Com a palavra nossas lideranças.
Eduardo Miori e Maria Isabel Perez Miori
Guaraçaí / SP