Por Viviane Rohrig Rabassa1, Augusto Schneider2 e Marcio Nunes Corrêa3
A pecuária brasileira vive um momento contraditório. Ao mesmo tempo em que se observa um aumento, a cada ano, nas exportações de carne bovina, o produtor rural passa por um momento de crise. Isto se deve, entre outros fatores ligados à esta cadeia produtiva, à baixa produtividade do rebanho brasileiro. Para corrigir esta deficiência da bovinocultura, é essencial que se obtenha uma adequada eficiência reprodutiva, com a obtenção do máximo de parições possíveis na vida útil da vaca.
O intervalo entre partos ideal, para que se obtenha o máximo da eficiência reprodutiva de uma fêmea bovina, é de 12 meses, com intervalo parto-concepção próximo a 85 dias. O prolongamento do período de anestro pós-parto leva a perdas econômicas, por aumentar o intervalo parto-concepção e, conseqüentemente, não permitir que a meta de um parto/vaca/ano seja alcançada. Isto causa uma diminuição na produção de terneiros e no seu peso ao desmame na bovinocultura de corte.
O anestro pós-parto é o período que vai do parto até a manifestação do primeiro cio fértil, tendo a sua duração afetada em bovinos por diversos fatores. Um dos principais fatores que influenciam na duração do anestro pós-parto em bovinos de corte é o estado nutricional pré e pós-parto. Este fator atuando negativamente interrompe o mecanismo endócrino que controla a manifestação de cio e subseqüente ovulação. Vacas de corte com cria ao pé, especialmente as primíparas, são as categorias que apresentam maior incidência de anestro pós-parto prolongado.
Com o intuito de aumentar a eficiência reprodutiva de bovinos, podem ser empregadas técnicas com o objetivo de diminuir o período de anestro pós-parto, como tratamentos hormonais para indução da ovulação, e técnicas de manejo como desmame precoce (60 a 90 dias) ou interrompido (48 a 96 horas), e restrição da mamada (uma ou duas vezes ao dia).
São descritos vários protocolos hormonais para indução de ovulação, os quais podem ser associados, ou não, com desmame dos terneiros, tendo resultados variáveis na indução da ovulação em vacas em anestro. A variação nos resultados encontrados geralmente deve-se ao estado nutricional dos animais, o qual tem grande influência no retorno à ciclicidade pós-parto. Um fator agravante deste inadequado estado nutricional é a amamentação no período pós-parto.
Para diminuir o efeito da mamada na ciclicidade das fêmeas podem ser utilizadas diferentes técnicas de desmame, como desmame completo, temporário ou parcial. Estas técnicas demandam quantidades variáveis de insumos, pois requerem mudanças no manejo e alimentação adequada dos terneiros desmamados, para que não ocorra diminuição na taxa de crescimento destes.
Condição corporal pré e pós-parto
Quando vacas de corte primíparas estão em balanço energético negativo (BEN) pré-parto, a variação na condição corporal (CC) no parto é o mais importante fator determinando a duração do período de anestro. Vacas primíparas submetidas a dietas com restrição de nutrientes no pré-parto, parindo com condição corporal média de 4 (escala de 1 a 9), tem como conseqüência um período de anestro pós-parto médio de 121 dias, o que indica que vacas parindo em baixas condições corporais têm o período parto/primeira ovulação prolongado. A máxima redução no período de anestro ocorre quando vacas primíparas ganham em torno de 1,8 unidades de condição corporal durante os primeiros 90 dias pós-parto.
Hormônios metabólicos
Existem várias evidências de que os hormônios metabólicos, como o hormônio do crescimento, insulina, fator de crescimento semelhante à insulina (IGF-I) e leptina, são importantes mediadores dos efeitos do balanço energético no desenvolvimento folicular ovariano de bovinos. Os hormônios IGF-I e insulina têm importante função no crescimento folicular, estimulando a mitogênese das células da teca e estimulando a esteroidogênese pelas células tecais através da indução do LH (hormônio luteinizante), o qual é responsável pela maturação e ovulação do folículo pré-ovulatório. Um estudo concluiu que há relação entre os níveis de IGF-I e a condição corporal de vacas de corte, mas não encontrou relação entre esta e o tempo para aparecimento do primeiro folículo dominante no pós-parto.
Suplementação energética
A suplementação de energia no período pós-parto leva a um retorno mais precoce a ciclicidade. Embora não haja diferença no período para a detecção da emergência da primeira onda folicular pós-parto, entre vacas com altos e baixos níveis de energia na dieta, vacas recebendo baixos níveis de energia têm um maior número de ondas foliculares antes da primeira ovulação. Isto se deve provavelmente às concentrações insuficientes de LH para estimular a maturação final do folículo pré-ovulatório.
Em vacas de corte primíparas com cria ao pé recebendo dieta com alto nível de energia, há um acréscimo nas concentrações de LH, além de uma maior liberação de LH em resposta a aplicação de benzoato de estradiol e menor intervalo entre a aplicação e o pico máximo de LH. Foi proposto também que períodos de restrição de energia afetam o desempenho reprodutivo ao nível hipotalâmico ou hipofisiário, por inibir a liberação de GnRH (hormônio liberador de gonadotrofinas) e/ou reduzir a sensibilidade hipofisiária ao GnRH. Isto pode levar a uma menor eficiência dos protocolos de indução da ovulação, pois pode ocorrer uma liberação de LH menor que a normal em resposta a aplicação de GnRH exógeno .
A condição corporal pós-parto é um reflexo do estado nutricional pré-parto, sendo que a reprodução é mais afetada pelos níveis de energia antes do parto do que depois deste. Porém, vacas com restrição energética no pré-parto, mas que no momento do parto apresentam CC moderada (5 a 6, numa escala de 1 a 9), não apresentam influência da dieta na performance reprodutiva pós-parto. Além disso, uma dieta rica em energia no pós-parto diminui, mas não elimina totalmente o efeito negativo da dieta pré-parto.
Suplementação de gordura
A suplementação de gordura para vacas no pós-parto acentua o crescimento folicular ovariano, promovendo o crescimento de um grande número de folículos com tamanho ovulatório. Além disto há um aumento da condição corporal e taxa de prenhez, mas não há alteração no período de anestro ou na concentração de progesterona. Entretanto, estudos concluíram que a suplementação de gordura na dieta pré e pós-parto aumenta a eficiência reprodutiva por diminuir o tempo para ocorrência do primeiro estro pós-parto. Sendo assim, não está claro se a suplementação de gordura é favorável ou não para a performance reprodutiva. Dentre as formas de gordura que podem ser fornecidas, a gordura poli-insaturada costuma ser mais eficiente que a gordura saturada ou altamente poli-insaturada para estimular o crescimento folicular.
Desta forma, fica evidente a importância de estudos que busquem identificar quais as demandas nutricionais, bem como o impacto das questões metabólicas na função reprodutiva, para cada sistema de produção, de acordo com as características próprias de cada realidade.
Literatura consultada
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1Viviane Rohrig Rabassa, Médica Veterinária, Mestranda em Veterinária, Universidade Federal de Pelotas, Faculdade de Veterinária, Departamento de Clínicas Veterinária
2Augusto Schneider, Estudante de Medicina Veterinária, Universidade Federal de Pelotas, Faculdade de Veterinária, Departamento de Clínicas Veterinária
3Marcio Nunes Corrêa, Médico Veterinário, M.C., Dr., Professor Adjunto, Universidade Federal de Pelotas, Faculdade de Veterinária, Departamento de Clínicas Veterinária