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“Exportações de carne aos EUA Estão totalmente paralisadas”, diz Roberto Perosa, da ABIEC

A imposição de uma tarifa de 50% sobre as exportações brasileiras de carne bovina aos Estados Unidos, anunciada pelo presidente Donald Trump, paralisou o fluxo comercial entre os dois países e acendeu um alerta máximo entre frigoríficos e produtores no Brasil. Em entrevista exclusiva à Forbes Brasil, Roberto Perosa, presidente da Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carnes (ABIEC), classificou a medida como “inviabilizadora” e detalhou os impactos econômicos imediatos para a indústria, as ações em curso junto ao governo e os riscos de prejuízo com contratos já firmados.

“A partir do anúncio, todas as indústrias suspenderam a produção de cargas com destino aos Estados Unidos. É um impacto direto, real, com risco de perda de até US$ 160 milhões em contratos já assinados”, afirmou Perosa. Segundo ele, cerca de 30 mil toneladas de carne já foram abatidas, processadas e estão nos portos ou em trânsito, sem garantia de entrada no mercado americano a partir de 1º de agosto, quando a tarifa passa a valer.

A maior preocupação, segundo o presidente da ABIEC, está nos contratos já firmados. A interpretação corrente nos Estados Unidos é de que a tarifa se aplica a partir do momento em que a carne chega ao país, e não na data do embarque ou assinatura do contrato. Isso torna incertas as condições de entrega dessas toneladas já negociadas, mesmo com documentação anterior à medida.

“Esses lotes já foram produzidos com exigências específicas e alto custo, voltados ao padrão norte-americano. Estimamos uma média de US$ 5.500 por tonelada, e agora precisaríamos redirecionar a um mercado que paga cerca de US$ 3.500. Isso gera uma perda direta e sem espaço para compensação”, diz ele.

De mercado promissor à incerteza total

Até junho de 2025, o Brasil havia exportado 200 mil toneladas de carne bovina aos Estados Unidos, e a expectativa da ABIEC era alcançar a marca de 400 mil toneladas no acumulado do ano. O volume superaria as 229 mil toneladas exportadas em 2024. A crescente demanda americana por cortes do dianteiro, usados na produção de hambúrgueres, era sustentada pelo ciclo de baixa da pecuária nos Estados Unidos e pelos altos custos internos.

“O mercado americano era emergente para o Brasil até dois anos atrás. A partir do momento em que o rebanho local entrou em retração, os frigoríficos brasileiros passaram a ser o principal fornecedor, com uma carne de qualidade, competitiva e segura. Mas com essa tarifa, esse fluxo se interrompe”, afirmou.

A ABIEC está atuando junto ao Itamaraty, ao Ministério da Agricultura e ao Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC), comandado pelo vice-presidente Geraldo Alckmin, para pressionar por uma solução diplomática imediata. A principal pauta é a prorrogação da entrada em vigor da tarifa, para garantir o cumprimento dos contratos já firmados.

“O primeiro passo é negociar. Estamos pedindo ao governo americano que postergue o início da cobrança, como já fez com outros países. A carne já está a caminho e não pode ser penalizada retroativamente”, afirmou. Sobre a possibilidade de judicialização, Perosa foi categórico: “Não há margem legal para isso no curto prazo. Seria uma disputa de Estado contra Estado, via OMC, e isso leva anos. O que precisamos agora é de agilidade diplomática.”

Mesmo representando cerca de 15% do total exportado, o mercado americano exerce forte influência sobre o preço da arroba. Desde o anúncio da tarifa, já se percebe um movimento de recuo no mercado interno.

“É uma consequência natural. A indústria parou de comprar boi para esse mercado, o volume recua e o preço começa a ceder”, disse Perosa. “Mas não estamos falando de colapso, porque há mais de 150 mercados ativos. O problema é que nenhum deles tem o mesmo volume e o mesmo preço.”

Brasil em busca de saídas

As empresas que suspenderam a produção de novos lotes destinados aos Estados Unidos já começaram a discutir alternativas de destino. No entanto, o redirecionamento dos lotes já prontos enfrenta limitações logísticas, regulatórias e comerciais.

“Não é simplesmente trocar de país. Cada mercado exige negociações próprias, padrões sanitários e novos preços. E a carne que produzimos para os Estados Unidos não serve em sua totalidade para outro destino”, afirmou.

A carne destinada originalmente aos Estados Unidos tem especificações rígidas, um custo de produção mais alto e um processo de certificação complexo. “É um produto feito sob encomenda. Se o comprador cancela, o prejuízo é imediato.”

Perosa diz, também, que a carne exportada pelo Brasil aos Estados Unidos não compete com a produção local. “Ela entra para compor o blend do hambúrguer, barateia a carne americana, fortalece o setor de food service e beneficia a classe média dos Estados Unidos. É um caso claro de complementaridade entre dois países. E é difícil entender como uma medida dessa magnitude pode ser aplicada sem levar isso em conta.”

Ele também criticou a retórica protecionista de Trump. “É uma medida que prejudica a economia americana tanto quanto a brasileira. Fica difícil aceitar que líderes estejam agindo contra o interesse de seus próprios países.” Mas ele acredita e vê espaço para uma solução diplomática. “O Trump tem um comportamento errático. Impõe barreiras, depois recua, reabre negociação. Já vimos isso antes. Acreditamos que ainda há margem para reverter a medida”, diz ele. O fato é que, por ora, o setor aguarda ansioso por sinais claros. “Enquanto houver chance de negociação, estamos na mesa. Mas a cada dia que passa, o prejuízo se materializa. Precisamos de resposta urgente.”

Fonte: Forbes.

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