Unir a roça à avenida Faria Lima para engordar bois – e rechear os bolsos. A tarefa, tocada por executivos egressos de grandes frigoríficos e tradings agrícolas, está atraindo investidores. Reunidos na Finpec, que se intitula a primeira fintech da pecuária brasileira, o trio formado pelos sócios Michel Tortelli, Fernando Sartori e Celso Fugolin oferece retornos cada vez mais raros em tempo de Selic baixa. Livre de impostos, a compra de um lote de bois pode render 8% por ano.
Com menos de dez funcionários – já considerando os sócios -, a Finpec estreou em agosto do ano passado com um aporte de R$ 2 milhões dos fundadores Sartori e Tortelli, o que serviu como teste. Como investidores, os sócios auferiram 12,5% ao ano, mas os recursos foram reaplicados para sustentar os planos de crescimento da empresa.
Na prática, a Finpec só entrou para valer no mercado neste ano, por meio da captação de recursos de pessoas físicas (executivos de grandes empresas). O tíquete mínimo para investir é R$ 50 mil. A aplicação tem isenção de imposto de renda.
A grande tacada da Finpec, fechada recentemente, veio com o acordo com um fundo de investimentos do Grupo Sifra, que se comprometeu a desembolsar R$ 50 milhões para a compra de gado. No ano que vem, a Finpec projeta captar R$ 100 milhões.
Em rápida expansão, a companhia vislumbra que, em dois ou três anos, poderá faturar mais de R$ 500 milhões, o que sustentaria um negócio capaz de vender entre 150 mil e 200 mil cabeças de gado aos principais frigoríficos. É um volume considerável, que colocaria a Finpec entre as maiores fornecedoras do país.
Idealizado por Tortelli, executivo que trabalhava na mesa de operações de mercado futuro de boi gordo da Minerva Foods, o modelo de negócios da Finpec está baseado na criação em confinamento, sistema intensivo de engorda no qual o animal é alimentado com grãos em baias, e não solto nos pastos – a característica da pecuária nacional.
Entre analistas de pecuária, é consenso que a atividade de confinamento, mais produtiva, tem espaço para crescer no Brasil. Atualmente, apenas 10% do gado abatido pelos frigoríficos brasileiros são engordado no sistema intensivo. Há analistas que apostam que a participação do confinamento chegará a 20% dos abates ao longo dos próximos anos.
Na Finpec, capital imobilizado é palavrão. A empresa não é dona de fazendas. “Não tem terra nem debaixo do dedo”, brinca Celso Fugolin, que fez carreira na JBS – foi diretor da gigante de carnes na Bélgica e no Canadá – e se tornou sócio da fintech de pecuária recentemente.
Sem o custo fixo de manter a estrutura para a engorda do gado, a Finpec firma parcerias em confinamentos de diversas regiões do país. Por meio de um contrato de comodato, o dono da propriedade reserva uma área para os bois da Finpec.
O parceiro também se responsabiliza pela engorda dos animais, que ficam, em média, 120 dias no confinamento até atingirem o peso de abate. Em troca, a Finpec paga o confinador conforme o desempenho – ou seja, por arroba (equivalente a 15 quilos) produzida. De acordo com Fugolin, R$ 120 é um valor de referência para cada arroba adicionada no sistema intensivo de engorda.
Atualmente, a Finpec está presente em cinco confinamentos, localizados em Bebedouro (SP), Diamantino (MT), Varzelândia (MG), Jussara (GO) e Buritama (SP). “Estamos com frente aberta para mais um em São Paulo, dois Bahia e em Mato Grosso”, acrescentou Fugolin.
No médio prazo, a ideia é chegar a 30 confinamentos. Para evitar o risco de concentração geográfica e de cliente, a empresa ocupa no máximo 35% da capacidade estática de cada confinamento.
Para garantir a remuneração dos investidores, a Finpec só realiza novas compras de gado se travar o preço de venda, por meio de contratos a termo com os frigoríficos – esses papéis são lastreados nos contratos futuros de boi gordo da B3. Por precaução, a empresa só recebe a prazo dos maiores frigoríficos (JBS, Marfrig e Minerva). Para os outros abatedouros, a empresa só vende com pagamentos à vista.
Nas conversas com investidores, os três sócios da Finpec também tiveram de afastar as comparações com a Fazenda Reunidas Boi Gordo, esquema de pirâmide financeira que lesou milhares de investidores na década passada e deixou bilhões em prejuízo. A Boi Gordo oferecia uma rentabilidade de 42% depois de 18 meses.
Mas o modelo de negócio da Finpec é totalmente diferente da Boi Gordo, explicou Tortelli. No segundo caso, era uma operação imobiliária, com compra de fazendas. Na fintech de pecuária, só o gado, um ativo de grande liquidez, é comprado.
Além disso, os investidores têm garantias sólidas, afirmou ele e, ao aplicar na Finpec recebem – por meio das corretoras Ativa e SLW – a Cédula do Produto Rural (CPR) com lastro em bois que ficam penhorados aos investidores. As CPRs são registradas na Cetip, e os sócios da Finpec também dão garantias adicionais para os investimentos, ressaltou.
Para Fernando Sartori, um dos sócios da Finpec, a fraude da Boi Gordo é uma “chaga” do setor e responsável por afastar muitos investidores da pecuária. Mas é também o que deixou o mercado inexplorado para iniciativas como a sua.
Fonte: Valor Econômico.