A cadeia pecuária brasileira vive dias de incerteza e de mercado travado, pressionada pela indefinição sobre a imposição de tarifas de 50% anunciadas pelos Estados Unidos (EUA) sobre produtos brasileiros. Em reação imediata, frigoríficos no Brasil alongaram escalas de abate e algumas plantas colocaram parte dos funcionários em férias coletivas, conforme a Scot consultoria.
O impacto direto sobre o preço da arroba já aparece. No indicador Cepea, a cotação recuou de R$ 305,00 no dia 09 de julho — quando as tarifas foram anunciadas — para R$ 296,75, na sexta-feira, 18, acumulando queda de 2,7% no período.
Segundo analistas, o setor, que está acostumado a lidar com choques, segue tentando absorver o golpe. “A indústria é rápida. Então, se eles preveem que eles não vão mais produzir, que as encomendas foram suspensas, então, eles cortam pessoas. O agro é diferente. Por mais difícil que seja a situação, o agro não demite em massa, ele absorve os impactos”, explicou Alcides Torres, diretor da Scot Consultoria.
Para Torres, o efeito observado no mercado é mais especulativo e de incerteza, do que real. “Em resumo, o mercado vive muito mais da expectativa do que do fato porque o fato é que os EUA absorvem só 2% do que o Brasil produz, então, o mercado deveria continuar”, sinaliza.
Pedro Gonçalves, engenheiro agrônomo e analista de mercado da Scot, destaca o efeito imediato dessa incerteza. “A indústria aperta a arroba, compra menos, pressiona. Estamos vendo mais especulação do que uma reação real”, diz.
Gonçalves lembra que, embora os EUA representam cerca de 12% das exportações brasileiras, o anúncio das tarifas mexeu com todo o mercado. “Isso cria ruído, trava negócios, e o mercado sente”, afirma. Ele indica ainda que, em algumas regiões, como em Mato Grosso, estado com o maior rebanho bovino do país, a pressão se refletiu até na reposição. “A correlação entre o preço da arroba do boi gordo e das categorias de reposição é alta. Então, se um está sentindo, o outro sente junto”, destaca.
Mesmo em meio à tensão provocada pelo anúncio das tarifas norte-americanas sobre produtos brasileiros, uma certeza ainda sustenta o setor pecuário: a virada de ciclo da pecuária, com alta dos preços. “Estamos caminhando para um ciclo de alta. Esse movimento tem um peso maior do que a crise das tarifas”, afirma Torres.
Segundo ele, os fundamentos do mercado seguem inalterados diante da taxação — com uma oferta menor prevista para os próximos meses e uma tendência natural de valorização da arroba.
Mesmo com o mercado travado e as indústrias segurando compras ou alongando escalas, a perspectiva é de que o preço volte a reagir. “A gente vem de um cenário extremamente positivo para a pecuária de corte no nosso país. Então, quem está pensando em investir e aumentar o rebanho, que é uma situação um pouco mais difícil, principalmente nessa virada de alta, talvez tenha criado uma nova janela de oportunidade para fazer compras do gado de reposição para esse momento já que a relação de troca melhorou”, indica Gonçalves.
Nesse contexto e diante do nervosismo e incertezas, os especialistas não descartam um cenário positivo no médio prazo. “Temos indicativos de alta no preço do boi. A oferta vai diminuir e, mais cedo ou mais tarde, isso deve sustentar preços”, diz Gonçalves.
Fonte: Estadão.