O Ministério da Agricultura tenta definir hoje e amanhã, em Salvador (BA), um acordo com representantes dos governos da Argentina, Uruguai, Paraguai e Bolívia para afastar os riscos da febre aftosa entrar em território brasileiro pelas fronteiras com esses países e prejudicar as perspectivas de exportação de mais de US$ 1,2 bilhão em carne bovina neste ano.
As estratégias de prevenção serão discutidas na 29a Reunião da Comissão Sul-Americana de Combate à Febre Aftosa (Cosalfa), na capital baiana, entre representantes governamentais e empresariais do Brasil e de mais dez países: Argentina, Bolívia, Chile, Colômbia, Equador, Guiana, Paraguai, Peru, Venezuela e Uruguai.
O encontro é organizado anualmente pelo Centro Pan-Americano de Febre Aftosa (Panaftosa), uma instituição científica mantida pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e pela Organização Pan-Americana da Saúde. O Panaftosa foi criado há 51 anos em Duque de Caxias, na região metropolitana do Rio, sendo reconhecido como laboratório de referência das Américas. Em suas instalações tem sido aprimorada a vacina contra a aftosa usada no Brasil, tida como uma das mais eficazes do mundo.
Em 2000 e 2001, a Argentina e o Uruguai foram afetados por inúmeros focos de febre aftosa, que dizimaram parte de seu rebanho e acentuaram a crise da economia dos dois países. A doença acabou atingindo o extremo sul do Brasil, prejudicando vários municípios gaúchos, que só agora superam o problema. Recentemente, o Rio Grande do Sul voltou a exportar carne para a União Européia, mas ainda não recuperou o status de zona livre de aftosa, que havia conquistado em 1998 na Organização Internacional de Epizootias (OIE), em Paris.
O ministro da Agricultura, Marcus Vinicius Pratini de Moraes, interessado em continuar ampliando as exportações de carne bovina, aceitou a sugestão de entidades de pecuaristas lideradas pelo presidente do Fórum Nacional de Pecuária da Confederação Nacional da Agricultura (CNA), Antenor Nogueira, de insistir para que os fazendeiros brasileiros continuem vacinando seu rebanho duas vezes por ano, enquanto persistirem as ameaças. No entanto, os riscos são provocados em grande parte pelo contato com países vizinhos. A Argentina, com problemas econômicos, não conseguiu superar por completo os surtos de aftosa. A Bolívia, com poucos recursos para manter seus rebanhos, recebeu do governo brasileiro a doação de milhares de doses de vacinas.
EUA investiga suspeita de aftosa
O Serviço de Inspeção de Sanidade Animal (Aphis) do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos anunciou ontem que realiza estudos sobre febre aftosa em animais que foram encontrados com lesões no Estado do Kansas. Segundo a agência de notícias Reuters, o funcionário da Área de Serviços Veterinários do Aphis em Toipeka, Donald Evans, disse que foram detectadas lesões em cerca de 15 animais de uma fazenda, durante inspeção realizada terça-feira.
Os animais foram enviados a laboratórios federais a fim de serem analisados e os resultados deveriam ser conhecidos ontem. “Até o momento não há evidência de febre aftosa ou alguma outra enfermidade”, disse Evans. “Estamos tentando evitar que essa doença entre no país”, acrescentou. O rebanho norte-americano tem se mantido livre da febre aftosa desde 1929.
A possibilidade de retorno da febre aftosa no país provocou forte queda nos preços futuros do milho na bolsa de Chicago, como reflexo da perspectiva de queda da demanda, segundo traders locais.
Ministério conclui vistoria na divisa
O chefe de Sanidade Animal do Ministério da Agricultura, Hélio Pinto, retorna hoje a Porto Alegre (RS), encerrando vistoria nos postos de aduana e inspetorias veterinárias na fronteira com a Argentina. A inspeção, que é regular, foi antecipada devido à suspeita de atividade viral no país vizinho.
Ontem, foram vistoriados os postos de São Borja, Itaqui e Uruguaiana. Na terça, o secretário executivo da Associação dos Municípios da Região Celeiro, Cladimir Zanella, recebeu do intendente de El Soberbio, na Argentina, Santiago Ferrera, pedido de apoio para esclarecer a origem dos rumores no Brasil.
Carne clandestina preocupa na fronteira do RS
Um pequeno açougue da cidade argentina de Paso de Los Libres, na fronteira com Uruguaiana, comercializou nos últimos sete dias 500 quilos de carne com osso para brasileiros. O produto, procedente da província de Entre Ríos, uma das que mais registrou focos de febre aftosa no ano passado, foi introduzido clandestinamente no país. O preço é o principal atrativo para os brasileiros.
A compra clandestina preocupa o presidente do Sindicato das Indústrias da Carne (Sicadergs) do Rio Grande do Sul, Mauro Lopes. Não se tem idéia do volume total que entra no Estado. O dirigente está articulando uma campanha de conscientização dos moradores de cidades da fronteira com a Argentina sobre os riscos que esse comércio para o consumo familiar pode representar para o programa de sanidade animal brasileiro e para a erradicação da aftosa.
Em Paso de los Libres, o preço da carne é um dos principais atrativos para os brasileiros que se arriscam a trazer o produto clandestinamente. O quilo da costela, em Uruguaiana, custa em média R$ 5,50. Na cidade argentina, R$ 2,50. O quilo da picanha brasileira vale R$ 9. Na Argentina, o corte é vendido por R$ 3. O gerente de um açougue de Paso de los Libres, Arnaldo Verón, revela que em seu estabelecimento cerca de 500 quilos por semana são vendidos para brasileiros.
Ontem, um aposentado de Uruguaiana, que pediu para não ser identificado, disse conhecer a proibição de trazer carne argentina. O controle é feito pelo Ministério da Agricultura, instalado na aduana integrada de Paso de los Libres. “Sei que a carne com osso pode ter o vírus da aftosa, mas a gente esconde embaixo do banco. O preço compensa o risco”, afirmou.
O chefe do Serviço de Sanidade Animal da delegacia do ministério, Hélio Pinto, diz que uma campanha educativa para coibir o comércio de carne clandestina será um dos temas do encontro de técnicos em sanidade animal que atuam nas fronteiras, marcado para a próxima semana, em Uruguaiana. O evento será organizado pelo Convênio Bacia do Prata. “Não adianta colocar Exército, Polícia Federal e ministério para vigiar as fronteiras, se a população não tem consciência”, observa.
Fonte: O Estado de São Paulo (por Luiz Carlos Ramos), Correio do Povo/RS, Zero Hora/ RS (por Mauro Maciel) e Gazeta Mercantil, adaptado por Equipe BeefPoint