Por Cíntia R. Marcondes, Pedro A. Vozzi e Raysildo B. Lobo1
O acasalamento em linha é muito utilizado para a formação de linhagens diferentes dentro das raças, produzindo a separação da população em diferentes famílias, possibilitando a seleção das melhores e a eliminação das piores. Este método de acasalamento foi o mais utilizado na formação de diferentes linhagens na Raça Nelore, sendo considerado uma ferramenta importante na conservação de determinados genótipos importados. O termo linhagem refere-se a um grupo de animais que apresentam parentesco entre si, devido a um ancestral representado por um genearca, reprodutor fundador da fase contemporânea (material genético importado na década de 60) da raça Nelore (Magnabosco et al., 1997).
Em uma dada linhagem, a existência de animais com mesma genealogia não implica, necessariamente, na mesma bagagem genética, pois a amostragem mendeliana ocorre durante a formação dos gametas. O uso intensivo de um determinado reprodutor possibilita a maior amplitude de variação no desempenho das progênies. Apesar do reduzido número de genearcas responsáveis pela formação do Nelore brasileiro, há evidências de diferentes perfis genéticos entre as linhagens, de acordo com o critério de seleção empregado (Lôbo et al., 2003). Assim, na raça Nelore, apesar do pequeno tamanho efetivo da população (68 animais – Faria et al., 2002) a existência de diferentes linhagens permitiria a exploração da complementariedade das características de interesse econômico.
A importância da identificação de diferenças no perfil genético de cada linhagem é a possibilidade de direcionar os acasalamentos, otimizando-os e, conseqüentemente, alcançando maiores progressos genéticos nas características incluídas no objetivo de seleção e evitando altos níveis de endogamia no rebanho ou na raça. Outros ganhos provenientes dos acasalamentos otimizados são o aumento (ou pelo menos a manutenção) da variabilidade genética aditiva e a sustentabilidade da raça, evitando-se a necessidade, a médio ou longo prazo, da incorporação extra de genes com uso de outras raças ou a importação de reprodutores sem qualquer tipo de avaliação genética (Lôbo et al., 2003).
Com o presente estudo buscou-se identificar famílias e determinar a contribuição dos genearcas da raça Nelore, quanto ao desempenho para permanência no rebanho, a partir dos valores genéticos dos touros.
As Diferenças Esperadas na Progênie (DEPs) dos 4180 touros, obtidas a partir da transformação em escala de probabilidade das soluções resultantes da análise pelo MTGSAM for threshold (Van Tassel et al., 1998), foram classificadas em ordem decrescente e estudadas as genealogias dos 42 melhores touros (também chamados de TOP 1% ou aqueles que apresentam Dstay superior a 57,6%; Sumário de Touros, Matrizes e Animais Jovens do PMGRN-USP), pelo software PEDIG.
Dos 34 touros com genealogia conhecida, 12 (ou 35%) possuem na linha materna ou paterna, contribuição genética do fundador Godhavari Imp., essencialmente via Kurupathy e Neofito. Na mesma proporção, observou-se 12 linhas (maternas ou paternas) que terminavam no touro Rolex, via seu neto Cardeal (H 4013). Outro destaque fica por conta do touro Karvadi como genearca comum em 10 linhas maternas (essencialmente via Chummak) e somente uma linha paterna, ou seja, a importante contribuição do touro Karvadi é como tataravô, bisavô ou avô das mães dos touros com melhores DEPs para permanência no rebanho. O referido fundador conferiu genes aos touros ancestrais Ídolo, Garoto e Fulminoso, todos mochos.
Os outros touros fundadores, Rastã Imp. e Falo da BV apresentam significativa proporção de genes nos touros TOP para a característica, porém sem parentesco com aqueles considerados ancestrais importantes. Possivelmente, a disseminação de seus genes ocorreu pela via materna.
TABELA – 1 Proporção de genes dos ancestrais (exceto fundadores), na população dos melhores touros para permanência no rebanho.
A Figura 2 ilustra as relações entre os ancestrais importantes para permanência no rebanho.
Conclusões
O presente estudo mostrou que além das linhagens Karvadi, Godhavari e Rastã, as famílias dos touros Rolex e Falo da BV tiveram importante influência sobre a probabilidade de permanência no rebanho.
Referências bibliográficas
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1Cíntia R. Marcondes, Pedro A. Vozzi e Raysildo B. Lobo são do departamento de Genética da FMRP/USP e Programa de Melhoramento Genético da Raça Nelore (PMGRN-USP)
O artigo é parte da Tese de Doutorado do primeiro autor.